Pastagens implantadas sem licenciamento em área de preservação permanente não serão calculadas como benfeitorias indenizáveis em desapropriação por interesse social

No cálculo das benfeitorias, devem ser excluídas as implantadas sem o devido licenciamento, na área de preservação permanente, sob pena de beneficiar o expropriado pelo cometimento de ato ilícito. Assim decidiu a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao negar provimento à apelação dos expropriados (antigos donos das terras), sob pena de beneficiar um ato ilícito cometido pelo expropriado.

Na sentença, o juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Tocantins (SJTO) estabeleceu a indenização com base no cálculo do perito oficial. Os expropriados apelaram sustentando que a indenização deveria ser fixada com base no valor atual de mercado e não nos preços apurados quando do ajuizamento da ação, conforme o art. 26 do Decreto-Lei 3.365/1941.

O Incra alegou que deveria ser glosado (diminuído) do valor total da indenização os custos de reposição de áreas do imóvel afetadas por degradação ambiental (“passivo ambiental”) e, além disso, que deveria ser excluída da indenização em separado pela cobertura florística, em função da ausência do devido licenciamento e plano de manejo autorizado por órgão competente e também ser indevida a indenização pelas cercas que delimitam a faixa de domínio da rodovia estadual, porque não pertence ao expropriado.

Ao analisar o caso, o relator, juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, destacou que não deve prosperar as alegações dos apelantes, na medida em que, quando proferida a primeira decisão, os ora apelantes impugnaram a decisão proferida inicialmente para que os novos cálculos fossem elaborados levando em consideração “as condições do imóvel”, principalmente as benfeitorias, levando-se em consideração o levantamento fotográfico, mapas e demais pareceres já emitidos no processo”. Nova decisão foi proferida os desapropriados não interpuseram recurso, ocorrendo o fenômeno da preclusão (perda do direto de se manifestar no processo).

Com relação à fixação do preço do imóvel desapropriado, o magistrado salientou que o laudo foi elaborado de acordo com as normas técnicas que norteiam os trabalhos dos peritos na avaliação dos imóveis rurais, utilizando-se de dados e informações referentes a negociações e a ofertas na região do imóvel desapropriado.

O relator sustentou que a cerca divisória existente há anos no trecho em que a propriedade dos expropriados confronta com a rodovia estadual deve ser inserida na indenização, não havendo nos autos elementos que comprovem a anterior desapropriação deste ativo pelo Governo do Estado de Tocantins, como ponderou o perito, o que reforça os termos da sentença.

Dando continuidade ao voto, observou o magistrado que a responsabilidade ambiental de recompor as áreas degradadas do imóvel (passivo ambiental), conforme o art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981 (que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente) e no art. 2º, § 2º da Lei 12.651/2012 (Código Florestal), recai sobre o adquirente (no caso, o INCRA) o ônus de restaurar o dano ambiental existente no imóvel alienado e, portanto, nesse ponto, votou por negar provimento à apelação da autarquia.

Concluindo seu voto, o juiz federal convocado destacou que as benfeitorias efetuadas na área de preservação permanente não são indenizáveis sem o devido licenciamento, e entendeu pelo provimento do recurso do Incra, neste ponto.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. REFORMA AGRÁRIA. INDENIZAÇÃO. VALOR APURADO NA DATA DA PERÍCIA. BENFEITORIAS (PASTAGENS). ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PASSIVO AMBIENTAL. MANDADO TRANSLATIVO DE DOMÍNIO. JUROS COMPENSATÓRIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 9.494/97, ART. 1º-F. INAPLICABILIDADE; 1. Deve prevalecer, como expressão da justa indenização (art. 184 – CF), o laudo judicial, elaborado com adequada metodologia, sob os auspícios do contraditório, que estabelece o valor de mercado do imóvel (terra nua e acessões), na data da perícia, a partir de dados do mercado imobiliário local; 2. Como regra, previa o CPC/73 a necessidade de impugnação imediata das decisões interlocutórias como forma de afastar os efeitos da preclusão incidente sobre os pronunciamentos jurisdicionais. Deviam os expropriados, no caso de irresignação com a decisão que determinou a apuração do valor da indenização com base nos valores apurados na primeira perícia, impugná-la de imediato, por meio da interposição do recurso de agravo, seja retido ou de instrumento, conforme art. 522, daquele Código; 3. No cálculo das benfeitorias, devem ser excluídas aquelas implantadas sem o devido licenciamento, na área de preservação permanente, sob pena de beneficiar o expropriado pelo cometimento de ato ilícito; 4. O estado do imóvel, inclusive a sua eventual degradação ambiental, deve ser demonstrado pela perícia, cuja avaliação já o retrata, ainda que implicitamente. Se o imóvel desapropriando já é desvalorizado justamente por conta da degradação nele existente, incabível se mostra qualquer dedução de valor que tenha por fundamento custos decorrentes de eventual degradação ambiental (R$ 45.508,42 – no caso), que são considerados na apuração do preço de mercado; 5. O §§ 1º e 2º, do artigo 15-A, do Decreto nº 3.365/1941, condicionam a aplicação dos juros compensatórios à comprovação da efetiva perda de renda sofrida pelo proprietário e à demonstração de que os graus de utilização (GUT) e de eficiência na exploração (GEE) sejam superiores a zero; 6. Embora o imóvel possua grau de utilização e de eficiência de exploração superiores a zero, não tendo sido comprovada qualquer atividade econômica desenvolvida pelo expropriado, deve ser aplicado o entendimento (vinculante) do Supremo Tribunal Federal (ADI 2.332), para que sejam afastados os juros compensatórios, devendo a verba incidir apenas a partir de 12 de julho de 2017, quando entrou em vigor a Lei nº 13.465, que acrescentou o § 9º no art. 5º da Lei nº 8.629/93, que estipulou para as desapropriações para fins de reforma agrária o percentual de juros compensatórios no mesmo patamar fixado para remunerar os títulos depositados como oferta inicial para a terra nua, norma que deve incidir no segmento; 7. A verba incide até a data da primeira conta, que liquida a sentença e que efetivamente origina o precatório. Ou seja, o termo ad quem dos juros compensatórios deve ser a data da conta de liquidação, que dá origem ao precatório original e a expedição dos TDA’s; 8. Os juros moratórios devem ser pagos à taxa de 6% ao ano a partir de 1º de janeiro do exercício financeiro seguinte àquele em que o pagamento deveria ser efetuado (art. 15-B – DL nº 3.365/41); 9. Havendo divergência, para maior, entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem, fixado na sentença, são devidos os honorários advocatícios, no caso, fixados pela sentença recorrida no percentual de 3% (cinco por cento), que devem ser mantidos, não somente em atenção ao trabalho dos profissionais, como também porque o percentual está entre os limites fixados na lei; 10. Julgado o RE nº 870.947 (Tema 810), em regime de repercussão geral, definiu o STF que o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade, uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidôneo a promover os fins a que se destina, devendo incidir o IPCA-e, considerado mais adequado para recompor a perda do poder de compra; 11. Na conta de liquidação, o valor apurado na perícia será corrigido monetariamente, seguindo-se a dedução do valor da oferta, até a data do laudo, com correção monetária, segundo os critérios do Manual de Cálculo da Justiça Federal. No caso de Títulos da Dívida Agrária (TDAs), deve-se observar o critério de correção específico, com base na TR, nos termos da Lei 8.177/91 (art. 5º) e Decreto 578/92 (arts. 4º, 8º e 9º); 12. A teor do art. 17 da Lei Complementar 76/93, não se contempla a possibilidade de registro do imóvel em nome do expropriante, antes do trânsito em julgado da sentença e do depósito da indenização, fixada na sentença, havendo, por conseguinte, necessidade de complementação de eventual quantia remanescente. Precedentes deste Tribunal: AG 0004166-17.2017.4.01.0000, Desembargador Federal Néviton Guedes, TRF1 – Quarta Turma, e-DJF1 15/03/2018; 13. Apelação dos expropriados desprovida. Apelação do INCRA e remessa necessária providas em parte.

O voto do relator, no sentido de negar provimento ao recurso dos expropriados e dar parcial provimento à apelação do Incra foi, por unanimidade, acompanhado pelo colegiado.

Processo 0000483-85.2008.4.01.4300

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