Atuação da AGU confirma que União não é parte obrigatória em litígios sobre fornecimento de medicamentos

Para jurisprudência, União é obrigada a figurar somente em ações que discutem o fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa

A Advocacia-Geral da União (AGU) assegurou na Justiça que não é obrigatória a inclusão da União no polo passivo de ações em que se requer o fornecimento de medicamentos ou tratamento médico.

O caso trata de ação movida por uma portadora de câncer de mama contra o estado de Sergipe e o município de Aracaju em busca de receber de forma gratuita o medicamento Kadcyla (TRASTUZUMABE ENTANSINA), para o tratamento da doença. A 18ª Vara Cível da Comarca de Aracajú (SE) declarou a incompetência da Justiça Estadual para julgar o caso por entender que se tratava de um litisconsórcio necessário com a União.

Com a inclusão da União no polo passivo, a AGU passou a atuar na ação. Em agravo de instrumento movido pelo estado sergipano, a Advocacia-Geral defendeu que não cabe o chamamento ao processo da União em demandas que não forem originariamente direcionadas a ela.

Segundo a AGU, não é admissível a participação solidária da União em todos os processos movidos contra os outros entes federados. Em contrarrazões apresentadas ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), a AGU citou entendimentos de tribunais superiores para lembrar que a União é obrigada a figurar como ré somente em ações que discutem o fornecimento de medicamentos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que não é o caso desse fármaco.

A 4ª Turma do TRF5 decidiu, por unanimidade, negar o recurso do estado de Sergipe e declarou a competência da Justiça Estadual para julgar a ação. O tribunal reforçou a jurisprudência de que ações desse tipo, relativas à assistência à saúde pelo Sistema Único de Saúde, podem ser propostas em face de qualquer um dos entes componentes da Federação Brasileira (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), sendo todos legitimados passivos para responderem a elas, individualmente ou em conjunto.

“Tratando-se de responsabilidade solidária, cabe à autora definir contra qual ente federado pretende litigar a fim de obter provimento jurisdicional para fornecimento do tratamento e, não tendo sido ajuizada a demanda contra a União, resta afastada a competência da Justiça Federal”, escreveram os desembargadores, no acórdão.

Segundo a Advogada da União Karla Simões, da Procuradoria-Regional da União da 5ª Região (PRU5), a decisão representa importante precedente favorável à AGU. “Em casos semelhantes, juízes estaduais de vários estados também têm remetido processos para a Justiça Federal a partir de viés que consideramos incorreto. Esse precedente do TRF5, ao declarar a incompetência do foro federal, é de grande importância para cessar com essa prática, que gera grande risco de a União vir a ser obrigada a ter de arcar com altos custos de medicamentos de forma solidária com estados e/ou municípios”.

Além da PRU5, também atuou no caso a Procuradoria da União no estado de Sergipe.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRATAMENTO DE SAÚDE. MEDICAMENTO REGISTRADO NA ANVISA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. COMPOSIÇÃO DO POLO PASSIVO DA DEMANDA. FACULDADE DA AUTORA.

1.Agravo de instrumento interposto contra decisão que, na ação ordinária de origem em que se pleiteia o fornecimento de medicamento para tratamento de câncer de mama com metástase óssea, excluiu a União da lide, por não se tratar de litisconsórcio passivo necessário, e assim, ser de competência da Justiça Federal decidir sobre a existência ou não de interesse jurídico das entidades referidas no art. 109, I, da Constituição Federal de 1988.

2.No caso, a autora do feito de origem, portadora de Câncer de Mama ECOG-2, estágio IV, com metástases ósseas (CID C50), busca o fornecimento do medicamento KADCYLA, conforme lauto e atestado médico. Inicialmente, distribuído perante o Juízo Estadual, contra o Estado de Sergipe e o Município de Aracajú/SE, o processo foi redistribuído para a Justiça Federal em razão de decisão proferida pelo Juízo da 18ª Vara Cível da Comarca de Aracajú/SE que entendeu se tratar de litisconsórcio necessário com a União, pois o referido medicamento não se encontra padronizado no Sistema Único de Saúde – SUS.

3. Está consolidado, nas cortes superiores, o entendimento no sentido de que as ações relativas à assistência à saúde pelo SUS (fornecimento de medicamentos ou de tratamento médico, inclusive, no exterior) podem ser propostas em face de qualquer dos entes componentes da Federação Brasileira (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), sendo todos legitimados passivos para responderem a elas, individualmente ou em conjunto: (RE 855178 RG, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015; AgRg no REsp n.º 1.028.835/DF, Relator Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJe 15.12.2008; e AgInt no AREsp 1635297/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/09/2020, DJe 22/10/2020.

4.Mais recentemente, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, firmou-se o entendimento em sede de repercussão de geral, de litisconsórcio necessário da União apenas nas ações em que se demande fornecimento de medicamentos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. (RE 855178 ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-090  DIVULG 15-04-2020  PUBLIC 16-04-2020; e RE 657718, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-267  DIVULG 06-11-2020  PUBLIC 09-11-2020)

5.O medicamento pleiteado, KADCYLA (TRASTUZUMABE ENTANSINA), está devidamente registrado na ANVISA sob o número 101000659, desde 06/01/2014 (https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/25351005315201383/?nomeProduto=KADCYLA).

6.Tratando-se de responsabilidade solidária, cabe à autora definir contra qual ente federado pretende litigar a fim de obter provimento jurisdicional para fornecimento do tratamento e, não tendo sido ajuizada a demanda contra a União, resta afastada a competência da Justiça Federal. (CC 172.817/SC, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2020, DJe 15/09/2020)

7.”Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência ou não de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas” (Súmula 150 do STJ).

8. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

PROCESSO RELACIONADO 0801315-19.2021.4.05.0000

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