República Dominicana terá seus créditos excluídos da recuperação judicial da Odebrecht

Acordo de leniência foi celebrado naquele país.

A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão proferida pelo juiz João de Oliveira Rodrigues Filho, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Capital, que julgou procedente a impugnação de crédito apresentada pela República Dominicana contra a Odebrecht S/A, que está em processo de recuperação judicial. Desta forma, o montante de US$ 124 milhões devidos pela empresa à Procuradoria Geral da República Dominicana fica excluído da relação de credores do processo e pode ser cobrado naquele país.
Consta dos autos que a empresa havia celebrado, na República Dominicana, um acordo de leniência – que é firmado entre um ente estatal e infratores da ordem econômica para coibir atos lesivos ao erário e combater a corrupção. Ocorre que o crédito resultante deste acordo foi incluído na recuperação judicial da empresa, o que o Estado Dominicano alega ser incorreto, pois o acordo de leniência celebrado é de natureza criminal e de interesse público, assim como o crédito dele resultante, de modo que decisões do Poder Judiciário brasileiro poderiam ferir sua soberania.
Segundo o relator do recurso, desembargador Alexandre Lazzarini, o Estado estrangeiro faz jus à imunidade de jurisdição, ou seja, não é obrigado a se submeter à legislação brasileira. “O fato de demandar contra pessoa nacional (jurídica ou natural) não importa em renúncia da imunidade de jurisdição para ser demandado”, esclareceu. “Assim, acertada, nesse tema, a r. decisão recorrida, destacando, inclusive, que ‘No caso dos autos, não há qualquer comprovação de registro de instrumento de protocolo de insolvência firmado entre este Juízo e o Juízo competente da República Dominicana, não há fixação do Juízo principal e nem dos auxiliares’”.
O magistrado ressaltou, ainda, que o acordo de leniência é ato de império do Estado, e não de gestão, não se enquadrando na Lei de Falências. De acordo com Alexandre Lazzarini, o direito objeto do acordo de leniência, “não sendo um negócio jurídico, vinculado ao direito obrigacional (civil, empresarial, consumidor etc.), mas de natureza especial vinculado ao direito de punir (sancionar) do Estado, não se sujeita à recuperação judicial, sob pena de violar a finalidade do acordo de leniência”.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPUGNAÇÃO DE CRÉDITO DECORRENTE DE ACORDO DE LENIÊNCIA CELEBRADO COM ESTADO ESTRANGEIRO. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. DECISÃO RECORRIDA QUE ACOLHE A IMPUGNAÇÃO FORMULADA PELO ESTADO ESTRANGEIRO E DETERMINA A EXCLUSÃO DO CRÉDITO DA RELAÇÃO DE CREDORES. AGRAVO DA RECUPERANDA NÃO PROVIDO. 1) O acordo de leniência decorre do poder de império do Estado, do poder estatal que relativiza o princípio da indisponibilidade. 2) O direito objeto do acordo de leniência não tem natureza própria de direitos pessoais (obrigacionais), pois, inclusive em patamar superior aos próprios contratos públicos, aqui o Estado não contrata uma prestação de serviços, seja como sujeito ativo ou sujeito passivo, mas dispõe, sob condição (e desde que a outra parte aceite), o seu direito de punir na forma mais rigorosa estabelecida na lei. 3) Não sendo um negócio jurídico, vinculado ao direito obrigacional (civil, empresarial, consumidor etc), mas de natureza especial vinculado ao direito de punir (sancionar) do Estado, não se sujeita à recuperação judicial, sob pena de violar a finalidade do acordo de leniência; 4) O fato de demandar contra pessoa nacional (jurídica ou natural) não importa em renúncia da imunidade de jurisdição para ser demandado. Imunidade de jurisdição confirmada. 5) Agravo de instrumento não provido.

Participaram do julgamento, que teve votação unânime, os desembargadores Azuma Nishi e Fortes Barbosa.

Agravo de Instrumento nº 2257373-73.2020.8.26.0000

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