Acidente ocorreu em 2016, durante viagem internacional
A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação da Associação Chapecoense de Futebol, de Chapecó (SC), a pagar indenização aos pais de um jogador de futebol que morreu no acidente aéreo ocorrido em 2016, quando o time viajava para o jogo final da Copa Sul-Americana, na Colômbia. Na decisão, foi reconhecida a responsabilidade objetiva (que dispensa comprovação de culpa) da Chapecoense, inclusive pelo risco criado pelas viagens frequentes.
Indenização
Tiaguinho, ou Tiago da Rocha Vieira, foi uma das 71 vítimas fatais do acidente que ocorreu perto de Medellín, na Colômbia, em 28/11/2016. Ele era jogador da Chapecoense desde 2010 e tinha 22 anos.
Para os pais do atleta, uma manicure e um motorista que residem em Nova Friburgo (RJ), ele foi vítima de um típico acidente de trabalho, pois viajava de um país para outro para disputar partidas de futebol. Na ação contra a empregadora, eles pediram reparação por danos morais e materiais pela perda do filho.
Responsabilidade
O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) manteve a sentença que deferiu o pedido, determinando o pagamento de indenização por danos morais de R$ 80 mil para o pai e R$ 50 mil para a mãe. A diferença se deu porque receberá, também, pensão mensal, por ter sido privada do familiar que lhe provia o sustento.
Segundo o TRT, em toda atividade esportiva há risco, seja de lesões, seja por acidentes decorrentes de viagens, e esse risco é assumido pelo empregador. Assim, a Chapecoense teria responsabilidade objetiva pelos danos ocorridos em decorrência do acidente de trabalho.
Fatalidade
No recurso de revista, o clube argumentou que o acidente fora uma fatalidade e que a atividade de jogador de futebol não pode ser considerada de risco. “Se assim o for, todo ser humano estará sujeito a lesões, de diferentes graus e sequelas, ocasionadas pelo simples fato de estar vivo”, alegou.
Acidente de trabalho
Para o relator do recurso, ministro Cláudio Brandão, não há dúvidas quanto à ocorrência de acidente de trabalho. Afinal, o atleta morreu ao ser transportado, por aeronave pertencente a empresa contratada pela empregadora, para outro país onde ocorreria o jogo de futebol. Ainda que durante o voo não estivesse propriamente na execução direta do trabalho, ele estava à disposição do empregador.
Transporte
Para Brandão, o transporte aéreo fora fornecido e custeado pela empregadora para atender a exigência de sua própria atividade econômica, e o jogador estava no avião porque cumpria ordens. “Trata-se de contrato acessório conexo ao contrato de trabalho”,explicou. Nesses casos, o empregador equipara-se ao transportador para fins de responsabilização pelos danos causados às pessoas transportada.
Risco da atividade
Outro tipo de responsabilidade que se aplica nesse caso, segundo o relator, é a teoria do risco decorrente da atividade desenvolvida. A seu ver, ele também está presente no caso, com a reiteração das viagens em transportes terrestres ou aéreos.
Em um exame detalhado, o ministro verificou que, de abril a novembro de 2016, dos 51 jogos que a Chapecoense disputou, 26 foram “fora de casa”. “Independentemente do meio de transporte utilizado para chegar aos locais dos jogos, o empregado estava claramente exposto a um maior risco de sofrer acidentes”, assinalou.
Essa situação, na avaliação do relator, se enquadra no Tema 932 de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF), porque a atividade, por sua natureza, apresentava exposição habitual a risco especial e acarretou ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade.
O recurso ficou assim ementado:
DECISÃO REGIONAL PUBLICADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PARTE RÉ. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA CONSTATADA . Em relação à transcendência econômica , esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso da empresa, os valores fixados no artigo 496, § 3º, do CPC, conforme seu âmbito de atuação. No caso, a ré tem atuação municipal e a soma dos valores fixados às indenizações objeto de insurgência foi de R$ 383.148,73. Desse modo, considera-se alcançado o patamar da transcendência.
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA EMPREGADORA. INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS E MATERIAIS PARA OS PAIS DO DE CUJUS . QUEDA DE AVIÃO. MORTE DO EMPREGADO DURANTE VIAGEM INTERNACIONAL A TRABALHO. ACIDENTE TÍPICO DE TRABALHO. TRANSPORTE FORNECIDO E CUSTEADO PELA EMPREGADORA. CONTRATO DE TRANSPORTE CONEXO AO CONTRATO DE TRABALHO. EXPOSIÇÃO HABITUAL A RISCO. RESPONSABILIDADE PELO RISCO DA ATIVIDADE LIGADO AOS DESLOCAMENTOS (VIAGENS) COMUNS. Consta no acórdão regional que o trabalhador, que exercia a função de jogador de futebol na empresa ré, foi vítima de acidente aéreo fatal em 29/11/2016, em razão do trabalho e em transporte por ela fornecido , ao se deslocar para Medellín, na Colômbia, local onde a equipe da ré disputaria a partida final da Copa Sulamericana. A primeira tese a ser afirmada é que, muito embora o acidente tenha ocorrido no deslocamento do empregado, não se tratou de acidente de trajeto , previsto no artigo 21, IV, “d”, da Lei nº 8.213/1991. Essa modalidade de infortúnio ocorre no deslocamento habitual do empregado de sua residência para o lugar onde trabalha e no seu retorno. Não é o caso dos autos . Conquanto seja comum o deslocamento dos profissionais que compõem o grupo formado por diretores, atletas, comissão técnica, responsáveis pelas atividades administrativas e de apoio para diversas cidades em que são realizados os jogos que a agremiação disputa nos diversos campeonatos de que participa, o percurso diariamente feito pelo falecido empregado alcançaria o trecho desde a sua residência até o local de trabalho, onde habitualmente exercia as suas atividades e, no caso, ele não estava a cumprir o referido percurso quando veio a ser vitimado. Registre-se o fato de ser comum a realização de viagens e, particularmente no ano de 2016, a Associação Chapecoense de Futebol disputou três campeonatos de futebol ao mesmo tempo (Campeonato Brasileiro, Copa do Brasil e Copa Sulamericana) e, para cumprir os compromissos deles decorrentes, fazia dos deslocamentos atividade rotineira. Dos 51 jogos de futebol que a ré disputou de abril a novembro de 2016, 26 foram “fora de casa”. Esses números demonstram que, independentemente do meio de transporte utilizado para se chegar aos locais onde foram disputados os jogos , o empregado estava claramente exposto a um maior risco de sofrer acidentes. Viajar fazia parte de sua rotina, de modo a atrair o imprescindível nexo de causalidade com o contrato de trabalho e, por conseguinte, o enquadramento na previsão contida no artigo 19, caput , da Lei nº 8.213/1991. Mas, ainda que se considerasse que, no momento do acidente, ele não estivesse estritamente a serviço do empregador, remanesce a previsão contida no artigo 21, IV, “c”, da referida lei, que trata do acidente resultante de viagem a serviço da empresa, incluído no rol dos denominados “acidentes por equiparação”. Ademais, é fato incontroverso que o transporte aéreo foi fornecido e custeado pela empregadora para atender a circunstância inerente à sua própria atividade econômica . Trata-se, assim, de contrato acessório conexo ao contrato de trabalho em que o empregador, a fim de viabilizar a execução de sua atividade econômica , fornece o transporte dos seus empregados , ainda que o faça por meio da utilização de serviços contratados de terceiros. Nesses casos, o empregador equipara-se ao transportador para fins de responsabilização pelos danos causados às pessoas transportadas, ou seja, os empregados . No transporte aéreo, essa obrigação também se impõe, ainda que se trate de voo internacional, cuja regência se encontra a cargo da Convenção para a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional, conhecida como “Convenção de Montreal”, ratificada pelo Brasil e promulgada pelo Decreto nº 5.910, de 27/09/2006, que prevê, de modo expresso, a responsabilidade objetiva do transportador pelo risco da atividade (artigo 17.1), condicionada ao fato de o acidente ocorrer a bordo da aeronave ou durante quaisquer das operações de embarque e desembarque. Registre-se, também, que a circunstância de ser habitual ou eventual o transporte fornecido pelo empregador é irrelevante para caracterizar a responsabilidade. Outrossim, cumpre observar que não se incluem nas hipóteses de excludentes os acontecimentos derivados do denominado fortuito interno , compreendido como o fato que, embora imprevisível e inevitável, se liga à organização empresarial e está relacionado aos riscos da atividade desenvolvida pelo transportador, do que é exemplo típico o acidente fatal que vitimou o ex-empregado. Essa é a compreensão que se extrai da regra contida no artigo 734 do Código Civil, ao mencionar a força maior como causa excludente do dever de reparação decorrente. Aliás, nem mesmo o fato de terceiro a exclui, como ressaltado pelo Supremo Tribunal Federal, por meio da Súmula nº 187. Desse modo, há responsabilidade objetiva da ré, com base na teoria do risco inerente ao contrato de transporte , atrelado à função desempenhada normalmente pelo ex-empregado , tal como previsto nos artigos 734 e 735 do Código Civil e na jurisprudência desta Corte que, de forma categórica, afirma ser objetiva a responsabilidade do empregador , nas hipóteses em que o acidente ocorrer durante o transporte do empregado em veículo fornecido pela empresa . Julgados de todas as Turmas e da SBDI-1 do TST. Importante ressaltar, ainda, que também deve ser aplicada ao presente caso a Teoria do Risco Criado em virtude da atividade desenvolvida, pois , com a reiteração das viagens, há o risco específico para acidentes em transportes terrestres e/ou aéreos , na forma do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil . Desse modo, a solução da controvérsia encontra-se em perfeita conformidade com a Tese nº 932 estabelecida em Repercussão Geral pelo Supremo Tribunal Federal, pois a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentava exposição habitual a risco especial , com potencialidade lesiva, e acarretou ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade. Se, em virtude desse risco específico (inerente ao transporte), o acidente é causado, a responsabilidade objetiva se impõe . Recurso de revista não conhecido .
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VALOR ARBITRADO. INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ARTIGO 896, § 1º-A, II E III, DA CLT. ARESTOS APRESENTADOS PARA CONFRONTO DE TESES PROVENIENTES DE TURMA DO TST. TRANSCENDÊNCIA NÃO EXAMINADA . Inviável o conhecimento do recurso de revista em que a parte não indica, de forma explícita e fundamentada, a violação a dispositivo de lei ou contrariedade a verbete do TST, inclusive, mediante a demonstração analítica de cada um deles em cotejo com a decisão regional devidamente transcrita. Desatende, assim, a disciplina do artigo 896, § 1º-A, II e III, da CLT, que lhe atribui tal ônus. Se a lei exige a indicação precisa, acompanhada, como visto, da demonstração analítica, significa dizer que cada violação apontada deve ser acompanhada da argumentação, específica e clara, diante da circunstância de possuir, cada dispositivo, conteúdo próprio, o qual deve ser analisado naquilo em que é atingido pela decisão. Não basta discorrer em longa narrativa as inúmeras violações e, ao final, relacionar os dispositivos, como se todos eles fossem iguais, ainda que tratem do mesmo tema. Os argumentos mencionados pelo recorrente também servirão de balizamento e limite para o exercício do contraditório e da atuação desta Corte que, mais ainda, atribui ao recurso de revista a condição de recurso de fundamentação vinculada. Ressalte-se, ainda, que a parte transcreve arestos para confronto de teses, entretanto todos são provenientes deTurma do TST, órgão não enumerado no artigo 896 da CLT. Agravo conhecido e não provido.
A decisão foi unânime.
Processo: RRAg-101069-52.2017.5.01.0511