Frigorífico indenizará empregado que contraiu epilepsia após acidente

A queda de carcaça sobre sua cabeça causou trauma craniano

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Marfrig Frigoríficos Brasil S.A. contra condenação ao pagamento de indenização a um auxiliar de produção que, após ser atingido na cabeça pela carcaça de um bovino, sofreu perda da consciência e processos convulsivos. O colegiado salientou que a decisão se baseou em laudos técnicos pedidos pela Justiça.

Meio boi

O acidente de trabalho ocorreu em junho de 2006 no setor de desossa do Frigorífico Mercosul S.A., em Capão do Leão (RS), unidade depois arrendada à Marfrig.  Segundo o trabalhador, um colega cometeu um erro e soltou uma carcaça, “meio boi”, de aproximadamente 200 kg, sobre sua cabeça. Com o impacto, seu capacete quebrou, e ele ficou desacordado por três horas. Sete meses após o acidente, começou a ter crises convulsivas de difícil controle, apesar de tomar medicamentos.

Trauma craniano x epilepsia

O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) condenou as empresas a pagarem indenização de R$ 10 mil, com base em depoimento de testemunha e, principalmente, em laudos periciais de um psiquiatra e de um otorrinolaringologista, realizados por determinação do juízo da 4ª Vara de Pelotas (RS).

Conforme o documento, há nexo causal entre a epilepsia e o acidente com trauma craniano e evidências de que as sequelas estão diretamente relacionadas à lesão causada na cabeça do empregado, pois, até então, não havia notícias de que ele tivesse sofrido convulsões ou crises epilépticas.

Responsabilidade civil

O relator do recurso de revista da Marfrig, ministro Evandro Valadão, explicou que, de acordo com o TRT, ficaram caracterizados os requisitos configuradores da responsabilidade subjetiva da empresa: o nexo de causalidade entre o acidente de trabalho e as atividades do empregado, as lesões e a redução da capacidade de trabalho, além da culpa do empregador, pela inobservância das regras de proteção à segurança no trabalho, que contribuiu para o acidente. Nessas circunstâncias, há o dever de indenizar, nos termos dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil.

Ainda conforme o relator, a alteração da conclusão do TRT, para que prevalecesse a tese da Marfrig de inexistência de ato ilícito e nexo causal, exigiria o revolvimento do quadro fático-probatório, o que é vedado na esfera recursal extraordinária do TST.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL. PUBLICAÇÃO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. 1. ACIDENTE DE TRABALHO. NEXO DE CAUSALIDADE. ARGUIÇÃO DE VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA .

I. A condenação baseou-se, principalmente, na prova pericial técnica, da qual emergem elementos que conduzem à conclusão de que o reclamante sofreu acidente de trabalho no dia 08.06.2006 causado pela queda de parte de “bovino/carcaça” sobre sua cabeça. Restou comprovada, pois, a existência de nexo de causalidade entre o ” evento danoso e os malefícios daí oriundos ao autor” . Isto é, ” nexo causal entre a epilepsia e o acidente com trauma craniano ocorrido na reclamada”.

II. A condenação ocorreu com base nos fatos e provas produzidas. Assim, os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa foram assegurados à recorrente, que vem se utilizando dos meios e recursos hábeis para discutir todas questões controvertidas.

III. Recurso de revista de que não se conhece .

2. ILEGITIMIDADE PASSIVA. CARÊNCIA DA AÇÃO. SUCESSÃO DE EMPREGADORES.

I . Não houve tese explícita acerca da matéria suscitada, o que torna preclusa a oportunidade de se insurgir sob tais aspectos neste momento processual.

II . Recurso de revista de que não se conhece.

3. ACIDENTE DO TRABALHO. QUEDA DE PARTE DE “BOVINO/CARCAÇA” SOBRE A CABEÇA DO EMPREGADO. NEXO CAUSAL ENTRE A EPILEPSIA E O ACIDENTE COM TRAUMA CRANIANO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. DANO MORAL E MATERIAL.

I. O Tribunal Regional, soberano no exame do conjunto fático probatório, concluiu existir nexo causal entre a epilepsia e o acidente com trauma craniano ocorrido na reclamada”. Consignou ainda que “foi determinada a realização de prova técnica, a cargo de dois profissionais, um psiquiatra e um otorrinolaringologista. E, que, “no tocante à alegada lesão na região do crânio, os documentos acostados tornam incontroversa a ocorrência do evento/acidente, decorrente da queda de parte de um bovino sobre a cabeça da parte reclamante, que lhe causou princípio de desmaio/perda da consciência momentânea”. Enfim, “do acidente surgiram sequelas diretamente relacionadas à lesão causada em sua cabeça, pois até então não há notícias de que tenha sofrido convulsões e/ou crises epilépticas”.

II. A condenação baseou-se na prova produzida, em especial no laudo pericial técnico conclusivo no sentido de que a parte reclamante sofreu acidente de trabalho causado pela queda de parte de um “bovino/carcaça” sobre sua cabeça. Consequentemente, foi comprovada a existência de nexo de causalidade entre “o evento danoso e os malefícios daí oriundos ao autor”.

III. Caracterizados os requisitos configurados da responsabilidade subjetiva, a saber, a existência de nexo de causalidade entre o acidente de trabalho e as atividades profissionais da parte reclamante, as lesões e a redução da capacidade de trabalho decorrentes do evento danoso, bem como a culpa do empregador, pela inobservância das regras de proteção à segurança no trabalho que contribuiu ao referido acidente de trabalho, emerge dever de indenizar, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil, pois a obrigação de reparar o dano encontra fundamento nos mencionados dispositivos e na inobservância das regras protetoras em matéria de segurança e higidez do meio ambiente de trabalho.

IV. Recurso de revista de que não se conhece.

4. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO.

I. Conforme a jurisprudência desta Corte, a revisão do valor da indenização por danos morais e materiais mediante recurso de natureza extraordinária somente é possível quando exorbitante ou insignificante a importância arbitrada e em flagrante violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

II. O Tribunal Regional, com fundamento no conjunto fático-probatório dos autos, reconheceu caracterizado o dano moral e material. Ao arbitrar o quantum indenizatório relativamente aos danos materiais, a Corte a quo considerou o percentual de incapacidade laborativa, o valor do último salário mensal comprovado nos autos, a expectativa de sobrevida no Brasil para o sexo masculino, segundo a tábua de mortalidade do IBGE e ainda a idade do reclamante, quando da ocorrência do acidente (25 anos). Arbitrou, pois, a condenação em R$ 49.000,00. Quanto aos danos morais, consignou que houve negligência da parte reclamada quanto à proteção da saúde do empregado. ” Nesse contexto, tendo em vista a capacidade econômica dos reclamados, o grau de culpa no evento danoso, a restrição da capacidade laborativa causada ao ofendido, o caráter de reparação e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixa-se o valor da indenização por danos morais em R$ 10.000,00″.

III. No caso em tela, não constou no acórdão regional quais foram os parâmetros objetivos, subjetivos ou circunstanciais observados no arbitramento do montante indenizatório, cabia à parte reclamante opor, oportunamente, embargos de declaração instando a Corte de origem a se manifestar acerca dos critérios de arbitramento, o que não ocorreu, impedindo o conhecimento do recurso de revista, no tema.

IV. Recurso de revista de que não se conhece

5. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

I. Para o deferimento da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, é suficiente a declaração de hipossuficiência econômica, com esteio na Súmula nº 463, I, do TST. Por outro lado, no tocante aos honorários advocatícios, há que se observar o entendimento consolidado no âmbito desta Corte Superior de que é necessária a ocorrência concomitante de três requisitos: (a) sucumbência do empregador, (b) comprovação do estado de miserabilidade jurídica do Reclamante e (c) assistência do trabalhador pelo sindicato da categoria (existência de credencial sindical). Esse é o entendimento que se extrai dos arts. 14, 16 e 18 da Lei nº 5.584/70 e das Súmulas 219, I, e 329 do TST.

II. No caso dos autos, com base no que consta do acórdão regional, nota-se que não foram preenchidos todos os requisitos da Lei 5.584/70, tendo em vista que a parte reclamante, embora tenha apresentado declaração da sua situação de hipossuficiência econômica, não está assistido pelo sindicato de classe.

III. Assim, conclui-se que o Tribunal Regional, ao considerar suficiente a declaração de pobreza para condenar a parte reclamada ao pagamento de honorários advocatícios, contrariou as Súmulas nº 219 e 329 do TST.

IV. Recurso de revista de que conhece e a que se dá provimento.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-126-76.2012.5.04.0104  

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