A Terceira Seção reafirmou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que a apuração de fraude em financiamento bancário com destinação específica é competência da Justiça Federal, uma vez que também é hipótese de crime contra o Sistema Financeiro Nacional.
O conflito negativo de competência foi suscitado por um juízo federal no Maranhão após o juiz de direito de São Luís declinar da competência para processar e julgar a fraude em financiamento para a compra de uma moto.
O juiz estadual determinou a remessa do feito à Justiça Federal, pois a situação se amoldaria ao tipo penal previsto no artigo 19 da Lei 7.492/86, sendo a competência da Justiça Federal. Além disso, citou jurisprudência do STJ segundo a qual é necessário que o financiamento tenha destinação específica, distinguindo-se do empréstimo que possui destinação livre, condição atendida no caso em análise, já que o crime teve o objetivo de compra de um veículo.
Para o juízo federal, no entanto, não haveria nos autos qualquer prova de fato praticado em detrimento de gestão financeira, ainda que por equiparação.
O Ministério Público Federal (MPF) emitiu parecer opinando pela competência da Justiça estadual, pois, ainda que se configure crime contra o sistema financeiro, não haveria interesse da União.
Interpretação mais literal
Para o relator do conflito, ministro Joel Ilan Paciornik, a tese do Ministério Público “é incongruente porque encontra entrave no artigo 26 da Lei 7.492/86, segundo o qual, a ação penal, nos crimes previstos nesta lei, será promovida pelo Ministério Público Federal perante a Justiça Federal”.
Em seu voto, o ministro citou acórdãos da Terceira Seção que reafirmaram o entendimento jurisprudencial de que, para a configuração desse tipo de delito, basta a obtenção, mediante fraude, de financiamento em instituição financeira, com a destinação específica dos valores obtidos.
“Em outras palavras, o STJ manteve sua jurisprudência no sentido de que o crime tipificado no artigo 19 da Lei 7.492/86 não exige, para a sua configuração, efetivo ou potencial abalo ao sistema financeiro”, disse.
O relator citou ainda o acórdão no CC 156.185, no qual o relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ponderou que, em razão de a lei não exigir ameaça ou lesão ao funcionamento do sistema financeiro para a configuração de crime, a corte optou por uma interpretação mais próxima da literalidade da norma.
O recurso ficou assim ementado:
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE A JUSTIÇA ESTADUAL E A JUSTIÇA FEDERAL. FRAUDE EM FINANCIAMENTO JUNTO A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PARA A AQUISIÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. FINANCIAMENTO COM DESTINAÇÃO ESPECÍFICA. CARACTERIZAÇÃO, EM TESE, DO DELITO DESCRITO NO ART. 19 DA LEI N. 7.492⁄86. AUSÊNCIA DE NECESSIDADE DE POTENCIAL ABALO DO SISTEMA FINANCEIRO COMO UM TODO PARA A CONFIGURAÇÃO DO DELITO. ART 26 DA LEI N. 7.492⁄86. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.1. O presente conflito negativo de competência deve ser conhecido, por se tratar de incidente instaurado entre juízos vinculados a Tribunais distintos, nos termos do art. 105, inciso I, alínea “d” da Constituição Federal – CF.2. A nova orientação no âmbito do Ministério Público Federal no sentido de que compete à Justiça Estadual apurar condutas delitivas que afetam apenas o patrimônio de instituições financeira e não o Sistema Financeiro como um todo não prosperou nesta Corte, a qual entende que para a configuração do delito descrito no art. 19 da Lei n. 7.492⁄86, basta a obtenção, mediante fraude, de financiamento em instituição financeira com destinação específica dos valores obtidos. Em outras palavras, o Superior Tribunal de Justiça – STJ manteve sua jurisprudência no sentido de que o crime tipificado no art. 19 da Lei n. 7.492⁄86 não exige, para a sua configuração, efetivo ou potencial abalo ao Sistema Financeiro. Precedente.3. Conforme art. 26 da Lei n. 7492⁄86,a ação penal, nos crimes previstos na mencionada lei, será promovida pelo Ministério Público Federal perante a Justiça Federal.4. Conflito de competência conhecido para declarar que compete o Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Maranhão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): CC 161707