A casa serve de residência à família do filho de um dos sócios
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho anulou a penhora de um imóvel que pertence a uma microempresa de Caxias do Sul (RS), mas serve de residência para o filho de um de seus sócios. Para o colegiado, a lei que considera impenhorável o bem de família se aplica, também, a terceiros que tenham a sua posse e nele residam.
Posse
A penhora fora determinada para o pagamento de dívida trabalhista da Matrizaria e Recuperadora de Plásticos Ltda. Contra a decisão, o filho do sócio e sua família recorreram, argumentando que, ainda que o imóvel não estivesse registrado em seu nome, eles eram os reais proprietários da residência que existe no terreno. Para isso, juntaram comprovantes de endereço e fotos da casa e sustentaram que a impenhorabilidade do bem de família impossibilita a venda judicial. Alegaram, ainda, que não tinham condições de arcar com custos de aluguel caso fossem despejados do local.
Entretanto, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região manteve a penhora, sob o fundamento de que o bem pertencia à pessoa jurídica executada (a empresa). Segundo o TRT, embora tenha comprovado que reside no local, a família exerce apenas a posse direta do imóvel.
Direito fundamental
A relatora do recurso de revista dos ocupantes do imóvel, ministra Kátia Arruda, afirmou que a Constituição da República considera a moradia como um direito fundamental, e uma das formas de garantir esse direito e a dignidade da pessoa humana é a proteção ao bem de família destinado a essa finalidade.
Nesse sentido, a Lei 8.009/1990, que regulamenta a matéria, veda a penhora do imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar. Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) interpreta essa proteção de forma ampla, estendendo-a à posse do imóvel em nome de pessoa jurídica, desde que o possuidor demonstre que o bem se presta à moradia da família, como no caso.
O recurso ficou assim ementado:
I – AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/2017. FASE DE EXECUÇÃO. EXECUTADOS.
EMBARGOS DE TERCEIRO. BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL PERTENCENTE À PESSOA JURÍDICA EXECUTADA. TERCEIRO POSSUIDOR DIRETO. POSSIBILIDADE DE PENHORA.
1 – Pela decisão monocrática agravada, foi reconhecida a transcendência e negou-se seguimento ao recurso de revista interposto pelos executados, sob o fundamento de que não foi demonstrada ofensa aos dispositivos constitucionais invocados.
2 – Em melhor análise das razões do recurso de revista, constata-se possível violação a dispositivo constitucional, ao contrário do que constou na decisão monocrática.
3 – Agravo a que se dá provimento para prosseguir no exame do recurso de revista.
II – RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/2017. FASE DE EXECUÇÃO. EXECUTADOS.
EMBARGOS DE TERCEIRO. BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL PERTENCENTE À PESSOA JURÍDICA EXECUTADA. TERCEIRO POSSUIDOR DIRETO. POSSIBILIDADE DE PENHORA.
1 – Deve ser reconhecida a transcendência jurídica quando se mostra aconselhável o exame mais detido da controvérsia devido às peculiaridades do caso concreto. O enfoque exegético da aferição dos indicadores de transcendência em princípio deve ser positivo, especialmente nos casos de alguma complexidade, em que se torna aconselhável o debate mais aprofundado da matéria.
2 – No caso dos autos, dos trechos transcritos do acórdão recorrido, denota-se que o TRT decidiu pela manutenção da penhora do imóvel objeto da discussão trazida no recurso de revista, sob o fundamento de que o bem pertence à pessoa jurídica executada e não aos recorrentes, os quais, embora tenham comprovado que residam no local, exercem apenas a posse direta.
3 – A Constituição Federal, em seu art. 6º, caput, considera a moradia como um direito fundamental, ao estabelecer que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (grifos acrescidos).
4 – Neste cenário, mostra-se imprescindível a proteção do bem de família destinado à moradia do executado como forma de efetivação do citado direito social e da proteção da dignidade da pessoa humana.
5 – Com o intuito de efetivar o citado direito fundamental, o STJ interpreta de forma ampla a proteção atribuída ao bem de família por meio da impenhorabilidade, considerando que a proteção conferida à propriedade do citado bem deve ser estendida à posse do imóvel em cuja matrícula conste o nome de pessoa jurídica, desde que o possuidor demonstre que o bem possuído presta-se à moradia da entidade familiar, como ocorreu no caso em tela. Julgados.
6 – Recurso de revista de que se conhece a que se dá provimento.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-0020701-43.2019.5.04.0401