É crime brasileiro apresentar documento falso do exterior

A apresentação de documento falso de outro país – mesmo que o cidadão, brasileiro, esteja transitando no Brasil, é crime. A decisão é da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que confirmou esse ponto da sentença proferida anteriormente. O Colegiado reduziu a pena pecuniária e a de multa aplicadas após verificar a hipossuficiência financeira do infrator.

O caso ocorreu no estado do Tocantins quando um homem trafegava em seu carro por uma estrada federal e foi abordado pela Política Rodoviária Federal (PRF). Ele apresentou um documento falso, uma Carta de Condução da República Portuguesa em que constava nome diferente do dele.

Na apelação ao TRF1, o réu sustentou que não tinha intenção de usar o documento, mas teve de apresentá-lo a mando do policial, que logo percebeu a falsificação, configurando, assim, conforme os autos, “o crime impossível, já que o documento não enganaria ninguém”. Pediu a absolvição ou então a redução do pagamento da penalidade em dinheiro, considerando sua situação financeira.

 

Perícia – Para a relatora, juíza federal convocada Olívia Merlin Silva, não há dúvida quanto ao cometimento dos crimes, já que a falsificação da carta de condução só foi detectada pela perícia e o policial rodoviário confirmou que o condutor realmente apresentou o documento. A magistrada acrescentou que o fato de o documento ser estrangeiro não é relevante perante a lei para excluir o crime e votou por manter a condenação. Na presente questão, houve a prática de crime de falsificação e a apresentação de documento falso.

Quanto ao pedido de redução da pena pecuniária, de R$6.000,00, a magistrada considerou que se presume a hipossuficiência financeira do réu pela baixa escolaridade (primeiro grau incompleto) e o ofício de agropecuarista e concluiu pela redução do parâmetro de dia-multa aplicado a 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, bem como o valor da prestação pecuniária para 1 (um) salário mínimo.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL. USO DE DOCUMENTO ESTRANGEIRO FALSO. AUSÊNCIA DE DISTINÇÃO NA LEI QUANTO À ORIGEM DO DOCUMENTO. FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA. ALTERAÇÃO DO VALOR DO DIA-MULTA E DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

1. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face do Réu pela prática do crime descrito no art. 304 c/c o art. 297 do Código Penal, narrando que o Denunciado trafegava, em seu veículo, por rodovia federal, quando foi abordado pela Polícia Rodoviária Federal, ocasião em que, sendo-lhe solicitado que apresentasse seus documentos pessoais, apresentou Carta de Condução da República Portuguesa sob nome diverso do seu, documento que se verificou ser falso, tendo sido também apurado que o Denunciado não tinha nacionalidade portuguesa, como alegara, mas brasileira. A sentença condenou o Réu à pena de 2 (dois) anos de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, sendo cada dia-multa fixado à razão de 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente à época do fato, sendo a pena substituída por duas restritivas de direito, a saber, uma prestação de serviços à comunidade e uma prestação pecuniária.

2. A materialidade e autoria do delito estão confirmadas pelo boletim de ocorrência, pelo auto de apreensão do documento encontrado em posse do Réu, pelo laudo de perícia criminal, pelo interrogatório do Réu junto à Superintendência Regional da Polícia Federal em Tocantins e pelo depoimento do policial que procedeu à abordagem do Réu, quando de sua oitiva judicial.

3. O fato de o documento ser estrangeiro não é relevante, uma vez que a legislação não distingue entre documentos emitidos pelo Brasil e por outros estados nacionais para a configuração dos delitos dos arts. 297 ou 304 do Código Penal. Precedente do STJ.

4. Para fins do delito tipificado do art. 304 do Código Penal, faz-se necessário que o documento falso seja potencialmente enganoso a ponto de produzir o resultado de induzir alguém em erro. Só pode ser qualificada como falsificação grosseira aquela facilmente perceptível, quer dizer, perceptível à primeira vista e incapaz de ludibriar pessoa comum, tratando-se de imitação tosca, mal acabada, que manifestamente não enganaria o homem médio. O documento exibido pelo Réu é bem parecido com um documento autêntico, só tendo sido confirmada a falsificação mediante a realização de perícia.

5. Pena privativa de liberdade fixada no mínimo legal, de modo que não merece reparos.

6.  Quanto ao valor do dia-multa, constata-se que o juízo de primeiro grau de fixou cada dia-multa no valor de 1/10 do salário mínimo. Nesse ponto, impõe-se a reforma da sentença para o fim de fixar o valor do dia-multa em 1/30 do maior salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, vez que o acusado, no interrogatório policial (não houve interrogatório judicial), afirma possuir o primeiro grau incompleto, ser agropecuarista residente em zona rural, de modo que a fixação do dia-multa no valor de 1/10 do salário mínimo se mostra exacerbada.

7. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça “é firme no sentido de que, nos termos do art. 45 do Código Penal, a fixação do valor da prestação pecuniária deve observar o montante do dano a ser reparado e a capacidade econômica do Condenado” (REsp n. 1.967.713/SC, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022). No caso, a sentença, ao fixar o valor da prestação pecuniária em R$ 6.000,00 (seis mil reais), não teceu qualquer consideração, a partir de elementos concretos acerca da capacidade econômica do acusado, de modo que, considerando sua escolaridade e meio de vida, presume-se sua hipossuficiência financeira. Prestação pecuniária reduzida ao mínimo legal de 1 (um) salário-mínimo, segundo previsto no art. 45, § 1.º, do Código Penal.

8. Apelação parcialmente provida para reduzir o parâmetro de dia-multa aplicado a 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, bem como o valor da prestação pecuniária para 01 (um) salário mínimo.

Processo: 0003899-11.2014.4.01.3505

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