Anac deve garantir benefício a acompanhantes de menores de 16 anos; determinação da Justiça Federal atende a pedido do MPF
A pedido do Ministério Público Federal, a Justiça Federal em Brasília determinou que a Agência Nacional de Aviação (Anac) adote todas as providências necessárias para garantir que os acompanhantes de crianças e jovens menores de 16 anos classificados como passageiros com necessidade de atendimento especial (Pnae) tenham direito a desconto no valor da passagem. O benefício está previsto na Resolução 280/2013 da Anac, mas vem sendo descumprido.
A agência também deverá, no prazo de 30 dias, revisar todas as orientações divulgadas a respeito do tema, em meios escrito ou digital, retirando do ar a informação de que os acompanhantes de Pnae menores de 16 anos não fazem jus ao direito de pagar pela passagem até 20% do valor pago pela pessoa que acompanham.
A decisão foi em ação civil pública ajuizada pelo MPF em 2023, após o órgão receber denúncias de que a agência estava negando o desconto na passagem aérea sob a alegação de que, por lei, crianças e jovens menores de 16 anos já precisam viajar acompanhados.
Atendimento especial – De acordo com a resolução da Anac, são classificados como pessoas com necessidade de atendimento especial (Pnae) idosos com idade igual ou superior a 60 anos, gestantes, lactantes, pessoas acompanhadas por criança de colo, pessoas com mobilidade reduzida ou qualquer um que apresente condição física ou mental capaz de limitar sua autonomia como passageiro. A norma exige que o Pnae tenha um acompanhante quando viajar em maca ou incubadora; quando, em razão de condição mental ou intelectual, não possa compreender as instruções de segurança de voo; ou quando não consiga atender às suas necessidades fisiológicas sem assistência.
Nessas situações, a companhia aérea deve providenciar um acompanhante, sem custo adicional, ou o acompanhante indicado pelo Pnae deve pagar pela passagem até 20% do valor pago pela pessoa que ele acompanha. O objetivo da norma é assegurar assistência, possibilitando aos passageiros que não podem viajar sozinhos o acesso ao transporte aéreo, sem onerá-los demais.
No entanto, a agência não vinha reconhecendo a necessidade de as companhias aéreas assegurarem o desconto aos acompanhantes de Pnaes menores de 16 anos. A alegação era de o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já exige que crianças e adolescentes viajem acompanhados dos pais ou responsáveis. A informação constava, inclusive, do site da Agência, como ficou comprovado durante o processo.
Discriminação – Segundo o MPF, o entendimento adotado pela Agência é discriminatório, uma vez que coloca crianças e jovens com deficiência num nível de proteção de direitos inferior às demais pessoas com essa condição. O órgão destaca que o Brasil assumiu o compromisso de erradicar qualquer discriminação contra pessoas com deficiência ao assinar a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, em 2007. As normas foram promulgadas pelo Decreto nº 6.949/2009 e têm status de diploma instituidor de direitos e garantias fundamentais.
O país deve adotar todas as medidas, inclusive legislativas, para eliminar a discriminação contra pessoas com deficiência, e considerar a realidade desse grupo na elaboração de políticas e programas, que devem ser desenhados para assegurar a proteção e a promoção dos direitos humanos das pessoas com deficiência. Para o MPF, a interpretação da Anac sobre a Resolução gera prejuízo para crianças e jovens com deficiência e configura um tratamento anti-isonômico vedado pela legislação e pela Constituição.
O MPF lembrou também que, em ações judiciais individuais, a Justiça já vem reconhecendo o direito ao desconto no valor da passagem para acompanhantes de Pnaes menores de 16 anos, em entendimento divergente do adotado pela Agência. E destacou que, ao contrário do que alega a Anac, jovens menores de 16 anos podem viajar sozinhos no Brasil. Basta, para isso, uma autorização obtida de forma simples e desburocratizada, com o preenchimento de um formulário online pelos pais ou responsáveis.
Ao determinar a revisão do posicionamento, a sentença da Justiça Federal registra que o “núcleo alvo da política pública não é a proteção segundo a faixa etária, mas a proteção de todo aquele que, em decorrência de condição específica, necessite de acompanhamento especial para viajar”. Nesse sentido, a interpretação da Anac sobre o tema desvirtua o próprio propósito normativo, “excluindo aqueles que deveriam estar usufruindo do benefício por se encontrarem nas mesmas condições dos demais passageiros com necessidade de acompanhamento especial”.