Estado não é obrigado a fornecer medicamentos de alto custo não registrados na Anvisa

As situações excepcionais serão definidas na formulação da tese de repercussão geral, que atingirá mais de 42 mil processos sobre o mesmo tema.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (11) que o Estado não é obrigado a fornecer medicamentos de alto custo solicitados judicialmente quando não estiverem registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), salvo em situações excepcionais que ainda serão definidas na formulação da tese de repercussão geral (Tema 6). A decisão, tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 566471, atinge mais de 42 mil processos sobre mesmo tema.

O caso concreto diz respeito à recusa do Estado do Rio Grande do Norte de fornecer citrato de sildenafila para o tratamento de cardiomiopatia isquêmica e hipertensão arterial pulmonar de uma senhora idosa e carente, com fundamento no alto custo do medicamento e na ausência de previsão de fornecimento no programa estatal de dispensação de medicamentos. A paciente acionou a Justiça para pleitear que o estado fosse obrigado a fornecer o remédio. O juízo de primeiro grau determinou a obrigação do fornecimento, decisão que foi confirmada pelo Tribunal de Justiça estadual.

Corrente vencedora

A maioria dos ministros – oito votos no total – desproveu o recurso tendo como condutor o voto do relator, ministro Marco Aurélio, proferido em setembro de 2016. A vertente vencedora entendeu que, nos casos de remédios de alto custo não disponíveis no sistema, o Estado pode ser obrigado a fornecê-los, desde que comprovadas a extrema necessidade do medicamento e a incapacidade financeira do paciente e de sua família para sua aquisição. O entendimento também considera que o Estado não pode ser obrigado a fornecer fármacos não registrados na agência reguladora.

O ministro Edson Fachin abriu divergência e votou em favor do fornecimento imediato do medicamento solicitado, tendo em vista que, durante o trâmite do processo, ele foi registrado e incluído na política de assistência à saúde. O julgamento, na ocasião, foi interrompido por pedido de vista do ministro Teori Zavascki (falecido), sucedido pelo ministro Alexandre Moraes.

Excesso de judicialização

Na sessão de hoje, o ministro Alexandre acompanhou o relator. No seu entendimento, o excesso de judicialização da saúde tem prejudicado políticas públicas, pois decisões judiciais favoráveis a poucas pessoas, por mais importantes que sejam seus problemas, comprometem o orçamento total destinado a milhões de pessoas que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS). “Não há mágica orçamentária e não há nenhum país do mundo que garanta acesso a todos os medicamentos e tratamentos de forma generalizada”, afirmou.

Também votaram na sessão de hoje as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Luiz Fux. Todos acompanharam o entendimento do relator pelo desprovimento do recurso. Em seus votos, eles salientaram que, em caráter excepcional, é possível a concessão de medicamentos não registrados na lista da Anvisa. Nesse sentido, fizeram a ponderação entre diversos argumentos, como as garantias constitucionais (entre elas a concretização dos direitos fundamentais, o direito à vida e à dignidade da pessoa humana), o limite do financeiramente possível aos entes federados, tendo em vistas restrições orçamentárias, o desrespeito às filas já existentes e o prejuízo a outros interesses idênticos.

Todos os ministros apontaram condicionantes em seus votos, que serão analisadas na produção da tese de repercussão geral.

O recurso está assim provisoriamente:

Após o voto do Ministro Marco Aurélio (Relator), que fixava a seguinte tese (tema 6 da repercussão geral): “O reconhecimento do direito individual ao fornecimento, pelo Estado, de medicamento de alto custo, não incluído em Política Nacional de Medicamentos ou em Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional, depende da comprovação da imprescindibilidade – adequação e necessidade –, da impossibilidade de substituição do fármaco e da incapacidade financeira do enfermo e dos membros da família solidária, respeitadas as disposições sobre alimentos dos artigos 1.694 a 1.710 do Código Civil”; do voto do Ministro Alexandre de Moraes, que fixava tese no seguinte sentido: “Na hipótese de pleito judicial de medicamentos não previstos em listas oficiais e/ou Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT’s), independentemente de seu alto custo, a tutela judicial será excepcional e exigirá previamente – inclusive da análise da tutela de urgência -, o cumprimento dos seguintes requisitos, para determinar o fornecimento ou ressarcimento pela União: (a) comprovação de hipossuficiência financeira do requerente para o custeio; (b) existência de laudo médico comprovando a necessidade do medicamento, elaborado pelo perito de confiança do magistrado e fundamentado na medicina baseada em evidências; (c) certificação, pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC), tanto da inexistência de indeferimento da incorporação do medicamento pleiteado, quanto da inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS; (d) atestado emitido pelo CONITEC, que afirme a eficácia segurança e efetividade do medicamento para as diferentes fases evolutivas da doença ou do agravo à saúde do requerente, no prazo máximo de 180 dias. Atendidas essas exigências, não será necessária a análise do binômio custo-efetividade, por não se tratar de incorporação genérica do medicamento”; e do voto do Ministro Roberto Barroso, que fixava a seguinte tese: “O Estado não pode ser obrigado por decisão judicial a fornecer medicamento não incorporado pelo SUS, independentemente de custo, salvo hipóteses excepcionais, em que preenchidos cinco requisitos: (i) a incapacidade financeira de arcar com o custo correspondente; (ii) a demonstração de que a não incorporação do medicamento não resultou de decisão expressa dos órgãos competentes; (iii) a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS; (iv) a comprovação de eficácia do medicamento pleiteado à luz da medicina baseada em evidências; e (v) a propositura da demanda necessariamente em face da União, que é a entidade estatal competente para a incorporação de novos medicamentos ao sistema. Ademais, deve-se observar um parâmetro procedimental: a realização de diálogo interinstitucional entre o Poder Judiciário e entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde tanto para aferir a presença dos requisitos de dispensação do medicamento, quanto, no caso de deferimento judicial do fármaco, para determinar que os órgãos competentes avaliem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS.

Processo relacionado: RE 566471

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