Além da prisão, ele sofreu restrições em sua liberdade de locomoção.
A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho majorou o valor da indenização por danos morais devida a um gerente do Itaú Unibanco S.A. que foi preso e submetido a restrições por dois anos por não ter apresentado dentro do prazo estabelecido documentos solicitados pela Justiça Federal que se encontravam em poder do departamento jurídico da empresa. A Turma, na decisão, considerou as limitações geradas ao empregado em decorrência da transação penal decorrente de um fato a que não deu causa.
Prisão
Na reclamação trabalhista, o gerente, admitido em 1985 e dispensado em 2009, disse que, em 2002, pouco depois de ser transferido para Curitiba (PR), recebeu ofício da Justiça Federal para, em 48 horas, informar a existência de conta-corrente de terceiro e encaminhar documentos. Como não tinha autorização para isso, repassou o caso para a área jurídica, em São Paulo e não apresentou os documentos nos termos solicitados.
Dias depois, ele disse que foi surpreendido com a presença de cinco policiais federais que o cercaram em sua mesa de trabalho e lhe deram voz de prisão na presença de clientes e empregados. Na delegacia, segundo ele, “foi tratado como bandido”.
Transação penal
Depois de cerca de sete horas de detenção, o gerente disse que concordou em assinar uma “nota de culpa” e a pagar multa no valor de R$ 9 mil a título de doação à comunidade. A transação penal, instituto semelhante à conciliação, mas na esfera criminal, previa ainda que ele teria de se apresentar mensalmente em juízo durante dois anos e não poderia se ausentar da cidade por mais de sete dias sem autorização judicial.
Danos latentes
O juízo da 6ª Vara do Trabalho de Londrina (PR) condenou o banco ao pagamento de R$ 50 mil a título de indenização por danos morais, e a sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR).
No recurso de revista, o gerente sustentou que o valor da condenação não repara os danos sofridos nem desestimula novas condutas. Segundo ele, a gravidade e a extensão dos efeitos do ocorrido, que perduraram por dois anos, são danos latentes e deixaram sequelas definitivas, e o valor arbitrado foi irrisório diante da capacidade econômica do banco.
Majoração
A relatora do recurso, ministra Maria Helena Mallmann, ressaltou que o banco forneceu ao juízo os documentos solicitados mais de duas horas depois da prisão. “Em decorrência da prisão, o empregado respondeu a ação criminal, na qual aceitou a transação penal que lhe acarretou diversas obrigações e restrições por dois anos, por fato a que não deu causa”, destacou.
Segundo a ministra, o TST tem revisto os valores arbitrados para as indenizações apenas em caráter excepcional, na hipótese de serem irrisórios ou exorbitantes. A relatora concluiu que o montante da condenação imposta pelo TRT foge aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e propôs sua majoração para R$ 200 mil, valor que, a seu ver, atende ao porte financeiro do banco, à gravidade do ato e à repercussão dos fatos na vida do empregado.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º 13.015/2014. PRESCRIÇÃO. PRISÃO DECORRENTE DA RELAÇÃO DE EMPREGO. CIÊNCIA DA LESÃO OCORRIDA ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 E DA PROMULGAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004.
- Destaque-se, inicialmente, que a presente ação versa sobre o pedido de indenização por danos morais decorrentes de dois fatos: a prisão sofrida pelo empregado, bem como a transação penal a que foi posteriormente submetido. Inicialmente será analisada a tese de prescrição da pretensão do pedido de indenização decorrente da prisão.
- Trata-se de controvérsia acerca da prescrição aplicável à pretensão de reparação por danos morais oriunda prisão decorrente da relação de emprego, ocorrida em 29/11/2002, antes da promulgação da Emenda Constitucional 45 e antes da vigência do Código Civil de 2002. Do quadro fático delineado no acórdão regional, verifica-se que não transcorreu mais da metade dos 20 anos estabelecidos no art. 117 do Código Civil de 1916, pelo que, à luz do que dispõe a regra de transição do art. 2.028 do Código Civil de 2002, a prescrição aplicável ao caso é a trienal prevista no art. 206, §3º, V, do Código Civil de 2002. Assim, conforme jurisprudência pacífica do TST, o prazo prescricional de 3 anos é contado a partir da vigência do Código Civil de 2002, em 11/01/2003, e o seu termo final ocorreu em 11/01/2006, pelo que a partir do dia 12/01/2006, a pretensão de reparação civil do reclamante já se encontrava prescrita. Como a presente ação foi ajuizada em 29/05/2009, depois do prazo de 3 anos estabelecido pelo art. 206, §3º, V, do Código Civil, a pretensão formulada pelo reclamante foi fulminada pela prescrição. Precedentes. Óbice da Sumula 333 do TST e do art. 896, § 7°, da CLT. Recurso de revista não conhecido.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EFEITOS DA TRANSAÇÃO PENAL. EVENTOS POSTERIORES À 29/06/2004. VALOR ARBITRADO. R$ 50.000,00 (CINQUENTA MIL REAIS). MAJORAÇÃO PARA R$ 200.000,00 (duzentos mil reais)
- Consta dos autos que em 25/11/2002, o autor, na condição de gerente-geral do Banco, recebeu ofício da Justiça Federal para, em 48 horas, informar a existência de conta-corrente de terceiro e encaminhar documentos relativos à conta e extratos de movimentação.
- Restou registrado que o autor não tinha autorização para prestar as informações requeridas pelo Juízo Federal, tendo em vista que o departamento jurídico do Banco-réu centraliza as respostas de ofício jurídico de todo o Brasil. O reclamado, todavia, apenas em 29/11/2002 apresentou a documentação, mas não nos termos solicitados pelo Juízo Federal, o que ensejou a decretação da prisão em flagrante do autor. Em 29/11/2002, às 17h58min, o réu apresentou a documentação referente à solicitação do Juízo Federal, ou seja, após a prisão do autor, ocorrida por volta das 15 horas. 3. Dentro desse contexto fático, foi reconhecida a responsabilidade do réu pela prisão do autor. Em decorrência da prisão, o autor respondeu a ação criminal, na qual aceitou a transação penal que lhe acarretou diversas obrigações e restrições por dois anos, por um fato que não deu causa. Com este fundamento, o Tribunal Regional condenou o Banco reclamado a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 50.000,00, em virtude dos efeitos da transação penal que firmou, que acarretaram ao empregado restrições (no período compreendido entre outubro de 2003 a outubro de 2005).
- Recorde-se que não pode ser apreciada a insurgência quanto ao pedido de indenização por danos morais decorrentes da prisão porque, conforme já fundamentado anteriormente, a pretensão restou fulminada pela prescrição.
- Por outro lado, quanto aos efeitos da transação penal, a Corte Regional observou que o “acordo” a que foi submetido o empregado, trouxe prejuízos morais, fundamentando que: “Em decorrência da prisão, por culpa do réu, o autor respondeu a ação criminal, na qual aceitou transação penal que lhe acarretou diversas obrigações e restrições (fls. 215-216): comparecimento mensal ao Juízo Criminal para comprovar ocupação lícita e informar suas atividades; proibição de mudança de endereço sem prévia autorização judicial; proibição de ausentar-se da jurisdição por mais de sete dias corridos sem prévia autorização judicial; doação mensal de valores a entidade beneficentes; apresentar certidões de antecedentes criminais da Justiça Eleitoral e Justiça Federal semestralmente”.
Em seguida, acentuou que: “É certo que as restrições impostas ao autor decorreram da aceitação de proposta do Ministério Público Federal para a suspensão condicional do processo. Todavia, a ação criminal decorreu da prisão do autor por culpa do réu, de forma que não se pode imputar à vontade do autor as limitações que sofreu por dois anos. Não há dúvida de que a condição a que o autor ficou submetido, por dois anos, violou sua honra e sua imagem, devido as restrições de ordem criminal por fato ao qual não deu causa“.
- Considerando as limitações geradas ao autor em razão da transação penal efetuada, necessário se faz o conhecimento do recurso de revista por violação do artigo 5º, V, da Constituição Federal, e no mérito, o seu provimento para majorar o valor da condenação para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), valor que atende ao estofo financeiro do Banco, à gravidade do ato e aos reflexos na vida do empregado. In casu, recorde-se que se trata de uma instituição financeira que, ainda que de forma indireta, incentivou a prática delituosa, provocando um crime que afronta a própria administração da Justiça.
Recurso de revista conhecido e provido.
JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Na Justiça do Trabalho, os juros de mora incidentes sobre a indenização por danos morais são contados a partir da data do ajuizamento da ação. Inteligência do art. 883 da CLT c/c a Súmula 439 do TST. Recurso de revista conhecido e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-619-54.2012.5.09.0673