A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) garantiu uma vaga no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA), pelo sistema de cotas, a uma estudante que cursou apenas a primeira série do ensino fundamental em escola particular como bolsista, no curso Técnico em Edificações – Integrado ao Ensino Médio.
A aluna interpôs apelação contra a decisão do Juízo da 2ª Vara Federal do Pará alegando que estudou durante toda sua vida em escola pública e apenas uma série do ensino fundamental em escola particular, com bolsa integral. Defende que a negativa de matrícula aronta os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no tocante à concretização da garantia de igualdade de acesso ao ensino superior. Requer a reforma da decisão, posto que preenche os requisitos para o enquadramento no sistema de cotas, em virtude de ter realizado o ensino fundamental integralmente em escola pública, tendo cursado apenas o 2º ano/1ª série do Ensino Fundamental em escola de rede particular, na condição de bolsista.
O relator do recurso, desembargador federal Souza Prudente, afirmou que deve ser resguardada a igualdade formal e material ente as pessoas. Segundo o magistrado, restringir as ações sociais a somente uma parcela da sociedade, no sentido de reconhecer a defasagem do ensino público e conceder privilégios aos que o frequentam afigura-se manifestamente contrário aos objetivos de construção justa, de erradicação da pobreza e da marginalização, da redução das desigualdades sociais e à promoção do bem de todos, sem preconceitos e discriminação, de qualquer natureza.
Para concluir, o desembargador federal sustentou que “a tutela jurisdicional buscada nestes autos se encontra em sintonia com o exercício do direito constitucional à educação (CF, art. 205) e com a expectativa de futuro retorno intelectual em proveito da nação, que há de prevalecer sobre formalismos eventualmente inibidores e desestimuladores do potencial científico daí decorrente.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. MATRÍCULA. SISTEMA DE POLÍTICA DE AÇÕES AFIRMATIVAS. CURSOU APENAS UMA SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL EM ESCOLA DA REDE PARTICULAR DE ENSINO NA CONDIÇÃO DE BOLSISTA. PREPONDERÂNCIA DA VIDA ESTUDANTIL EM ESCOLA DA REDE PÚBLICA. RAZOABILIDADE. SITUAÇÃO CONSOLIDADA. SENTENÇA REFORMADA.
I – Afigura-se manifesta a legitimidade da pretensão postulada pela impetrante, na medida em que, embora não tenha cursado integralmente o ensino fundamental em escola pública, deve ser aplicado, no caso em exame, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, com vistas a assegurar a concretização da ação afirmativa àqueles reconhecidamente carentes, visto que estudou em escola particular tão somente uma série série do ensino fundamental, na condição de bolsista.
II Registre-se que, em casos assim, este egrégio Tribunal tem entendimento firmado, no sentido de mitigar-se a exigência ora questionada, quando demonstrada a inequívoca preponderância da vida estudantil em escola da rede pública de ensino, como no caso em exame. Precedentes.
III – Ademais, restringindo-se a pretensão postulada nestes autos à matrícula da impetrante no curso Técnico em Edificações – Integrado ao Médio, a qual já se concretizou, por força da tutela recursal deferida no Agravo de Instrumento nº 1003008-41.2016.4.01.0000, datada de 14/07/2016, resta caracterizada, na espécie, uma situação de fato já consolidada, cujo desfazimento já não mais se recomenda, na linha do entendimento jurisprudencial consagrado em nossos tribunais, em casos que tais.
IV – Por fim, há de ver-se que a tutela jurisdicional pretendida nestes autos se encontra em sintonia com o exercício do direito constitucional à educação (CF, art. 205) e com a expectativa de futuro retorno intelectual em proveito da nação, que há de prevalecer sobre formalismos eventualmente inibidores e desestimuladores do potencial científico daí decorrente.
V Apelação provida. Sentença reformada, para assegurar a matrícula da impetrante no curso Técnico em Edificações – Integrado ao Médio.
A 5ª Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação, nos termos do voto do relator.
Processo: 1000009-55.2016.4.01.3900