Efetuado o requerimento do envio do processo à instância superior do Ministério Público Federal (MPF), após negativa de propositura de acordo de não persecução penal (ANPP), o juízo condutor do processo não possui discricionariedade de decidir sobre a mediação de um possível acordo em outro momento processual, assim decidiu a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao conceder a ordem de habeas corpus impetrado em causa própria por acusado de crime de usurpação de recursos minerais.
Argumentou o impetrante que a decisão do Juízo Federal da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Patos de Minas/MG configura constrangimento ilegal, já que, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal (CPP), a atribuição para o exame da possibilidade ou não de ANPP pertence ao órgão superior do MPF, e não à autoridade judiciária, e requereu a remessa dos autos para a instância superior do MPF.
O ANPP é instrumento de justiça consensual que, não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a quatro anos, poderá ser proposto pelo MPF, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente.
Na relatoria do processo, a juíza federal convocada Olívia Mérlin Silva explicou que “embora o simples requerimento do acusado não importe em automática remessa do processo ao órgão superior do Ministério Público, o certo é que o exame, pelo magistrado, das razões invocadas pelo acusado para postular a aplicação do art. 28-A, § 14 do CPP se restringe aos casos de manifesta inadmissibilidade do ANPP, por não estarem presentes, por exemplo, seus requisitos objetivos”, não sendo legítimo o exame do mérito a fim de impedir a remessa, conforme jurisprudência do TRF1 e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Com essas considerações, a magistrada votou no sentido da concessão da ordem de habeas corpus para determinar que a autoridade impetrada remeta os autos ao órgão superior do MPF para fins de avaliação da possibilidade de acordo de não persecução penal.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 28-A, § 14º, DO CPP. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. RECUSA DE PROPOSTA PELO MPF. OBRIGATORIEDADE DE REMESSA DOS AUTOS AO ÓRGÃO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, RESSALVADA MANIFESTA INADMISSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA.
1. Em exame habeas corpus impetrado contra ato imputado ao Juízo Federal da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Patos de Minas/MG, consistente na designação de audiência de instrução e julgamento sem que os autos fossem remetidos para instância ministerial superior, após irresignação da defesa quanto à negativa de propositura de acordo de não persecução criminal por parte do Ministério Público Federal, em violação ao artigo 28-A, § 14 do Código de Processo Penal.
2. Hipótese em que a autoridade impetrada deixou de adotar providência prevista em lei, designando a audiência de instrução e julgamento para o dia 01/08/2022, oportunidade em que avaliaria a possibilidade de eventual acordo de não persecução penal.
3. O § 14 do art. 28-A do CPP é taxativo ao prever que o investigado ou, no caso de já proposta a ação penal, o réu, poderá requerer a remessa do processo à instância superior do Ministério para que o órgão correlato examine, em caráter revisional, a negativa ministerial quanto à propositura do acordo de não persecução penal.
4. Embora o simples requerimento do acusado não importe em automática remessa do processo ao órgão superior do Ministério Público, o certo é que o exame, pelo magistrado, das razões invocadas pelo acusado para postular a aplicação do art. 28-A, § 14 do CPP se restringe aos casos de manifesta inadmissibilidade do ANPP, por não estarem presentes, por exemplo, seus requisitos objetivos. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, já assentou que o “controle do Poder Judiciário quanto à remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Publico deve se limitar a questões relacionadas aos requisitos objetivos, não sendo legítimo o exame do mérito a fim de impedir a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público” (HC n. 668.520/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 10/8/2021, DJe de 16/8/2021.)
5. Ordem de habeas corpus concedida para se determinar a remessa do processo ao órgão superior do MPF, na forma do art. 28-A, § 14, do CPP.
A decisão do Colegiado foi unânime.
Processo: 1021347-38.2022.4.01.0000