Pendência de ação possessória é condição suspensiva para ajuizamento de ação demarcatória

Nos casos em que há disputa pela posse de terra, a pendência de julgamento do processo é condição suspensiva para o ajuizamento de ação demarcatória. Os ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmaram o entendimento ao analisar recurso especial que questionou a necessidade de se extinguir o feito demarcatório em trâmite.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, a ação demarcatória, inegavelmente, tutela o domínio, diferenciando-se da ação reivindicatória, em verdade, quanto à individualização da coisa.

Além disso, a relatora concluiu que “diante da natureza petitória da ação demarcatória, inviável o seu ajuizamento enquanto pende de julgamento ação possessória, nos termos do que preceituado no artigo 923 do Código de Processo Civil de 1973”.

Como no caso, contudo, a disputa acerca da posse da terra foi solucionada, a ministra entendeu que a ação demarcatória deveria prosseguir, entendimento que foi seguido à unanimidade pela turma julgadora. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) havia extinguido a ação demarcatória, diante da impossibilidade jurídica do pedido. Na época, não havia julgamento de mérito sobre a posse das terras.

No STJ, o recurso foi parcialmente provido para que o tribunal de origem analise o mérito da ação demarcatória. Para o colegiado, a conclusão do TJMT acerca da impossibilidade jurídica do pedido foi correta – apesar de não aplicável à hipótese dos autos por ter havido julgamento da possessória –, já que a ação demarcatória se diferencia da reivindicatória quanto à individualização da coisa disputada.

Segundo a relatora, a regra do artigo 923 do CPC/73, aplicável ao caso, prevê apenas uma condição suspensiva para o ajuizamento da ação e, portanto, “não há qualquer razão que, neste momento, justifique a sua extinção”, tornando inócua a discussão acerca da aplicabilidade do artigo.

O recurso ficou assim ementado:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DEMARCATÓRIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO INDICAÇÃO. SÚMULA 284⁄STF. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211⁄STJ. IMPOSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO DEMARCATÓRIA NA PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DE AÇÃO POSSESSÓRIA. ART. 923 DO CPC⁄73. AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO DEFINITIVAMENTE JULGADA. AUSÊNCIA DE PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DE AÇÃO POSSESSÓRIA. PROSSEGUIMENTO NO JULGAMENTO DA AÇÃO DEMARCATÓRIA.
1. Ação ajuizada em 27⁄08⁄2010. Recurso especial atribuído ao gabinete em 13⁄03⁄2017. Julgamento: CPC⁄2015.
2. O propósito recursal é determinar se a presente ação demarcatória cumulada com queixa de esbulho, ajuizada pelos recorrentes, deve ser julgada extinta, sem resolução do mérito, em razão da pendência de ação possessória envolvendo o mesmo imóvel.
3. A ausência de expressa indicação de obscuridade, omissão ou contradição nas razões recursais enseja o não conhecimento do recurso especial. Aplica-se, neste caso, a Súmula 284⁄STF.
4. A ausência de decisão acerca dos argumentos invocados pelo agravante em suas razões recursais, não obstante a oposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial.
5. Nos termos do art. 923 do CPC⁄73, na pendência do processo possessório, é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar a ação de reconhecimento de domínio.
6. A proibição do ajuizamento de ação petitória enquanto pendente ação possessória, em verdade, não limita o exercício dos direitos constitucionais de propriedade e de ação, mas vem ao propósito da garantia constitucional e legal de que a propriedade deve cumprir a sua função social, representando uma mera condição suspensiva do exercício do direito de ação fundada na propriedade.
7. A ação demarcatória é instrumento processual posto à disposição tão somente do proprietário, com o propósito de tutelar o seu direito de estabelecer os limites de sua propriedade, com a demarcação ou delimitação compulsória da área, o avivamento de rumos apagados ou a renovação de marcos destruídos ou arruinados entre o prédio do autor e os prédios dos proprietários das áreas confinantes, em razão da existência de confusão de limites territoriais entre os imóveis.
8. A ação demarcatória não se confunde com a reivindicatória, pois por meio desta discute-se o domínio de imóvel certo, perfeitamente identificado e que não sofre debates em torno de suas linhas divisórias, enquanto que, por intermédio daquela, objetiva-se definir quais os limites territoriais entre prédios que, embora possam estar formalmente descritos no título aquisitivo, em termos materiais ensejam discussão quanto à exata localização de suas fronteiras.
9. A ação demarcatória não objetiva somente a declaração de reconhecimento de domínio, uma vez que vem necessariamente atrelada à pretensão de demarcação da área controversa. Contudo, diante da natureza petitória da ação demarcatória, inviável o seu ajuizamento enquanto pendente de julgamento ação possessória, nos termos do que preceituado no art. 923 do CPC⁄73.
10. Conquanto se tenha concluído pela impossibilidade do ajuizamento da ação demarcatória enquanto pendente de julgamento ação possessória, verifica-se que, na hipótese, não se mostra mais útil a discussão acerca da aplicabilidade do art. 923 do CPC⁄73.
11. Não estando mais pendente o julgamento de ação possessória, e tendo-se ainda em mente que o art. 923 do CPC⁄73 prevê apenas uma condição suspensiva para o ajuizamento da ação demarcatória, não há qualquer razão que, neste momento, justifique a sua extinção.
12. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1655582

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