Dano moral: suspensão de prazo prescricional de menor de idade não se aplica a irmã maior

A 3ª Turma considerou prescrito o direito à reparação da filha maior de idade de montador morto em acidente de trabalho.

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou prescrita a pretensão da filha maior de idade de um montador eletromecânico terceirizado da MW Projetos e Construções, de Goiânia (GO), de pleitear reparação por danos morais e materiais em razão da morte do pai em acidente de trabalho. Embora a contagem do prazo prescricional seja interrompido quando se trata de menor de idade, a ação foi ajuizada em 2015, quando ela já tinha 23 anos.

Acidente

O acidente ocorreu em 2007, quando o montador, que prestava serviços para a Celg Distribuição S.A., sofreu uma descarga elétrica, ao fazer um conserto em rede de alta tensão próximo a São Miguel do Araguaia (GO). Em 2015, os dois filhos do trabalhador, nascidos em 1992 e em 2000, ajuizaram a ação, com pedido de reparação por danos morais e materiais.

Prescrição

O juízo da Vara do Trabalho de Porangatu (GO) determinou o prosseguimento da ação apenas em relação ao filho menor de idade. O fundamento foi o dispositivo do Código Civil que prevê a interrupção do prazo prescricional contra o herdeiro menor até que ele atinja a maioridade. Como a irmã já tinha 23 anos ao propor a ação, sua pretensão estaria prescrita.

Obrigação indivisível

O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO), entretanto, entendeu que as indenizações decorrentes de acidente de trabalho são obrigações indivisíveis, e, portanto, a interrupção da prescrição se aplicaria aos dois irmãos. Segundo o TRT, o artigo 201 do Código Civil determina que, no caso de obrigação indivisível, a suspensão da prescrição em favor de um dos credores solidários atinge todos os outros credores.

Direito próprio em nome próprio

O relator do recurso de revista da empresa, ministro Mauricio Godinho Delgado, explicou que, embora o direito à compensação decorra do falecimento do empregado, pai dos dois filhos, trata-se de dano reflexo, cuja ação pode ser julgada de forma independente, pois a pretensão é própria e individual de cada filho. Segundo ele, a situação difere do direito sucessório, em que os direitos dos titulares têm caráter patrimonial e são transmitidos aos herdeiros como obrigação indivisível.

No caso, com relator assinalou que não se trata de pretensão ao pagamento de indenização pelo dano moral sofrido pelo empregado, que seria passível de transmissão aos herdeiros, mas pelos danos morais e materiais sofridos por cada um dos filhos (danos em ricochete), que postulam direito próprio em nome próprio. Trata-se, assim, de obrigação divisível. Nessa circunstância, a suspensão do prazo prescricional do herdeiro menor de idade não se aplica à herdeira maior de idade.

O recurso ficou assim ementado:

A) AGRAVOS DE INSTRUMENTO DAS RECLAMADAS . RECURSOS DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. MATÉRIA EM COMUM: ANÁLISE CONJUNTA . ACIDENTE DE TRABALHO FATAL. DANO EM RICOCHETE DOS FILHOS. PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. OBRIGAÇÃO DIVISÍVEL. EXTENSÃO DA SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DO AUTOR MENOR DE IDADE PARA BENEFICIAR A AUTORA MAIOR DE IDADE. IMPOSSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO APLICÁVEL. “ ACTIO NATA “. DATA DO ÓBITO. Demonstrado nos agravos de instrumento que os recursos de revista preenchiam os requisitos do art. 896 da CLT, dá-se provimento aos agravos de instrumento, para melhor análise da arguição de violação dos arts. 7º, XXIX, da CF e 201 do CCB, suscitada nos recursos de revista. Agravos de instrumento providos.

B) RECURSOS DE REVISTA DAS RECLAMADAS . MATÉRIA EM COMUM: ANÁLISE CONJUNTA. ACIDENTE DE TRABALHO FATAL. DANO EM RICOCHETE DOS FILHOS. PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. OBRIGAÇÃO DIVISÍVEL. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DO AUTOR MENOR DE IDADE PARA A AUTORA MAIOR. IMPOSSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO APLICÁVEL. “ ACTIO NATA “. DATA DO ÓBITO. Cinge-se a controvérsia ao aproveitamento da suspensão do prazo prescricional do filho menor do ex-empregado, quando do ajuizamento da presente ação, para a filha maior, que já contava com 23 anos ao tempo da propositura. Por meio da presente ação, os filhos do ex-empregado buscam reparação por danos morais e materiais decorrentes do acidente de trabalho que ceifou a vida de seu genitor. Embora o direito da compensação do dano decorra do falecimento do ex-empregado, trata-se de dano reflexo cuja pretensão indenizatória é própria e individual de cada um dos Autores, podendo, portanto, ser julgada de forma independente. Trata-se, portanto, de situação distinta da presente no direito sucessório, em que os direitos titularizados por ex-empregado assumem caráter patrimonial e são transmitidos aos herdeiros como obrigação indivisível (arts. 12, 258, 943 e 1.784 do CCB). Nesses casos – de direito sucessório -, se houver herdeiros menores, caberá um concurso solidário ativo e os herdeiros, inclusive os que são maiores, serão beneficiados pela interrupção da prescrição, pois, tratando-se de obrigação indivisível, não inicia a fluência do prazo prescricional – art. 201 do CCB. No caso dos autos, como visto, a pretensão dos Autores não se confunde com o direito sucessório , visto que não se trata de pretensão ao pagamento de compensação por dano moral sofrido pelo ex-empregado, que seria passível de transmissão aos herdeiros; mas remete à reparação de danos morais e materiais sofridos por cada um dos Autores, que postulam direito próprio em nome próprio – cuja natureza assume a roupagem de obrigação divisível , nos moldes do art. 257 do CCB. Na hipótese , o TRT entendeu que a suspensão do prazo prescricional do Autor menor aproveita à Autora maior de idade por considerar que a ação de indenização por danos morais e materiais tratar-se-ia de obrigação indivisível, reformando a sentença para declarar imprescrita a pretensão da filha maior. Contudo, tratando-se a pretensão indenizatória por danos morais em ricochete de obrigação divisível, a suspensão do prazo prescricional do Autor menor não aproveita à Autora maior – sendo inaplicável o art. 201 do Código Civil. Uma vez afastado o óbice erigido pelo TRT, e tratando-se de dano em ricochete, analisa-se a prescrição aplicável ao caso concreto . A SBDI-1 do TST tem decidido que, em ações nas quais as Partes postulam em nome próprio direito próprio em decorrência do falecimento de ex-empregado por infortunística do trabalho, a prescrição aplicável é a civilista, nos termos do art. 206, § 3º, do Código Civil. Importante registrar que, diante da celeuma que envolve essa questão, há também, nesta Corte, entendimento no sentido de que a prescrição aplicável, na presente hipótese, seria a trabalhista. Ademais, pacificou a jurisprudência do TST que o termo inicial da prescrição, em se tratando de pretensão deduzida em ação reparatória de dano em ricochete, se dá da data do falecimento do ex-empregado. No caso dos autos , considerando que o óbito do ex-empregado ocorreu em 24/06/2007 e que a presente ação foi ajuizada em 10/11/2014, verifica-se que, por qualquer ângulo que se analise a questão, a pretensão indenizatória da Autora, filha maior, está prescrita – sob a ótica trienal civilista ou à luz das regras trabalhistas insculpidas no art. 7º, XXIX, da Constituição Federal – devendo, portanto, ser declarada prescrita a sua pretensão. Recursos de revista conhecidos e providos no aspecto.

C) RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA MW PROJETOS E CONSTRUÇÕES EIRELI . PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . 1. PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. 2. PRELIMINAR DE JULGAMENTO ULTRA PETITA. ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT. EXIGÊNCIA DE TRANSCRIÇÃO DOS FUNDAMENTOS EM QUE SE IDENTIFICA O PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA OBJETO DE RECURSO DE REVISTA. ÓBICE ESTRITAMENTE PROCESSUAL. 3. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. 4. ACIDENTE DE TRABALHO. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA. PERCENTUAL. MANUTENÇÃO. PRINCÍPIO DA “ NON REFORMATIO IN PEJUS “. A indenização resultante de acidente do trabalho e/ou doença profissional ou ocupacional supõe a presença de três requisitos: a) ocorrência do fato deflagrador do dano ou do próprio dano, que se constata pelo fato da doença ou do acidente, os quais, por si sós, agridem o patrimônio moral e emocional da pessoa trabalhadora (nesse sentido, o dano moral, em tais casos, verifica-se pela própria circunstância da ocorrência do malefício físico ou psíquico); b) nexo causal ou concausal, que se evidencia pelo fato de o malefício ter ocorrido em face das condições laborativas; c) culpa empresarial, excetuadas as hipóteses de responsabilidade objetiva. Embora não se possa presumir a culpa em diversos casos de dano moral – em que a culpa tem de ser provada pelo autor da ação -, tratando-se de doença ocupacional, profissional ou de acidente do trabalho, essa culpa é presumida, em virtude de o empregador ter o controle e a direção sobre a estrutura, a dinâmica, a gestão e a operação do estabelecimento em que ocorreu o malefício. A Constituição Federal de 1988 assegura que todos têm direito ao meio ambiente do trabalho ecologicamente equilibrado, porque essencial à sadia qualidade de vida, razão pela qual incumbe ao Poder Público e à coletividade, na qual se inclui o empregador, o dever de defendê-lo e preservá-lo (arts. 200, VII, e 225, caput ). Não é por outra razão que Raimundo Simão de Melo alerta que a prevenção dos riscos ambientais e/ou eliminação de riscos laborais, mediante adoção de medidas coletivas e individuais, é imprescindível para que o empregador evite danos ao meio ambiente do trabalho e à saúde do trabalhador. Acidentes do trabalho e/ou doença profissional ou ocupacional, na maioria das vezes, ” são eventos perfeitamente previsíveis e preveníveis, porquanto suas causas são identificáveis e podem ser neutralizadas ou mesmo eliminadas; são, porém, imprevistos quanto ao momento e grau de agravo para a vítima ” (MELO, Raimundo Simão de. Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador. 5.ed. São Paulo: Ltr, 2013, p. 316). Registre-se que tanto a higidez física como a mental, inclusive emocional, do ser humano são bens fundamentais de sua vida, privada e pública, de sua intimidade, de sua autoestima e afirmação social e, nesta medida, também de sua honra. São bens, portanto, inquestionavelmente tutelados, regra geral, pela Constituição (art. 5º, V e X). Assim, agredidos em face de circunstâncias laborativas, passam a merecer tutela ainda mais forte e específica da Constituição da República, que se agrega à genérica anterior (art. 7º, XXVIII, CF/88). Frise-se que é do empregador, evidentemente, a responsabilidade pelas indenizações por dano moral, material ou estético decorrentes de lesões vinculadas à infortunística do trabalho, sem prejuízo do pagamento pelo INSS do seguro social. No caso em tela , é incontroverso o acidente de trabalho típico sofrido pelo ex-empregado, quando realizava manutenção em rede de alta tensão. A Corte de origem concluiu pela responsabilidade objetiva do empregador ante o risco da atividade, que consistia em contato direto com eletricidade em redes de alta tensão. Por outro lado, ainda que se fosse perquirir a responsabilidade subjetiva, a conduta culposa das Reclamadas também restou evidenciada pelos Julgadores, que explicitaram a negligência em relação ao dever de cuidado à saúde, higiene, segurança e integridade física do trabalhador (art. 6º e 7º, XXII, da CF, 186 do CCB/02), deveres anexos ao contrato de trabalho, pois as Reclamadas tinham ciência de possíveis irregularidades na rede e, ainda, assim, não instruíram ” seus empregados a realizar testes prévios, com o fito de verificar se remanesciam redes energizadas “. Consta, ainda, na decisão recorrida que ” o risco a que estava submetido o ‘ de cujus’ era muito previsível, tendo os próprios prepostos das reclamadas revelado que o sistema COD da CELG era falho, porquanto não considerava a totalidade das redes, possuindo ligações que poderiam passar desapercebidas e, por isso, os procedimentos realizados na rotina de trabalho não eram suficientes a evitar o risco de choque elétrico.” O TRT afastou, também, a tese de fato da vítima, tendo sido explicitado que ” o “de cujus” agiu em conformidade com o padrão exigido pela empresa ” e que ” a rotina de trabalho foi devidamente seguida pelos trabalhadores, que tomaram as precauções normais que lhe foram passadas, embora estas não fossem suficientes para evitar todos os riscos inerentes à atividade desempenhada, atraindo novamente a culpa das reclamadas na fiscalização do cumprimento das normas de segurança”. A par do quadro fático delineado, não há falar em fato da vítima nem em responsabilidade exclusiva da Reclamada CELG-D, pois, como já dito, compete ao empregador o dever de cuidado à saúde, higiene, segurança e integridade física do trabalhador (art. 6º e 7º, XXII, da CF, 186 do CCB/02), o que não restou observado pela ora Recorrente. Como visto, a decisão recorrida está devidamente fundamentada, na prova dos autos, sendo, portanto, inadmissíveis as assertivas recursais de que a Parte Autora não comprovou a conduta atribuída ao empregador. Assim, afirmando o Juiz de Primeiro Grau, após minuciosa análise da prova, corroborada pelo julgado do TRT, o preenchimento dos requisitos configuradores do dano moral e material, torna-se inviável, em recurso de revista, reexaminar o conjunto probatório dos autos, por não se tratar o TST de suposta terceira instância, mas de Juízo rigorosamente extraordinário – limites da Súmula 126/TST. Inviável o processamento do recurso de revista, se não preenchidos os requisitos do art. 896 da CLT. Recurso de revista não conhecido nos temas.

D) RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA CELG DISTRIBUIÇÃO S.A. – CELG D . PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . 1. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ENTIDADE PÚBLICA, TOMADORA DE SERVIÇOS, EM FACE DO RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS PELO ACIDENTE DE TRABALHO SOFRIDO POR PRESTADOR DE SERVIÇOS TERCEIRIZADO. MANUTENÇÃO EM RAZÃO DA PROIBIÇÃO DE “ REFORMATIO IN PEJUS “. 2. ACIDENTE DE TRABALHO. ÓBITO DO EX-EMPREGADO. AÇÃO AJUIZADA PELOS FILHOS DO TRABALHADOR FALECIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MERA SUCUMBÊNCIA. A sistemática adotada pela Súmula 219, I, do TST, relativa aos honorários advocatícios, pressupõe a existência da relação de emprego entres as Partes do processo, ou seja, a lide trabalhista clássica. Contudo, na hipótese , em se tratando de ação ajuizada pelos filhos do trabalhador falecido, pleiteando indenizações por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho fatal, não há falar na necessidade de que a Parte Autora esteja assistida pelo sindicato da categoria, haja vista que, por óbvio, não faz parte da categoria profissional. Sendo assim, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nas lides de competência da Justiça do Trabalho que não envolve relação de emprego entre as Partes litigantes, decorre da mera sucumbência. Como se trata de ação ajuizada pelos filhos de empregado falecido, são devidos os honorários advocatícios por mera sucumbência, por não haver relação de emprego entre as Partes, sendo aplicável o art. 5º da Instrução Normativa 27/TST e o disposto na parte final do item III da Súmula 219 do TST . Logo, como a decisão está em consonância com a atual jurisprudência desta Corte , o recurso de revista encontra óbice no art. 896, § 7º, da CLT, e na Súmula 333 desta Corte. Recurso de revista não conhecido nos temas.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-5-97.2015.5.18.0251

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