Auxiliar que prestava serviços na casa de empresário obtém reconhecimento de vínculo

Havia confusão entre a pessoa física e a pessoa jurídica na gestão do contrato

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso do empresário Jorge Gerdau Johannpeter, ex-presidente do Grupo Gerdau, contra decisão que reconheceu a existência de vínculo de emprego entre a sua pessoa jurídica e um auxiliar responsável pela manutenção de duas propriedades em Gramado (RS). Ao contrário da tese da defesa, o colegiado concluiu que não se tratava de trabalho doméstico, uma vez que os pagamentos eram feitos por meio da pessoa jurídica.

Ação trabalhista

O empregado disse, na ação, que trabalhara por oito anos para o empresário e, como responsável por diversos setores das casas, realizava manutenção elétrica, limpeza, abastecimento e funcionamento do gerador e coordenava a limpeza dos jardins, entre outras atividades. Segundo seu relato, um ano depois do início dos serviços, foi obrigado a assinar um contrato de prestação de serviços que, segundo ele, serviria apenas para “obscurecer a relação empregatícia”.

Autônomo

Em defesa, o empresário disse que o técnico sempre atuara como profissional autônomo e prestava serviços, também, para outras residências de férias em Gramado. Sustentou que ele dispunha de organização própria, “sempre agindo com autonomia”. Caso fosse reconhecido o vínculo, pedia que fosse declarado de natureza doméstica.

Pessoa jurídica

O juízo da 1ª Vara do Trabalho de Gramado concluiu pela inexistência de relação de emprego, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), cujo entendimento foi de que estavam presentes os requisitos que configuravam a relação de emprego.

Segundo o TRT, o técnico poderia ter sido contratado e ter sua carteira de trabalho anotada como empregado doméstico, mas o empresário havia optado por fazer uso desvirtuado da contratação como autônomo, valendo-se da pessoa jurídica para pagar sua remuneração. O TRT ressaltou a existência de confusão entre a pessoa física do empresário e a pessoa jurídica JGJ Jorge Gerdau Johannpeter – Filial: 001 Gestão Patrimonial, da qual ele é sócio e membro do Conselho Consultivo, e rejeitou a tese sobre a natureza doméstica do vínculo de emprego.

Natureza celetista

O relator do recurso do empresário, ministro Mauricio Godinho Delgado, assinalou que, de acordo com o TRT, ficou demonstrado, pelos documentos constantes do processo, que o pagamento da remuneração, inclusive a gratificação natalina, eram feitos por meio da pessoa jurídica. “Não há possibilidade de pessoa jurídica ser tomadora de serviço doméstico”, ressaltou.

Na avaliação do relator, o fato de o empregado trabalhar na residência do empresário, por si só, não é suficiente para afastar a natureza celetista da relação de emprego.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI Nº 13.467/17 . 1. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE EMPREGO. 2. FGTS + 40%. 3. MULTA DO ART. 477 DA CLT. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. CABIMENTO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO EM CASO DE ADMISSIBILIDADE PARCIAL DE RECURSO DE REVISTA PELO TRT DE ORIGEM. PRECLUSÃO . O art. 1º da Instrução Normativa nº 40/TST dispõe: ” Admitido apenas parcialmente o recurso de revista, constitui ônus da parte impugnar, mediante agravo de instrumento, o capítulo denegatório da decisão, sob pena de preclusão “. Na hipótese , a Vice-Presidência do TRT de origem recebeu o recurso de revista interposto pelo Recorrente apenas quanto ao tema ” vínculo de emprego. natureza de trabalho doméstico. não configurado “, por divisar possível violação ao artigo 1º da Lei 5.859/1972, tendo denegado o processamento do apelo no que concerne aos temas “reconhecimento do vínculo de emprego”, “FGTS. multa de 40%” e “multa do artigo 477/CLT”. Assim, em razão da nova sistemática processual e da edição da Instrução Normativa nº 40/TST – já vigente quando da publicação da decisão do TRT que admitiu parcialmente o presente apelo -, cabia ao Recorrente impugnar, mediante agravo de instrumento, o capítulo denegatório da decisão, sob pena de preclusão, ônus do qual não se desincumbiu. Recurso de revista não conhecido nos temas . 4. VÍNCULO DE EMPREGO. NATUREZA DE TRABALHO DOMÉSTICO. NÃO CONFIGURADO. 1. Incontroversa a relação de emprego havida entre as Partes, cinge-se a discussão sobre a natureza do vínculo: se celetista ou doméstico. 2. O vínculo de emprego doméstico concretiza-se a partir de oito elementos fático-jurídico: os cinco genéricos a qualquer relação empregatícia (sendo um deles submetido a conformação jurídica diferenciadora) e três elementos fático-jurídicos especialmente estipulados apenas no tocante a essa específica relação de emprego, quais sejam: finalidade não lucrativa dos serviços, a prestação laboral à pessoa ou família e o âmbito residencial de prestação laborativa. Nesse contexto específico à relação empregatícia doméstica, não há possibilidade de pessoa jurídica ser tomadora de serviço doméstico. 3. No caso , denota-se do quadro fático delimitado pelo TRT, que embora o Reclamado pudesse ter contratado e anotado a CTPS do Reclamante como empregado doméstico, optou por fazer uso desvirtuado da contratação do Autor como autônomo, valendo-se, ainda, de pessoa jurídica para proceder ao pagamento do salário mensal obreiro, conforme resultou comprovado nos autos. Circunstância que, como bem pontuado pela Corte Regional, evidencia a existência de confusão, entre a pessoa física do Reclamado e a pessoa jurídica da qual ele é sócio, na gestão do contrato de trabalho obreiro. Ademais, tal aspecto se revela, ainda, no fato de que todos os repasses de valores pertinentes aos serviços de manutenção executados nas referidas propriedades e supervisionados pelo obreiro, também, eram efetivados pela referida pessoa jurídica, consoante se extrai do acórdão regional. Assim sendo, impõe-se a conclusão de que, suplantada a alegação de trabalho autônomo, e, constatado que, por opção do empregador, o pagamento do salário obreiro era realizado por pessoa jurídica (repise-se, da qual o Recorrente é sócio), a mera circunstância de o Reclamante ter laborado no âmbito residencial não tem, por si só, o alcance pretendido pelo Reclamado de afastar a natureza celetista da relação de emprego havida entre as Partes. Recurso de revista não conhecido.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-1046-17.2014.5.04.0351 

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