A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, nas alienações judiciais, a hasta pública destinada a vender vagas de garagem deve ser restrita aos condôminos, salvo autorização em contrário expressa na convenção condominial.
A decisão foi tomada no julgamento de recurso interposto por um condomínio contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) em execução fiscal movida pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). A corte regional considerou que seria possível a alienação de um box de estacionamento a pessoas estranhas ao condomínio, visto que a lei não teria criado nenhum óbice à expropriação judicial desse tipo de bem.
No recurso ao STJ, o condomínio sustentou que o TRF4 deixou de levar em conta a limitação presente no parágrafo 1º do artigo 1.331 do Código Civil, inserida pelo legislador – segundo o recorrente – com a intenção de preservar, em condomínios residenciais, a segurança e a privacidade dos moradores.
De acordo com o dispositivo, “as partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio”.
Alienação judicial de box de garagem segue o artigo 1.331 do CC
A relatora na Segunda Turma, ministra Assusete Magalhães, destacou a ausência de precedentes específicos no STJ sobre casos de alienação judicial de vaga de garagem. Entretanto, lembrou que a Quarta Turma, no REsp 316.686, afastou a impenhorabilidade da vaga de garagem, definindo que, se o bem pode ser alienado a outro condômino, pode ser penhorado e vendido em hasta pública.
A ministra ponderou que a redação dada pela Lei 12.607/2012 ao artigo 1.331, parágrafo 1º, do CC, de fato, veio para conferir maior segurança aos condomínios, de forma que tanto a doutrina quanto outros tribunais têm decidido no sentido de que, em tais casos, a hasta pública deve se restringir aos condôminos.
“Entendo que a vedação de alienação dos abrigos para veículos a pessoas estranhas ao condomínio, estipulada no artigo 1.331, parágrafo 1º, do Código Civil, deva prevalecer também nas alienações judiciais. Em tais casos, a hasta pública deverá ocorrer no universo limitado dos demais condôminos”, concluiu a relatora.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL AJUIZADA PELO INMENTRO. PENHORA DE VAGA DE GARAGEM. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC⁄2015. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS, NO ACÓRDÃO RECORRIDO. INCONFORMISMO. ART. 1.331, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL. PROIBIÇÃO DE ALIENAÇÃO DE VAGA DE GARAGEM A ESTRANHOS AO CONDOMÍNIO, SALVO AUTORIZAÇÃO EXPRESSA NA CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO. HIPÓTESE EM QUE, AUSENTE AUTORIZAÇÃO NA CONVENÇÃO, A HASTA PÚBLICA DEVE SER RESTRITA AOS DEMAIS CONDÔMINOS. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.I. Recurso Especial interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC⁄2015.II. No acórdão objeto do Recurso Especial, o Tribunal de origem negou provimento a Agravo de Instrumento, interposto pelo Condomínio recorrente, contra decisão que, nos autos de execução fiscal movida pelo INMETRO contra o condômino ora interessado, indeferiu pedido no sentido de que eventual alienação judicial da vaga de garagem de propriedade do executado fosse restrita apenas aos seus condôminos.III. Não há falar, na hipótese, em violação aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022, II, do CPC⁄2015, porquanto a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que os votos condutores do acórdão recorrido e do aresto proferido em sede de Embargos de Declaração apreciaram fundamentadamente, de modo coerente e completo, as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida.IV. Na forma da jurisprudência do STJ, não se pode confundir decisão contrária ao interesse da parte com ausência de fundamentação ou negativa de prestação jurisdicional. Nesse sentido: STJ, EDcl no REsp 1.816.457⁄SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 18⁄05⁄2020; AREsp 1.362.670⁄MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 31⁄10⁄2018; REsp 801.101⁄MG, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 23⁄04⁄2008.V. Nos termos do art. 1.331, § 1º, do Código Civil, na redação dada pela Lei 12.607⁄2012, “as partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio”. Conforme lições doutrinárias e precedentes de outros Tribunais, a restrição relacionada à alienação de abrigo de veículos deve prevalecer inclusive para as alienações judiciais, hipótese em que a hasta pública ocorrerá no universo limitado dos demais condôminos.VI. No caso, inexistindo autorização na convenção do Condomínio recorrente, o Recurso Especial deve ser parcialmente provido, de modo que a hasta pública do abrigo para veículo penhorado nos autos seja restrita aos seus condôminos.VII. Recurso Especial conhecido e parcialmente provido.
Leia o acórdão no REsp 2.008.627.