Incapacidade permanente para o trabalho rural leva 1ª Turma a converter auxílio-doença em aposentadoria por invalidez

De forma unânime, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou provimento à apelação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para que fosse cancelado o auxílio-doença anteriormente concedido a uma beneficiária. A decisão foi da 1ª Turma que converteu o auxílio-doença em aposentadoria por invalidez.

A autora ajuizou ação na Justiça Estadual do Piauí, Comarca de Manoel Emídio, pedindo o restabelecimento do auxílio-doença que teria sido cessado indevidamente. Afirmou que já vinha recebendo o benefício por incapacidade como segurada especial (trabalhadora rural) por dois anos seguidos quando a autarquia previdenciária suspendeu o pagamento de forma arbitrária, embora a requerente ainda não tivesse condições físicas de retornar à atividade laboral em virtude de persistência da enfermidade. Em seu trabalho rural, a demandante, que nasceu em 1956, atestou que seu corpo é exigido com intensos esforços físicos e que tem patologias da coluna vertebral como espondilose, discopatia degenerativa lombar, estenose do canal medular em L4-L5, espondilolistese lombossacral e protrusão discal em L5-S1. Tais enfermidades incapacitam a periciada para atividade laborativa habitual, obrigando-a a realizar tratamento por equipe multidisciplinar contínuo, já que não existe perspectiva de cura.

Na apelação ao TRF1, o INSS afirmou que, por meio de perícia médica administrativa, foi constado que a autora já havia concluído o limite médico concedido, razão pela qual ela teria sido intimada a oferecer recurso na Junta de Recursos da Previdência Social (JRPS). Alegou também que após a realização de uma das perícias médicas periódicas, previstas no artigo 101t da Lei n° 8.213/91, teria sido detectada a recuperação da capacidade laboral da beneficiária, dando ensejo ao cancelamento do benefício. Sustentou a autarquia que a perícia judicial não se mostrou suficiente para infirmar o diagnóstico da perícia administrativa, apresentando contradição entre as respostas.

O relator, desembargador federal Wilson Alves de Souza, o analisar o caso, concluiu que houve indevido cancelamento do auxílio-doença ante a permanência do estado incapacitante decorrente da mesma enfermidade que justificou a concessão anterior. Com isso, tendo o perito concluído que as enfermidades que acometem a autora não têm cura, deixando-a incapaz para o trabalho rural de forma permanente, deve haver a conversão do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez. “É valido lembrar que o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez se diferenciam apenas quanto à intensidade da incapacidade, se temporária ou permanente, de forma parcial ou total, com vistas ao exercício das atividades laborais, razão pela qual pode haver a conversão de um benefício para o outro, inclusive de ofício. Assim, deve ser restabelecido o auxílio-doença desde a sua indevida cessação com a sua conversão em aposentadoria por invalidez a partir do laudo pericial. Sobre as parcelas pretéritas deve incidir correção monetária e juros moratórios de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal”, destacou o magistrado em seu voto.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. TRABALHADORA RURAL. LAUDO PERICIAL FAVORÁVEL. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

1. Trata-se de remessa necessária e apelação do INSS contra sentença que determinou a concessão de auxílio-doença a partir do seu cancelamento na via administrativa.

2. De início, cumpre observar ter havido erro na autuação quando da chegada dos autos nesta Corte, na qual constou o nome de BENEDITA VERÔNICA DE ARRUDA ASSUNÇÃO como Apelada, sendo que, na realidade, a ação de restabelecimento do auxílio-doença foi ajuizada por FELISBELA PEREIRA DE BRITO. Assim, suscita-se questão de ordem, para anular o acórdão anterior, passando-se a novo julgamento.

3. A decisão recorrida foi proferida sob a vigência do CPC de 1973, de modo que não se lhe aplicam as regras do CPC atual.

4. As informações relativas ao valor do auxílio-doença da parte autora (próximo a um salário mínimo) e ao total das parcelas em atraso até a prolação da sentença (DIB em 31/08/2005 até 20/11/2009) demonstram que a condenação imposta ao INSS não tem o potencial de ultrapassar 60 salários mínimos, conforme exigência prevista no art. 475, §2º, do CPC/73. Desse modo, não se conhece da remessa necessária.

5. Sublinha-se que a anterior concessão de benefício por incapacidade pela Autarquia Previdenciária comprova a qualidade de segurada especial da Requerente, bem como cumprimento do período de carência, salvo se ilidida por prova em contrário. No caso, o INSS reconheceu, administrativamente, a qualidade de segurada da Autora, bem como a incapacidade laboral, concedendo-lhe o benefício de auxílio-doença no período de 27/11/2003 a 31/08/2005, de modo que a controvérsia envolve apenas a permanência da incapacidade laborativa.

6. O expert do Juízo atestou que a Demandante, nascida em 1956, trabalhadora rural, cujo exercício da atividade exige esforços físicos intensos, “(…) é portadora de patologias da coluna vertebral, destacando-se a espondilose, discopatia degenerativa lombar, estenose do canal medular em L4-L5, espondilolistese lombo-sacral e protrusão discai em L5-S1. Tais patologias incapacitam a periciada para atividade laborativa habitual, obrigando-a a tratamento por equipe multidisciplinar contínuo, já que não existe perspectiva de cura”. Registre-se que o fato da Autora ser pessoa com parcos recursos financeiros, não tem condições de se submeter a tratamento contínuo, avultando evidente a situação de irreversibilidade da incapacidade laboral.

7. Forçoso concluir que houve indevido cancelamento do auxílio-doença, ante a permanência do estado incapacitante decorrente da mesma doença que justificou a concessão anterior. A par disso, tendo o Perito concluído pela que as enfermidades que acometem a Suplicante não têm cura, deixando-a incapaz para o trabalho rural de forma perene, deve haver a conversão do benefício em aposentadoria por invalidez.

8. Rememore-se que o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez se diferenciam, apenas, quanto à intensidade da incapacidade, se temporária ou permanente, de forma parcial ou total, com vistas ao exercício das atividades laborais, razão pela qual pode haver a conversão de um benefício para o outro, inclusive de ofício. Nesta toada, deve ser restabelecido o auxílio-doença desde a sua indevida cessação com a sua conversão em aposentadoria por invalidez a partir do laudo pericial.

9. Sobre as parcelas pretéritas, deve incidir correção monetária e juros moratórios de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do RE 870.947/SE (Tema 810 da repercussão geral) e do REsp. 1.495.146-MG (Tema 905). A partir de 09/12/2021, data da publicação da EC 113/21, deve incidir apenas a taxa Selic sobre a condenação, que já compreende juros de mora e correção monetária, nos termos do art. 3º da referida Emenda Constitucional.

10. No tocante aos honorários de sucumbência, o percentual de 10% fixado pelo Juízo a quo, incidindo apenas sobre as parcelas vencidas, afigura-se razoável e em consonância com os critérios legais então vigentes (CPC/73, art.20, §§ 3º e 4º), harmonizando-se ainda com jurisprudência desta Primeira Turma.

11. Remessa necessária não conhecida e apelação parcialmente provida, apenas para reduzir a taxa de juros, devendo ser convertido, de ofício, o auxílio-doença em aposentadoria por invalidez na data do laudo pericial.

Processo nº: 0002863-60.2010.4.01.9199

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