Na análise de deficiência, apuração de longo prazo deve ser computada desde o início do impedimento até a data prevista de cessação

Redação do Tema 173 e da Súmula nº 48 foram alteradas para adequação ao novo entendimento firmado pela TNU

A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) alterou o entendimento fixado no Tema 173 e na Súmula nº 48, que agora adotarão a seguinte redação: “para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação”. Os membros da TNU se reuniram no dia 25 de abril, na sede do Conselho da Justiça Federal (CJF), em Brasília.

O caso levado para apreciação do Colegiado trata de embargos de declaração opostos pelo autor do processo e pelo Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) em face de acórdão da Turma Nacional de Uniformização (Evento 139) que conheceu e negou provimento ao incidente de uniformização, firmando a tese representativa da controvérsia de que “para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do início da sua caracterização”.

Ao recorrer da decisão, o autor do processo argumentou que o Colegiado deixou de observar a previsão de vedação de retrocesso contida no artigo 4.4 da Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo.

Por sua vez, o IBDP asseverou que há necessidade de saber como deve ser entendida a expressão desde a data de sua caracterização do entendimento outrora estabelecido no Tema 173, questionando se a duração mínima de dois anos já deve estar configurada, se já deve estar comprovada ou ser aferida na perícia pretérita desse período ou se poderá ser projetada de acordo com a perícia e documentos juntados. Apontou, também, haver contradição entre a fixação de um prazo de deficiência (impedimento de longo prazo) com a expressão que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, uma vez que o termo “necessariamente” pode ensejar interpretar de que em alguns casos seria necessário e em outros não. Desse modo, o IBDP sugeriu, então, a retirada da palavra necessariamente da tese fixada.

No primeiro voto, apresentado durante a sessão de 21 de março, o relator do processo, juiz federal Sérgio de Abreu Brito, reconheceu que a alegação de proibição de retrocesso prevista no artigo 4.4 da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência não foi enfrentada de forma expressa. No entanto, para o magistrado, no caso examinado, não existiu retrocesso porque o legislador pátrio apenas ajustou o conceito de pessoa com deficiência àquele contido na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Ao analisar os embargos do IBDP, o relator afirmou que não vislumbrou “qualquer obscuridade” no significado da expressão desde a data do início da sua caracterização: “Deve-se aferir o tempo total de impedimento desde o início da sua caracterização, somando-se com o prazo futuro estimado na perícia judicial. Assim, leva-se em conta não só o lapso temporal de impedimento até a perícia judicial, mas também o período futuro estimado pela prova pericial”, explicou.

Ainda de acordo com o magistrado, a utilização da palavra necessariamente contida na tese inicialmente fixada “não leva a qualquer exigência de que para se configurar a situação de deficiência se faz necessária a prova da incapacidade”. Na ocasião, o juiz federal votou pelo acolhimento dos embargos de declaração formulado pela parte autora e pela rejeição dos embargos opostos pelo IBDP.

Divergência

O juiz federal Fábio de Souza divergiu do colega e afirmou que o termo caracterização contido na tese inicialmente firmada no Tema 173 é dúbio e tem potencial de gerar controvérsia a respeito da parte estratégica do enunciado. “Afinal, a tese deveria fornecer resposta segura sobre quando está ‘caracterizado’ o impedimento: no momento do seu surgimento ou quando constatado pela perícia?”, indagou o magistrado, que acolheu o pedido de esclarecimento feito pelo IBDP e pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Fábio de Souza citou o parecer proferido pela Turma Recursal de São Paulo, para a qual, no caso concreto, a prova pericial afastou a existência de impedimento de longo prazo, confirmando a sentença de improcedência, baseando-se no fato de a perícia indicar o período de 180 dias para a recuperação do beneficiário.

“A deficiência exige um impedimento de longo prazo. O tempo de impedimento existente no momento do requerimento do benefício deve ser computado, sob pena de se criar situações em que uma pessoa com deficiência há vários anos não terá cobertura da Assistência Social porque há prognóstico para sua recuperação em período inferior a dois anos contados da perícia […] Logo, é importante esclarecer que a expressão início da sua caracterização significa ‘surgimento do impedimento’”, argumentou o juiz federal.

Quanto à dúvida levantada pelo IBDP sobre termo necessariamente, o magistrado afirmou que tanto a tese quanto o voto que a fundamenta são claros no sentido de que “os conceitos de deficiência não se confundem”, pois, em alguns casos, “a pessoa com deficiência será também inválida”.

Voto retificado

Após examinar as considerações feitas pelo juiz federal Fábio de Souza, o relator do processo, juiz federal Sérgio de Abreu Brito, retificou o voto anterior e concordou que a expressão início da sua caracterização pode realmente provocar dúvidas de interpretação. “Em que pese o meu entendimento de que o sentido desta expressão se refira ao início da existência do impedimento e não o momento da sua constatação pelo perito, com escopo de sanar qualquer dúvida, concluo ser prudente a alteração da expressão supracitada na tese”, disse.

Diante do exposto, o relator votou por (I) conhecer e dar parcial provimento aos embargos de declaração interpostos pelo IBDP, elucidando que “na análise da deficiência, para a apuração do ‘longo prazo’, deve ser computado o período inserido entre a data de início do impedimento e a data prevista para a sua cessação” e (II) conhecer e dar provimento aos embargos de declaração apresentados pelo autor, para esclarecer “a inexistência de violação a princípio da vedação do retrocesso”. Por fim, o magistrado sugeriu a mudança da tese fixada no Tema 173 e alteração do enunciado nº 48 da Súmula da TNU para se adequar ao novo entendimento.

A exposição dos magistrados foi referendada pelos demais membros do Colegiado, que aprovaram, por unanimidade, a modificação do texto do Tema 173 e da Súmula nº 48 nos termos do voto do juiz relator.

Processo nº 0073261-97.2014.4.03.6301

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