Banco é condenado por não facilitar acesso de empregada com paralisia cerebral ao trabalho

Ela tinha de fazer diversas baldeações no trajeto para o local de lotação.

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho deu provimento ao recurso de uma ex-empregada do Itaú Unibanco S.A que pedia a condenação do banco por não atender pedido de acessibilidade para poder retornar ao trabalho. Vítima de paralisia cerebral, ela buscava realocação numa agência perto de casa, mas o pedido foi negado. Por maioria, o colegiado condenou o banco ao pagamento de R$ 100 mil a título de indenização, por entender que ele deixou de cumprir sua responsabilidade e sua função social como empresa.

Paralisia

A empregada foi admitida em julho de 2008 em vaga para pessoa com deficiência. Segundo informou no processo, a paralisia cerebral sofrida na infância havia deixado sequelas graves e permanentes que comprometem o funcionamento dos membros inferiores. Para se locomover, tem de usar muletas, o que acarretou ou agravou quadros de doenças musculares incapacitantes.

Meses após a admissão, ela passou por diversos afastamentos por doença e por licença-maternidade. Em agosto de 2011, após a alta previdenciária, disse que o banco se recusou a lhe dar um trabalho compatível com suas limitações físicas ao lotá-la em local distante 20 km de sua casa “quando poderia, sem custos, adaptar as condições de trabalho preexistentes às necessidades especiais dela”.

Sua maior limitação, conforme o relato, era vencer três horas diárias de trajeto, com baldeações de ônibus e metrô. Segundo ela, o obstáculo seria facilmente vencido se o banco, “dono de centenas de agências na cidade de São Paulo”, simplesmente a transferisse para uma localizada próxima à sua residência. Por isso, apresentou três opções: a transferência, o teletrabalho ou o fornecimento de transporte especial.

Defesa

O banco, em sua defesa, disse que propôs rescindir o contrato mediante o pagamento de R$ 1.500 e de cerca de R$ 8 mil em verbas rescisórias e a liberação do FGTS e do seguro-desemprego, mas que a empregada contrapôs à oferta o valor de R$ 80 mil, considerado “desleal”. Afirmou ainda que ficou “cabalmente demonstrada” a acessibilidade do seu Centro Empresarial, no bairro do Jabaquara, por meio de certificado expedido pela Prefeitura de São Paulo.

Segundo a instituição, mais de 250 pessoas com deficiência trabalham no local, “todos ávidos e desejosos para trabalhar”. Também questionou se a situação da empregada não representaria um privilégio concedido pelo Poder Judiciário, uma vez que muitos outros empregados com deficiência percorrem grandes distâncias com dificuldades maiores do que a dela. “A verdade é que a funcionária não quer trabalhar”, afirmou a defesa.

Prazo

O juízo da 49ª Vara do Trabalho de São Paulo (SP) julgou procedente o pedido e determinou que o banco oferecesse posto de trabalho à empregada em uma das agências relacionadas por ela nos autos, em atividade compatível com seu estado físico. Condenou a instituição também ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$10 mil.

Condições pessoais

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), no entanto, entendeu que não há no ordenamento jurídico ou no conjunto de princípios especiais do direito do deficiente previsão que obrigue a distribuição geográfica dos postos e a mudança de local de trabalho e que a lotação dos empregados está inserida no poder diretivo do empregador.

Segundo o TRT, as dificuldades relatadas pela empregada decorrem de suas condições pessoais, “limitações físicas preexistentes ao contrato de trabalho”, e não por culpa do empregador. Sobre a indenização, a conclusão foi que não houve ato ilícito, pois a incerteza e a ausência de trabalho mencionados na sentença como fundamentos para a procedência do pedido decorreriam de conduta da empregada, que se recusou a reassumir suas funções em novo local de trabalho.

Compromisso de inclusão

O relator do recurso de revista da bancária, ministro Cláudio Brandão, disse em seu voto que o Brasil adotou as medidas legislativas necessárias para concretizar os direitos humanos das pessoas com deficiência, ao ratificar a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e editar o Estatuto da Pessoa com Deficiência. “Não mais se admite postura passiva das empresas em relação ao direito às adaptações razoáveis”, afirmou. “Não lhes cabe apenas oferecer vagas para pessoas com deficiência ou reabilitadas e esperar que se adequem ao perfil exigido”.

Na sua avaliação, a realocação da empregada de maneira a facilitar o acesso ao trabalho “não representa favor, gesto piedoso ou caridade; muito ao contrário, revela cumprimento do compromisso de inclusão social que decorre do artigo 170 da Constituição da República”. O relator ressaltou ainda que o Itaú é “sabidamente uma das maiores instituições financeiras do país” e, ao ignorar sua responsabilidade e sua função social, que o impede de ser apenas fonte geradora de lucro, “perdeu uma grande oportunidade de se valorizar perante a sociedade”.

Por maioria, vencido o desembargador Roberto Nobrega de Almeida Filho, a Turma restabeleceu a sentença e condenou o banco ao pagamento dos salários desde o fim da alta previdenciária até o efetivo retorno ao trabalho. O valor da indenização foi arbitrado em R$ 100 mil.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. PROTEÇÃO JURÍDICA E ACESSO AO TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. DIREITO ÀS ADAPTAÇÕES RAZOÁVEIS. OBRIGAÇÕES DO ESTADO BRASILEIRO PERANTE A SOCIEDADE INTERNACIONAL. SISTEMAS DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS E INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS. DECLARAÇÃO SOCIOLABORAL DO MERCOSUL. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. APLICAÇÃO ÀS RELAÇÕES PRIVADAS. PERSPECTIVA CONSOLIDADA PELA CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA, DE 2007, APROVADA NO ÂMBITO INTERNO COM EQUIVALÊNCIA A EMENDA CONSTITUCIONAL, E PELA LEI Nº 13.146/2015 – LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA) . RESPONSABILIDADE E FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível afronta aos artigos 2 e 27, 1, “i”, da Convenção das Nações Unidas Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência .

RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. PROTEÇÃO JURÍDICA E ACESSO AO TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. DIREITO ÀS ADAPTAÇÕES RAZOÁVEIS. OBRIGAÇÕES DO ESTADO BRASILEIRO PERANTE A SOCIEDADE INTERNACIONAL. SISTEMAS DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS E INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS. DECLARAÇÃO SOCIOLABORAL DO MERCOSUL. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. APLICAÇÃO ÀS RELAÇÕES PRIVADAS. PERSPECTIVA CONSOLIDADA PELA CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA, DE 2007, APROVADA NO ÂMBITO INTERNO COM EQUIVALÊNCIA A EMENDA CONSTITUCIONAL E PELA LEI Nº 13.146/2015 – LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA) . RESPONSABILIDADE E FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA. DISCRIMINAÇÃO POR IMPACTO ADVERSO. A proteção das pessoas com deficiência na realidade hodierna segue padrões diferenciados daqueles vigentes no passado. Incorporados pelo Decreto nº 6.949, de 25/08/2009 , a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo compreendem normas material e formalmente constitucionais , na medida em que aprovados pelo quórum previsto no § 3º do artigo 5º da Constituição Federal e, por conseguinte, são equivalentes a Emenda à Constituição, consoante a clara dicção do citado dispositivo constitucional. Tal norma constitucional altera a perspectiva acerca do tema , na medida em que evidencia o papel determinante das barreiras impostas pela sociedade a esses cidadãos e releva sua responsabilidade pela extirpação desses empecilhos. Estabelece, assim, o dever de promover adaptações razoáveis e fixa que a recusa implica discriminação por motivo de deficiência , o que se coaduna com os princípios que lhe são inerentes, em especial , os da não discriminação, da plena e efetiva participação e inclusão na sociedade, do respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas com deficiência como parte da diversidade humana e da humanidade, da igualdade de oportunidades e da acessibilidade (artigo 3, itens “b”, “c”, “d”, “e” e “f”). Ainda no âmbito da ONU, destaca-se a Convenção nº 159 da Organização Internacional do Trabalho . As obrigações assumidas pelo Estado brasileiro quanto ao tema, perante a sociedade internacional, não se esgotam no sistema das Nações Unidas. Com efeito, no âmbito do sistema Interamericano , a preocupação com questões trabalhistas já exsurge na Carta da Organização dos Estados Americanos . Na Carta Democrática Interamericana , de 2001, fixa-se que a garantia do exercício pleno e eficaz dos direitos dos trabalhadores, tal qual consagrado na Declaração da OIT relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho (1998), é elemento primacial para a promoção e fortalecimento da democracia (artigo 10). Somam-se a esses instrumentos as previsões do Pacto de San José da Costa Rica (1966) e do Protocolo de San Salvador (1988). Neste, reitera-se a obrigação de não discriminação (artigo 3) e, e m relação às pessoas com deficiência, destaca-se, em seu artigo 18, que têm “[…] direito a receber atenção especial, a fim de alcançar o máximo desenvolvimento de sua personalidade”. Na seara da integração latino-americana, erigida a norma constitucional (artigo 4º, parágrafo único, da CRFB), a Declaração Sociolaboral do Mercosul garante a não discriminação como direito individual (artigo 1º) e, acerca das pessoas com deficiência, consigna que “[…] serão tratadas de forma digna e não discriminatória, favorecendo-se sua inserção social e no mercado de trabalho” (artigo 2º). Atento às obrigações assumidas perante a sociedade internacional, o Estado brasileiro adotou as medidas legislativas necessárias para concretizar os direitos humanos das pessoas com deficiência. Ratificou a Convenção das Nações Unidas Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de 2007 , e lhe atribui natureza jurídica equivalente às emendas constitucionais (artigo 5º, §3º, da Constituição Republicana) e altera a leitura que se deve fazer do artigo 93 da Lei nº 8.213/91 e do Decreto que a regulamenta, diretriz que veio a ser ratificada posteriormente pela Lei nº 13.146/2015 – Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual absorve suas concepções. Reclama-se, agora, a atuação do Estado-juiz no sentido de concretizá-las. A mencionada Convenção da ONU inova sobremaneira o sistema internacional dos direitos humanos ao alterar substancialmente o conceito de discriminação , para nele incluir ” a recusa de adaptação razoável”. Adaptações razoáveis são compreendidas como “as modificações e os ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais” . Tais mudanças objetivam densificar os princípios da inclusão e da igualdade, da não discriminação e da dignidade inerente. Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional consignou: “Em que pese a suficiência de provas nos autos quanto a grande dificuldade de deambulação da reclamante (limitada a pequenas distâncias e com o uso de muletas), restou igualmente comprovado que a mesma pode e faz uso de cadeira de rodas” e “o equipamento em questão, embora não resolva por completo os problemas de locomoção da autora, certamente os ameniza sobremaneira, a ponto de evitar alguns dos possíveis incidentes”. Nesse passo, fixou a tese de que “inexiste no ordenamento jurídico, e mesmo no plexo das normas tuitivas do deficiente, qualquer previsão que obrigue a distribuição geográfica dos postos de trabalho” e “a mudança de local de trabalho, desde que não implique alteração do domicílio do empregado, está inserida no poder diretivo do empregador, conforme se infere do art. 469 da CLT, não configurando alteração contratual lesiva.” E concluiu: “As dificuldades relatadas pela obreira para o deslocamento da sua casa ao novo local de trabalho, e vice e versa, decorrem de condições pessoais suas, quais sejam, limitações físicas pré-existentes ao contrato de trabalho e perda do auxílio até certo momento prestado pela sua genitora, e não por culpa do reclamado” . Com o devido respeito à Corte de origem, depreende-se da leitura das citadas normas que compõem o direito internacional e também o direito interno a conclusão no sentido de que não mais se admite postura passiva das empresas no Brasil, em face do direito às adaptações razoáveis fixado no instrumento internacional ratificado e na Lei interna . Não lhes cabe apenas oferecer vagas para pessoas com deficiência ou reabilitadas e esperar que se adequem ao perfil exigido . Para que cumpram sua função social (artigos 1º, IV, e 170, caput e III, da CF) e o dever de inclusão pelo trabalho previsto no artigo 27, inclusive quanto ao direito do trabalhador com deficiência às adaptações razoáveis no posto de trabalho (artigo 27, 1, “i”, da Convenção de Nova Iorque), precisam comprovar, de forma patente, que, de fato, adotaram ações eficazes com o fito de viabilizar a efetiva inserção dos trabalhadores com deficiência às atividades empresariais. Cabe-lhes, não apenas introduzir medidas aptas a possibilitar a criação dos postos de trabalho, mas também modificar o ambiente de trabalho para que as pessoas com deficiência possam exercer o direito à manutenção de “um trabalho de sua livre escolha ou aceitação no mercado laboral, em ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo e acessível …” (artigo 27, 1), tornar efetiva a proibição de ” discriminação baseada na deficiência com respeito a todas as questões relacionadas com as formas de emprego, inclusive condições de recrutamento, contratação e admissão, permanência no emprego, ascensão profissional e condições seguras e salubres de trabalho ” (artigo 27, 1, “a”) e até mesmo implementar programas internos de conscientização dos demais trabalhadores a receberem os seus colegas com deficiência. No caso, o Banco réu, sabidamente uma das maiores instituições financeiras do país, com agências espalhadas por todo o território nacional, ao optar por concentrar todos os empregados com deficiência em um local dotado de rampas e outros elementos propiciadores da acessibilidade, conquanto positiva e satisfatória para muitos (embora também possa até ser compreendida como modalidade sutil de segregação, por não viabilizar a convivência entre iguais) , não se demonstrou suficiente e eficaz para a autora, que, de acordo com o acórdão regional, ” possui severa dificuldade de deambulação em razão de ser portadora de paralisia cerebral. ” Com efeito, as barreiras enfrentadas pela pessoa com deficiência não são apenas físicas, mas também culturais e atitudinais, estas, aliás, não raras vezes, muito maiores. E, no caso da recorrente, não é aceitável que, de muletas ou mesmo de cadeira de rodas, tenha que percorrer, de ônibus ou metrô, cerca de quarenta quilômetros por dia nos trajetos de ida e volta para o local de trabalho oferecido pelo réu , distância essa reconhecida pela Corte de origem. Como dito, constitui dever do empregador a implementação de meios eficazes e razoáveis que propiciem não apenas a inserção, mas precipuamente, a manutenção do empregado com deficiência no emprego, de acordo com as particularidades de cada caso (conceito previsto nos artigos 2 e 27, 1, “i”, da Convenção de Nova Iorque e 2º, VI, da LBI). Na situação em análise, a autora apresentou alternativas que seriam razoáveis para o adequado retorno ao trabalho e que não acarretariam ônus excessivo ao empregador , quais sejam: sua transferência para uma das agências bancárias indicadas e localizadas próximas à sua residência; reativação do contrato de trabalho em regime de teletrabalho; ou a disponibilização de transporte especial para ida e vinda do trabalho. Tal atitude do empregador, ao realocar a empregada de maneira a facilitar o acesso ao trabalho, não representa favor, gesto piedoso ou caridade; muito ao contrário, revela cumprimento do compromisso de inclusão social que decorre do já citado artigo 170 da Constituição, o qual, nas palavras José Afonso da Silva, constitui um dos ” princípios políticos constitucionalmente conformadores ou princípios constitucionais fundamentais da ordem econômica e social, além de viabilizar o direito fundamental à igualdade de oportunidades das pessoas com deficiência, expressamente reconhecido pelo Estado brasileiro, em face da previsão contida no artigo 27, I, “a”, da Convenção mencionada. Decisão regional que merece reforma. Recurso de revista conhecido e provido.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS CAUSADOS AO EMPREGADO. CARACTERIZAÇÃO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. RECUSA DO EMPREGADOR À PROMOÇÃO DE ADAPTAÇÕES RAZOÁVEIS. A responsabilidade civil do empregador pela reparação decorrente de danos morais causados ao empregado pressupõe a existência de três requisitos, quais sejam: a conduta (culposa, em regra), o dano propriamente dito (violação aos atributos da personalidade) e o nexo causal entre esses dois elementos. O primeiro é a ação ou omissão de alguém que produz consequências às quais o sistema jurídico reconhece relevância. É certo que esse agir de modo consciente é ainda caracterizado por ser contrário ao Direito, daí falar-se que, em princípio, a responsabilidade exige a presença da conduta culposa do agente, o que significa ação inicialmente de forma ilícita e que se distancia dos padrões socialmente adequados, muito embora possa haver o dever de ressarcimento dos danos, mesmo nos casos de conduta lícita. O segundo elemento é o dano que, nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, consiste na “[…] subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral”. Finalmente, o último elemento é o nexo causal, a consequência que se afirma existir e a causa que a provocou; é o encadeamento dos acontecimentos derivados da ação humana e os efeitos por ela gerados. Conforme amplamente dirimido no tópico anterior, a empresa, ao ignorar a sua responsabilidade e função social, que a impede de ser apenas fonte geradora de lucro, perdeu uma grande oportunidade de valorizar-se não apenas junto à autora, como também na comunidade interna e, sobretudo, junto à sociedade. Com efeito, ao se recusar a implementar condições de trabalho adequadas à empregada com sérias restrições de locomoção , decorrentes de uma paralisia cerebral, o Banco réu não exerceu seu direito potestativo de acordo com a finalidade social que deveria ser respeitada, cometendo verdadeiro abuso. Como se constata na hipótese, o dano sofrido corresponde ao desgaste e frustração da autora diante da incerteza e da ausência do trabalho. Além da privação do sustento e do exercício de atividade produtiva e remunerada. Tal situação de aflição psicológica é o sofrimento humano experimentado no presente caso. Evidenciado o dano, assim como a conduta culposa do empregador e o nexo causal entre ambos, deve ser reformado o acórdão regional que, a despeito de reconhecer a ocorrência da situação fática acima descrita, excluiu da condenação a reparação por danos morais. Outrossim, levando-se em conta a proporcionalidade, a razoabilidade e os comandos resultantes das normas jurídicas, os quais devem ser interpretados segundo critérios que ponderem equilíbrio entre meios e fins a elas vinculados, e, ainda, de acordo com um juízo de verossimilhança e ponderação, majoro o valor da indenização por danos morais arbitrados na origem para R$ 100.000,00 (cem mil reais), com base na extensão do dano, observando-se, para tanto, que a autora se encontra afastada do trabalho, por culpa do réu, desde agosto de 2011; foi privada do convívio social; no ambiente de trabalho e da possibilidade de demonstrar o seu potencial, como profissional, e na necessidade de se imprimir caráter pedagógico à pena. Recurso de revista conhecido e provido.

Processo: RR-1076-13.2012.5.02.0049

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