Condomínio residencial de Campina Grande (PB) não terá de contratar aprendizes

Para a 5ª Turma, o caso diverge de condomínios empresariais

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recursos da União (PGU) e do Ministério Público do Trabalho (MPT) contra sentença que afastou a obrigatoriedade de contratação de aprendizes pelo Condomínio Residencial Ivan Farias, em Campina Grande (PB). Segundo o colegiado, o condomínio residencial não se enquadra no conceito de estabelecimento empresarial.

Habitação

Após ser notificado, em março de 2019, para apresentar à Gerência Regional do Trabalho de Campina Grande documentos que comprovassem a contratação de aprendizes, o condomínio residencial decidiu ajuizar a ação declaratória de inexigibilidade, com o argumento de que se destina exclusivamente à habitação multifamiliar e, portanto, não se enquadrar na hipótese legal.

O juízo da 6ª Vara do Trabalho de Campina Grande julgou a demanda procedente e vedou a lavratura de auto de infração. O Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (PB) manteve a sentença, entendendo que as funções de zeladoria e portaria de condomínios residenciais não demandam formação profissional específica.

No recurso ao TST, a União e o MPT sustentaram que essas funções estão listadas na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) e que o artigo 429 da CLT dispõe ser aplicável a cota de aprendizagem para “estabelecimentos de qualquer natureza”.

Sem atividade econômica

Segundo o relator do recurso de revista, ministro Breno Medeiros, o condomínio residencial, apesar de ser equiparado ao empregador, não se enquadra no conceito de estabelecimento para fins de aplicação do artigo 429 da CLT. Ele assinalou que a conservação, a limpeza e o acesso predial, entre outras funções corriqueiras de um condomínio residencial, não se inserem no conceito de atividade econômica ou social do empregador, pois não passam de obrigação de “preservação da própria habitabilidade, da higiene, da segurança e da privacidade dos condôminos no trânsito e no uso privativo das suas áreas comuns, não se confundindo nem com atividade econômica”.

O ministro ressaltou, ainda, que o parágrafo 2º do artigo 51 do Decreto 9.579/2018, que regulamenta a matéria, estabelece essa condicionante (exercício de atividade econômica ou social) para fins de conceituação do estabelecimento vocacionado ao programa de treinamento profissionalizante de aprendizagem.

Por essa razão, conforme o relator, não é obrigatória a contratação de aprendizes, e não por não haver ali funções que demandem formação profissional, pois o TST já definiu, em diversos precedentes, que elas demandam formação profissional. Os ministros acrescentaram que, no caso de as atividades do condomínio serem terceirizadas, a obrigatoriedade de cumprimento da cota se aplicaria à prestadora de serviços.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVOS DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DE AMBOS OS RECLAMADOS. MATÉRIA COMUM. EXAME CONJUNTO . ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. OBRIGATORIEDADE DE CONTRATAÇÃO DE APRENDIZES. AUSÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO ART. 429 DA CLT. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA . Caracterizada a existência de transcendência jurídica , além de restar demonstrada a divergência jurisprudencial, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o prosseguimento do recurso de revista. Agravos de instrumento providos. RECURSOS DE REVISTA DE AMBOS OS RECLAMADOS. MATÉRIA COMUM. EXAME CONJUNTO. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. OBRIGATORIEDADE DE CONTRATAÇÃO DE APRENDIZES. AUSÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO ART. 429 DA CLT. Cinge-se a controvérsia em definir se o art. 429 da CLT, ao estabelecer a cota de aprendizagem para “estabelecimentos de qualquer natureza” englobaria os condomínios residenciais, dado que as atividades ali exercidas (porteiro, zelador, etc.) demandam formação profissional. À toda evidência, o conceito de estabelecimento a que se refere o preceito consolidado diz respeito às atividades econômicas e sociais do empregador, que ordinariamente é uma empresa, mas pode, excepcionalmente, ser uma entidade diversa, por equiparação estabelecida pelo art. 2º, § 1º, da CLT, que dispõe: “Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.” Pelo que se pode perceber, o condomínio residencial, apesar de ser equiparado ao empregador, não se enquadra no conceito de estabelecimento para fins de aplicação do art. 429 da CLT, que dispõe: “Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional.” A corroborar tal entendimento tem-se o Decreto nº 9.579/2018, que, no seu art. 51, § 2º, deixa claro que: ” Para fins do disposto neste Capítulo, considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado para o exercício de atividade econômica ou social do empregador , que se submeta ao regime da CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943.” Do que se pode depreender dos autos, a conservação, limpeza, acesso predial, entre outras funções corriqueiras de um condomínio residencial não se inserem no conceito de “atividade econômica ou social do empregador” , exatamente porque tais atividades não passam de um múnus de preservação da própria habitabilidade, higiene, segurança e privacidade dos condôminos no trânsito e uso privativo das suas áreas comuns, não se confundindo nem com atividade econômica, muito menos com atividade social dessa pessoa jurídica, que é equiparada ao empregador pelo § 1º do art. 2º da CLT apenas “para os efeitos exclusivos da relação de emprego” , o que é ressaltado no preceito de lei pelo legislador. Por essa razão, para condomínios residenciais, não é obrigatória a contratação de aprendizes. Não é, portanto, por não haver ali funções que demandem formação profissional, como restou consignado no acórdão recorrido, até porque esta Corte já definiu que as funções corriqueiras de um condomínio, tais como porteiro, zelador, faxineiro, ascensorista, entre outras demandam sim formação profissional. Precedentes. O que há de comum nesses precedentes (inclusive um proveniente da SDI-1 desta Corte) é a inclusão das funções de porteiro, zelador, ascensorista, faxineiro, entre outras na cota de aprendizagem direcionada a estabelecimentos empresariais , exatamente o que difere do presente caso, em que se discute tal obrigatoriedade em face de condomínio residencial . O entendimento a ser fixado, aqui, portanto, é outro, de natureza particular e específica, dada a distinção ( distinguishing ) verificada, e consiste no seguinte: os condomínios residenciais não são destinatários da norma insculpida no art. 429 da CLT, exatamente porque a sua atividade de conservação, limpeza e acesso predial não é atividade econômica nem social do empregador, o que é um pressuposto para tal incidência . Para alcançar essa conclusão, basta perceber que a redação atual do art. 429 da CLT veio a substituir uma redação anterior que restringia a exigência de cota de aprendizagem a “estabelecimentos industriais” , nos seguintes termos: “Os estabelecimentos industriais de qualquer natureza, inclusive de transportes, comunicações e pesca, são obrigados a empregar, e matricular nos cursos mantidos pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI).” Ou seja, a correta exegese do preceito contido hodiernamente no art. 429 da CLT, ao contrário do que advogam os recorrentes, não é englobar indistintamente todos os estabelecimentos sem finalidade lucrativa ou atividade social no dever jurídico de promover a contratação de aprendizes, senão ampliar o escopo da lei para abraçar atividades econômicas ou sociais de ramos diversos da indústria. Com isso, contudo, não se pretendeu abranger todo tipo de empregador, como querem fazer crer os recorrentes. No sentido dessa distinção, e conferindo tratamento diferenciado para os condomínios residenciais, já existem, inclusive, alguns precedentes de Turmas deste Tribunal Superior do Trabalho, devidamente citados no corpo da fundamentação desta decisão. Assim, o argumento das partes de que o preceito do art. 429 da CLT não faz distinção quanto à natureza do estabelecimento a ser abrangido pela norma não quer significar que o preceito de lei se aplique indistintamente a qualquer empregador , até porque o citado § 2º do art. 51 do Decreto nº 9.579/2018, que regulamenta a matéria, estabelece essa condicionante relativa ao exercício de atividade econômica ou social para fins de conceituação do estabelecimento vocacionado ao programa de treinamento profissionalizante de aprendizagem, o que não se verifica no caso dos condomínios residenciais, cujas atividades se restringem à conservação e ao acesso e uso privado de suas áreas comuns. Por outro lado, dada a conotação meramente infraconstitucional da matéria, não viola o art. 227 da Constituição Federal tal conclusão, já que o preceito constitucional apenas prevê de forma genérica os direitos difusos da criança, do adolescente e do jovem, não disciplinando as condições de verificação da obrigatoriedade dos programas de aprendizagem laboral. Logo, em que pese a transcendência jurídica reconhecida, e o conhecimento dos recursos por divergência jurisprudencial, não merecem provimento as revistas, uma vez que se encontra correta a sentença que julgou procedente a presente ação declaratória, reconhecendo a inexigibilidade de contratação de aprendizes para as atividades desempenhadas no âmbito do condomínio residencial autor. Recursos de revista conhecidos e não providos

A decisão foi unânime.

Processo: RR-212-30.2019.5.13.0014

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