Por maioria de votos, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que incide contribuição previdenciária sobre o adicional de quebra de caixa, verba destinada a cobrir os riscos assumidos por empregados que lidam com manuseio constante de dinheiro, como caixas de bancos, de supermercados e agências lotéricas.
A decisão foi tomada em julgamento de embargos de divergência interpostos contra acórdão da Primeira Turma que entendeu que, em razão da natureza indenizatória da verba relativa à quebra de caixa, não haveria incidência da contribuição previdenciária.
O relator dos embargos, ministro Mauro Campbell Marques, compartilhava do mesmo entendimento, mas a maioria do colegiado acompanhou o voto divergente apresentado pelo ministro Og Fernandes, que defendeu a natureza salarial da verba.
Voto vencedor
Para Og Fernandes, por ser um pagamento habitual, feito em retribuição ao serviço prestado ao empregador, o adicional de quebra de caixa se enquadra no conceito de remuneração.
“O caráter indenizatório de determinada verba subsiste quando se presta a recompor, sob o aspecto material, um patrimônio que foi objeto de lesão, diminuindo-lhe o seu valor, notadamente em decorrência de um ato ilícito, conforme se depreende da leitura combinada dos artigos 186 e 927 do Código Civil”, disse o ministro.
Segundo Og Fernandes, a quebra de caixa não se enquadraria nessa definição porque seu pagamento “não tem finalidade indenizatória tendente a recompor o patrimônio do empregado em decorrência de uma lesão, pois o desconto autorizado na remuneração do empregado em face da diferença de caixa não se revela ilícito a exigir uma reparação de dano”.
Natureza salarial
Além disso, o ministro destacou que a quebra de caixa não consta do rol do parágrafo 9º do artigo 28 da Lei 8.212/91, ou de qualquer outra norma, que admita a sua exclusão do conceito de salário de contribuição. Ele citou ainda a Súmula 247 do Tribunal Superior do Trabalho, que estabelece que “a parcela paga aos bancários sob a denominação quebra de caixa possui natureza salarial, integrando o salário do prestador de serviços, para todos os efeitos legais”.
“O fato de o exercício da atividade submeter o empregado a determinado risco à sua remuneração não desnatura o caráter remuneratório da verba quebra de caixa. Fosse assim, não se admitiria a incidência da contribuição previdenciária patronal sobre os adicionais de insalubridade e periculosidade, uma vez que essas importâncias são decorrentes justamente da submissão do trabalhador a condições que lhe prejudicam a saúde ou a integridade física ou mental”, concluiu o ministro.
O recurso ficou assim ementado:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ARTS. 22, I, e 28, I, DA LEI N. 8.212⁄1991. VERBA DENOMINADA QUEBRA DE CAIXA. NATUREZA SALARIAL. INEXISTÊNCIA DE CARÁTER INDENIZATÓRIO. INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. POSSIBILIDADE.1. A divergência traçada nestes autos envolve a definição da natureza da verba denominada “quebra de caixa” e a consequente incidência ou não da tributação previdenciária. O acórdão embargado entendeu que a jurisprudência da Primeira Turma é firme no sentido de que a verba relativa à quebra de caixa possui natureza indenizatória e não salarial; por essa razão não haveria incidência de contribuição previdenciária. Já o acórdão paradigma afirmou que “a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que, sendo o auxílio de ‘quebra de caixa’ pago com o escopo de compensar os riscos assumidos pelo empregado que manuseia numerário, deve ser reconhecida a natureza salarial da aludida parcela e, por conseguinte, a possibilidade de incidência da contribuição previdenciária”.2. A verba “quebra de caixa” decorre de convenção coletiva e se destina àqueles empregados que exercem função de operador de caixa, auxiliar de caixa, conferente, tesoureiro, cobrador ou qualquer outra pessoa que possibilite o desconto na remuneração quando há diferença entre a quantia existente em caixa e a que efetivamente deveria existir. A contribuição previdenciária patronal, por sua vez, encontra suporte nos arts. 195, I, ‘a’, e 201, § 11, da CF⁄1988, bem como nos arts. 22, I, e 28, I, da Lei n. 8.212⁄1991.3. A análise da origem e da razão de ser da verba “quebra de caixa”, à luz da interpretação sistemática dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais supramencionados, denota que aquela quantia se amolda ao conceito de remuneração para fins de incidência da contribuição previdenciária patronal, pois se revela pagamento habitual e, embora não pareça, destina-se a retribuir o trabalho em razão da prestação do serviço ao empregador.4. O fato de a quantia ora em análise servir para “compensar” eventuais diferenças de caixas a serem descontadas da remuneração do empregado não lhe confere a natureza de verba indenizatória apta a impedir a exação tributária, pois não se presta a recompor, sob o aspecto material, um patrimônio que foi objeto de lesão, diminuindo-lhe o seu valor, notadamente em decorrência de um ato ilícito, conforme se depreende da leitura combinada dos arts. 186 e 927 do Código Civil.5. No caso dos autos, o pagamento da verba nominada “quebra de caixa” não tem finalidade indenizatória tendente a recompor o patrimônio do empregado em decorrência de uma lesão, pois o desconto autorizado na remuneração do empregado em face da diferença de caixa não se revela ilícito a exigir uma reparação de dano. É o que se depreende da leitura do art. 462, caput, e § 1º, da CLT. Assim, subsistindo dolo ou acordo (convenção coletiva) de trabalho – situação esta a dos autos –, admite-se o desconto lícito das diferenças de caixa. Precedente do TST: ARR – 2820-45.2010.5.02.0362, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Segunda Turma, DEJT 1º⁄7⁄2015.6. É certo que a lei, em algumas situações, expressamente estabelece presunções absolutas de caráter indenizatório a certas quantias. Na esfera previdenciária, cita-se o § 9º do art. 28 da Lei n. 8.212⁄1991, que, em seu bojo, afasta do conceito de remuneração determinadas importâncias – certamente boa parte delas, por lhe considerar indenizatórias –, tais como “ajudas de custo”, “a parcela in natura recebida de acordo com os programas de alimentação aprovados pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social” etc. Registre-se, no entanto, que a verba “quebra de caixa” não consta do rol de referido § 9º, ou de qualquer outra norma apta a lhe excluir do conceito de salário de contribuição.7. Esclarece-se, de outra parte, que o fato de o exercício da atividade submeter o empregado a determinado risco a sua remuneração não desnatura o caráter remuneratório da verba “quebra de caixa”. Fosse assim, não se admitiria a incidência da contribuição previdenciária patronal sobre os adicionais de insalubridade e periculosidade, uma vez que essas importâncias são decorrentes justamente da submissão do trabalhador a condições que lhe prejudicam a saúde ou a integridade física ou mental.8. A Justiça Trabalhista, cuja competência jurisdicional compreende também a execução, de ofício, das contribuições previdenciárias patronais (CF, art. 114, VIII), firmou, nos termos da Súmula 247 do TST, a seguinte compreensão: “A parcela paga aos bancários sob a denominação ‘quebra de caixa’ possui natureza salarial, integrando o salário do prestador de serviços, para todos os efeitos legais”.9. Embargos de divergência providos para declarar a possibilidade de incidência da contribuição previdenciária por ocasião do pagamento da verba denominada “quebra de caixa”.