A apreensão de drogas na posse de uma pessoa não é motivo suficiente para que a polícia invada sua residência sem a autorização dos moradores, caso não tenha havido uma investigação prévia que indique a prática de crime permanente de tráfico no local.
O entendimento foi firmado pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao conceder habeas corpus para absolver um homem condenado a cinco anos de reclusão pelo crime de tráfico de drogas. O colegiado reconheceu a violação de domicílio e, em consequência, a ilicitude da apreensão de entorpecentes no interior da residência.
De acordo com o processo, os policiais receberam denúncia anônima de que uma pessoa estaria vendendo drogas em um conhecido ponto de tráfico na região. Ao chegarem em um bar, os agentes abordaram o homem e, durante a revista, encontraram um pino de cocaína.
Após a descoberta, os policiais foram até a residência do suspeito e encontraram outros nove pinos de cocaína, além de nove porções de pasta-base da mesma droga.
Indícios razoáveis
No pedido de habeas corpus, a defesa alegou que não houve consentimento do suspeito ou de outro morador da casa para que os policiais pudessem entrar de forma legal, mesmo porque ninguém estava ali no momento. Ainda assim, eles pularam o muro da propriedade.
O relator, ministro Nefi Cordeiro, lembrou que, segundo a jurisprudência do STJ, é preciso haver indícios razoáveis da existência de crime permanente para que se afaste a necessidade de autorização para ingresso na residência.
No caso em julgamento, entretanto, o relator apontou que, apesar de ter sido encontrado um pino de cocaína com o réu, não foram realizadas investigações prévias, nem foram apresentados elementos concretos que indicassem a ocorrência de tráfico dentro da residência.
Ao conceder o habeas corpus, o ministro entendeu que o fato de ter sido encontrada droga com o paciente não basta para justificar a ação da polícia, “sendo ilícita a prova obtida com a invasão de domicílio sem a indicação de fundadas razões”.
O recurso ficou assim ementado:
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ILEGALIDADE. ILICITUDE DAS PROVAS. INVASÃO DE DOMICÍLIO. ATUAÇÃO COM BASE EM DENÚNCIA ANÔNIMA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE INVESTIGAÇÕES PRÉVIAS E DE FUNDADAS RAZÕES. ILEGALIDADE. OCORRÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA.
1. Esta Corte Superior entende serem exigíveis fundamentos razoáveis da existência de crime permanente para justificarem o ingresso desautorizado na residência do agente. Desse modo, a mera denúncia anônima, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime, não legitima o ingresso de policiais no domicílio, sem autorização judicial.
2. A abordagem em face do réu, em local conhecido como ponto de tráfico, sendo encontrado com ele drogas, não autoriza o ingresso na residência, por não demonstrar os fundamentos razoáveis da existência de crime permanente dentro do domicílio.
3. Habeas corpus concedido para reconhecer a ilicitude da apreensão da droga, pela violação de domicílio, e, consequentemente, absolver o paciente RAFAEL AUGUSTO NUNES.
Leia o acórdão.