Indeferimento de testemunhas arroladas pelo acusado ferem os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa

Decidiu a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) conceder a ordem de habeas corpus (HC) para determinar a oitiva de testemunhas arroladas na resposta à acusação. A oitiva havia sido indeferida pelo Juízo Federal da Subseção Judiciária de Oiapoque (AC) apesar de a primeira instância ter permitido à defesa do paciente (acusado no processo) que apresentasse a resposta fora do prazo estabelecido em razão da troca de defensor.

O paciente (que é quem, na ação de HC, tem sua liberdade de ir e vir ameaçada) foi denunciado pela suposta prática dos crimes de receptação qualificada, usurpação do patrimônio da União, lavagem de capitais e organização criminosa em razão de desdobramento da chamada Operação Crisol.

A Justiça Federal de Oiapoque/AC deferiu a apresentação de resposta do acusado, mas negou à defesa o direito de arrolar testemunhas ao fundamento da preclusão (perda do direito de se manifestar por não ter sido a manifestação realizada no momento oportuno).

Ao analisar o processo de HC, o relator, desembargador federal Néviton Guedes, destacou que, conforme disposto Código de Processo Penal (CPP), quando a resposta à acusação não é apresentada no prazo legal, é nomeado um defensor, pelo juízo, para oferecer essa resposta, reabrindo, assim, a possibilidade à nova defesa para realizar todos os atos necessários, inclusive arrolar testemunhas.

Com isso, prosseguiu o magistrado, a perda do prazo para a apresentação da peça processual denominada resposta à acusação não gera o efeito de inviabilizar a produção de prova testemunhal pela defesa, mas a reabertura do prazo para o novo defensor, sendo que o rol de testemunhas é parte integrante da resposta.

O relator concluiu que excluir a possibilidade ao defensor de arrolar testemunhas configura constrangimento ilegal e ofensa ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa e votou pela concessão da ordem de HC a fim de determinar a oitiva das duas testemunhas arroladas na referida peça processual.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHA REQUERIDA EM RESPOSTA À ACUSAÇÃO APRESENTADA FORA DO PRAZO LEGAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA.

1. Busca-se com o presente habeas corpus  afastar a decisão da autoridade impetrada que, não obstante tenha admitido que a defesa do paciente apresentasse a resposta à acusação fora do prazo legal estabelecido, deliberou no sentido de impossibilidade de arrolamento de testemunhas na referida peça, sob argumento de que precluso o momento de fazê-lo.

2. Segundo o que dispõe o art. 396-A do CPP, o  rol  de  testemunhas  deve  ser apresentado no momento processual adequado,  ou  seja,  quando da apresentação da resposta à acusação. O §2º do referido artigo não deixa dúvidas quanto à obrigatoriedade de apresentação da resposta à acusação, já que prevê que, na hipótese de inércia do acusado, incumbirá ao juiz nomear defensor dativo para oferecê-la no prazo de 10 dias.

3. A consequência jurídica da não apresentação de resposta no prazo legal, nos termos da norma processual, é a nomeação de defensor para oferecê-la, reabrindo, assim, a possibilidade à nova defesa para arguir preliminares, alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas.

4. A perda do prazo para a apresentação de resposta à acusação não gera o efeito de inviabilizar a produção de prova testemunhal pela defesa, mas a reabertura do prazo para a apresentação da peça processual por novo defensor.

5. No caso concreto, o magistrado, a par de permitir à defesa constituída apresentar, porque peça obrigatória, a resposta à acusação não apresentada no prazo legal, excluiu a possibilidade de, nessa peça, a defesa arrolar testemunhas.

6. O rol de testemunhas é parte integrante da resposta à acusação, representando a materialização da pretensão do acusado de produzir provas em juízo, um direito cuja inobservância configura ofensa ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa. Precedente.

7. A negativa do juízo em admitir as testemunhas arroladas pela defesa na resposta à acusação, no caso específico, não guarda conformidade ao que dispõe o art. 396-A, caput e §2º, do CPP.

8. Ordem de habeas corpus que se concede para rever a decisão do juízo de origem que indeferiu o arrolamento de testemunhas na resposta à acusação e determinar a oitiva das duas testemunhas que, ao fim, foram arroladas na referida peça processual.

Processo: 1018434-20.2021.4.01.0000

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