Projeto de lei que altera regras em acordos de colaboração premiada é inconstitucional, aponta Câmara do MPF

Em nota técnica, Câmara de Combate à Corrupção do MPF afirma que proposta restringe direito à ampla defesa e viola garantias do investigado

A Câmara de Combate à Corrupção do Ministério Público Federal (5CCR/MPF) divulgou, nesta quarta-feira (12), nota técnica em que aponta inconstitucionalidades no Projeto de Lei (PL) 4.372/2016, que prevê alterações nas regras para celebração dos acordos de colaboração premiada. O PL, que tramita sob regime de urgência na Câmara dos Deputados, proíbe que os acordos sejam firmados com investigados ou acusados presos e criminaliza a divulgação do conteúdo da colaboração, antes ou depois da homologação judicial.

De acordo com as justificativas do projeto legislativo, o objetivo das mudanças é assegurar o caráter voluntário da colaboração, evitando que a prisão cautelar seja utilizada como instrumento psicológico de pressão. Além disso, ao criar um tipo penal para tipificar e punir a conduta de divulgar conteúdo dos depoimentos colhidos no âmbito de colaboração premiada, o projeto de lei pretende evitar o vazamento indevido dos acordos.

Na avaliação da 5CCR, embora pretenda reforçar o sistema de garantias do investigado, a proposta de lei em discussão vai exatamente no sentido oposto ao desejado pelo legislador. Isso porque, ao proibir a celebração do acordo de colaboração com pessoas presas, a lei restringe o direito de todo cidadão à ampla defesa e viola uma séria de garantias do investigado. Segundo a nota técnica, a proposta fere não apenas a Constituição Federal, mas diversos tratados internacionais de direito dos quais o Brasil é signatário. Já no caso de violação de sigilo da colaboração, o documento aponta que a proposta carece de melhor delimitação.

Restrição ilegal – De acordo com a Câmara do MPF, além de não servir como elemento inibidor da decretação de prisões provisórias indevidas, a vedação de acordos de colaboração para investigados presos em nada contribuirá para assegurar a voluntariedade do colaborador. Além disso, a medida restringirá significativamente a ampla defesa do investigado, violando também o princípio constitucional da isonomia e da autonomia da vontade, além de retirar da defesa um importante instrumento para a tutela dos direitos do imputado.

“O colaborador, esteja preso cautelarmente ou em liberdade, também se enquadra como acusado em um contexto delitivo que tenha participado, e, desse modo, deve ter resguardado seus direitos e garantias fundamentais, fazendo jus, por conseguinte, a previsões normativas no ordenamento que lhe sejam favoráveis, em razão da prevalência do direito. Portanto, o projeto em questão, sob o argumento de proteger o acusado, irá prejudicá-lo quando este estiver decidido a colaborador, de maneira voluntária e devidamente informada”, sintetiza a nota técnica.

Vazamento de delações – Já em relação à previsão de criminalização da divulgação do conteúdo de depoimentos colhidos no âmbito de colaboração premiada, antes ou depois da homologação judicial do acordo, a Câmara do MPF aponta que o dispositivo necessita de melhor delimitação.

A nota técnica lembra que, de acordo a Lei 12.850/2013, com redação dada pela Lei nº 13.964/2019, o “acordo de colaboração premiada e os depoimentos do colaborador serão mantidos em sigilo até o recebimento da denúncia ou da queixa-crime, sendo vedado ao magistrado decidir por sua publicidade em qualquer hipótese”. A partir deste momento, portanto, é possível que o magistrado determine o levantamento do sigilo da colaboração, seja em razão da existência de elementos de corroboração dos depoimentos, seja em razão do princípio da publicidade.

“A investigação e o processo penal, em regra, devem ser públicos. É direito da sociedade ter ciência do andamento da persecução penal, como mecanismo de controle de sua eficiência. É certo que, em determinados casos excepcionais, será possível a decretação do sigilo da investigação, seja para a defesa da intimidade ou do interesse social. No entanto, nestes casos, porém, o sigilo deverá ser o mínimo necessário”, sustenta o documento.

Íntegra da Nota Técnica

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