Farmácia deve indenizar consumidores orientados a substituir medicamento prescrito por médico

A 2ª Turma Cível do TJDFT manteve a sentença que condenou a Drogaria Genérica do Povo a indenizar uma família, cujo filho sofreu lesões na pele após usar o medicamento sugerido pelo balconista. O remédio era diferente do que havia sido prescrito pelo médico, que estava em falta. O colegiado observou que houve falha na prestação do serviço.

Consta no processo que os autores foram ao estabelecimento do réu para comprar uma loção dermatológica, conforme prescrição médica, para combater o ressecamento de pele do filho. Eles relatam que, como a loja não possuía o produto receitado, um funcionário indicou medicamento com composição semelhante.

Os pais contam que compraram o produto indicado pelo funcionário, mas que, após administrá-lo no filho, notaram o surgimento de placas vermelhas na pele. A criança teria ainda ficado irritada e apresentado choro constante. Os pais relatam ainda que, ao ir mais uma vez ao pediatra, foram informados de que se tratava de medicamentos diferentes e que uma das substâncias da composição do remédio queimava e irritava a pele dos bebês. Defendem que sofreram danos morais.

Decisão da 2ª Vara Cível de Sobradinho condenou o réu a indenizar os autores pelos danos sofridos e a restituir o valor pago pela medicação. A farmácia recorreu sob o argumento de que não há provas de que o medicamento que causou danos foi comprado por indicação ou indução de um dos seus funcionários. Defende que não praticou ato ilícito e que não ficaram demonstrados abalos capazes de gerar dano moral.

Ao analisar o recurso, a Turma explicou que o entendimento do TJDFT é de que a venda de medicação diferente da prescrita pelo médico configura falha na prestação de serviço. No caso, segundo o colegiado, é “inafastável a conclusão sobre o direito à indenização pelos danos materiais e morais”, pedidos pelos autores.

De acordo com a Turma, as provas do processo demonstram que o produto comprado pelos autores por sugestão do funcionário é diferente do prescrito pelo médico e que o uso da medicação piorou o quadro de irritação na pele da criança. Além disso, segundo o colegiado, o réu não apresentou provas para “comprovação da inexistência de falha na prestação do serviço ou a culpa exclusiva dos consumidores ou de terceiro”

“Os autores atribuíram ao preposto da apelante a sugestão de substituição do medicamento receitado pelo médico pediatra, diante da falta do produto indicado no estabelecimento comercial, sob a garantia de que o produto sugerido possuía o mesmo princípio ativo e indicação de uso. Nesse contexto, caberia ao réu, ora apelante, o ônus da prova quanto ao fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito dos autores”, registrou.

Dessa forma, a Turma manteve a sentença que condenou a Drogaria Genérica do Povo a pagar a quantia de R$ 2 mil a cada um dos três autores a título de danos morais. A ré terá ainda que devolver o valor de R$ 99,44, referente ao que foi pago pelo medicamento.

O recurso ficou assim ementado:

APELAÇÃO. CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DE JUSTIÇA REJEITADA. PRESCRIÇÃO MÉDICA. FÁRMACO. SUBSTITUIÇÃO POR ORIENTAÇÃO DE BALCONISTA DE DROGARIA. PRODUTO INADEQUADO. DANOS DERMATOLÓGICOS PROVOCADOS AO MENOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADOS. INDENIZAÇÃO. VALOR INFERIOR AO PLEITEADO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. NÃO CONFIGURAÇÃO. SÚMULA N. 326 DO STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

  1. Muito embora seja relativa a presunção de veracidade da declaração a que se refere o art. 99, § 3º, do CPC, a concessão da gratuidade só pode ser revogada mediante a presença de fundadas razões, lastreadas em elementos de prova suficientes para infirmar a presunção de veracidade da declaração de insuficiência de recursos firmada pelos autores, ora apelados, o que não se verificou na espécie. Nesse passo, a par da ausência de elementos suficientes para tanto, não há falar em revogação da gratuidade de justiça, razão pela qual se rejeita a impugnação à concessão do benefício aduzida em preliminar da apelação.

  2. Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada contra a drogaria apelante, pela substituição de medicamento/produto prescrito por profissional médico sob a garantia de que o substituto sugerido possuía o mesmo princípio ativo e indicação de uso, mas que, em verdade, era distinto e contraindicado para ministração em crianças. A aplicação do referido fármaco ocasionou lesões dermatológicas no menor e deu origem à pretensão de indenização por danos materiais e morais.

  3. A relação jurídica estabelecida entre as partes se submete ao CDC, o qual atribui responsabilidade objetiva ao fornecedor pelos serviços prestados, sendo esta afastada somente com a prova da inexistência do defeito no serviço ou da ocorrência de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme previsão do art. 14, § 3º, do diploma consumerista.

  4. A prova dos autos demonstra que o produto adquirido pelos autores na unidade da apelante, por sugestão do seu preposto, é distinto daquele prescrito pelo pediatra do menor e que sua ministração ocasionou lesões avermelhadas na pele da criança, piorando o quadro de irritação que se buscava tratar e ocasionando sofrimento físico e mental às partes. A apelante, por sua vez, não se desincumbiu do ônus da prova quanto ao fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito dos autores, na forma do art. 373, II, do CPC, mormente para a comprovação da inexistência de falha na prestação do serviço ou a culpa exclusiva dos consumidores ou de terceiro. Assim, deve ser mantido o reconhecimento do dever de indenizar.

  5. Na esteira do entendimento sumulado pelo c. STJ no enunciado n. 326, “Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca”. Na hipótese de sucumbência mínima de um dos litigantes, deve a parte adversa suportar integralmente o pagamento dos honorários advocatícios, na forma do art. 86, parágrafo único, do CPC.

  6. Recurso conhecido e desprovido. Honorários majorados.

A decisão foi unânime.

Acesse o PJe2 e saiba mais sobre o processo: 0703818-94.2021.8.07.0006

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