Suspenso julgamento sobre necessidade de aviso prévio para reunião pública

Pedido de vista do presidente do STF suspendeu nesta quarta-feira (19), na última sessão plenária do Ano Judiciário, o julgamento do RE 806339, com repercussão geral reconhecida. Até o momento, cinco ministros votaram pelo provimento do RE e três negaram.

Pedido de vista do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, suspendeu nesta quarta-feira (19), na última sessão plenária do Ano Judiciário, o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 806339, com repercussão geral reconhecida, no qual se discute a exigência de aviso prévio à autoridade competente como pressuposto para o legítimo exercício da liberdade de reunião, previsto no inciso XVI do artigo 5º da Constituição Federal. Até o momento, cinco ministros votaram pelo provimento do RE e três negaram.

O dispositivo constitucional estabelece que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”.

A origem do recurso foi uma marcha organizada pelo Sindicato Unificado dos Trabalhadores Petroleiros, Petroquímicos e Plásticos de Alagoas e Sergipe, a Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas), o Sindicato dos Trabalhadores em Sindicatos, Confederações, Associações, Centrais Sindicais e o Órgãos Classistas e Entidades Afins do Sergipe (Sintes) e o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) contra a transposição do Rio São Francisco na BR-101 em abril de 2008 sem prévia comunicação formal à autoridade competente.

O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) manteve a sentença que, em ação de interdito proibitório ajuizada pela União, condenou as entidades ao pagamento de multa por terem desobedecido liminar que proibia a manifestação. Segundo o acórdão do TRF-5 questionado no STF, o direito de reunião não é absoluto, sendo necessário o aviso prévio para que as autoridades avaliem se o exercício da locomoção será comprometido.

Na primeira sessão que o RE foi analisado, em abril deste ano, o relator, ministro Marco Aurélio, votou pelo desprovimento do recurso, afirmando que a reunião em local aberto ao público deve ser comunicada previamente à autoridade competente e, no caso, isso não ocorreu.

“A locomoção é um direito dos cidadãos em geral. Sem aviso e com a finalidade de haver repercussão maior, obstaculizando-se o trânsito, a reunião ocorreu, inviabilizando passagem na rodovia BR 101. O objetivo visado não foi simplesmente o de proceder-se a reunião de integrantes do segmento profissional, mas sim brecar o tráfego em rodovia de grande movimento”, apontou.

O ministro Marco Aurélio propôs a seguinte tese de repercussão geral: “O exercício do direito de reunião pacífica deve ser precedido de aviso à autoridade competente, não podendo implicar interrupção do trânsito em rodovia”. Em seguida, houve o pedido de vista por parte do ministro Alexandre de Moraes.

Votos

Na sessão desta quarta-feira, o ministro Alexandre de Moraes proferiu seu voto-vista (leia a íntegra), acompanhando o relator. A seu ver, o prévio aviso às autoridades competentes não significa restrição à liberdade de manifestação, que é um dos princípios basilares do princípio democrático, e ocorre em todos as democracias ocidentais.

“É uma exigência razoável e expressa e tem como finalidade permitir ao Poder Público a organização e realização das medidas necessárias para segurança pública, defesa da ordem, prevenção do crime, proteção da saúde, da moralidade, dos direitos e liberdades dos demais de maneira a garantir aos manifestantes o pleno exercício de seu direito de manifestação, e proteger os direitos e liberdades dos demais não participantes; preservando, dessa maneira, o bem-estar de uma sociedade democrática”, apontou.

Para o ministro, a manifestação se torna abusiva quando impede de forma absoluta o livre acesso das demais pessoais a hospitais, aeroportos e rodovias. “Nesse caso, há flagrante desrespeito à liberdade constitucional do direito de locomoção das outras pessoas”, afirmou, ressaltando que as reuniões espontâneas, que não são previamente organizadas e, portanto, não é possível o prévio aviso, são legítimas e compete ao Poder Público garantir a segurança de todos.

O ministro Luiz Fux também acompanhou o relator. Na sua avaliação, a razão do aviso prévio é fazer com que autoridades tomem medidas para facilitar a liberdade de reunião em harmonia com o desenvolvimento normal das atividades das outras pessoas e evitar perturbações na ordem social.

Divergência

O ministro Edson Fachin abriu divergência ao afastar a interpretação do TRF-5 que condiciona o aviso prévio à realização de uma manifestação, tendo como base a primazia do direito de expressão. “A inexistência de notificação não torna a reunião ilegal. Numa democracia, o espaço público não é só de circulação, mas de participação”, frisou, dando provimento ao RE e afastando a multa aplicada às entidades.

O ministro Luís Roberto Barroso seguiu a divergência entendendo que a eventual ausência de prévio aviso para o exercício do direito de reunião não transforma a manifestação em ato ilícito e que o Poder Público pode legitimamente impedir o bloqueio integral de via pública para assegurar o direito de locomoção de todos.

A ministra Rosa Weber também deu provimento ao recurso argumentando que o direito fundamental da liberdade de reunião é um dos alicerces das sociedades democráticas e quaisquer exceções ou limitações eventualmente admitidas ao seu livre exercício devem ser interpretadas restritivamente.
Outra a seguir a divergência foi a ministra Cármen Lúcia, para quem não há condicionantes para a liberdade de reunião. “ A democracia faz barulho. A liberdade de reunião é uma forma e um espaço para a liberdade de expressão. Não se pode, em nome do dever do Poder Público se organizar, anular outro direito”, salientou.

O ministro Ricardo Lewandowski também divergiu da conclusão do TRF-5 e deu provimento ao recurso, ressaltando que é legitima a intervenção do Poder Público caso haja abuso no direito de reunião.

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