Além da indenização, foi mantida a tutela inibitória, para coibir a reiteração da prática.
A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Cibracal – Indústria Brasileira de Cal Ltda., do Paraná, ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, por irregularidades na concessão dos intervalos intrajornada (para descanso e alimentação) e interjornada (entre dois turnos de trabalho). A empresa também descumpria reiteradamente a jornada extraordinária máxima prevista na legislação trabalhista.
Mineração de calcário
O Ministério Público do Trabalho (MPT) apontou as irregularidades em ação civil pública e pediu as tutelas inibitórias para determinar que a empresa cumprisse as obrigações relativas à jornada e aos intervalos aos trabalhadores, além da condenação ao pagamento de indenização por dano moral coletivo.
As irregularidades foram identificadas quando o MPT averiguava as condições ambientais de trabalho nas empresas que atuam na mineração de calcário no Paraná. No caso da Cibracal, a jornada dos empregados se estendia por mais de 11 horas diárias e, num caso extremo, chegou a 13 horas.
Intervalos
O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) condenou a mineradora a se abster de exigir jornada suplementar além do limite de duas horas previsto no artigo 59 da CLT, inclusive com fixação de multa no valor de um mil reais por dia. Rejeitou, no entanto, o pedido de indenização.
Para o TRT, a prestação de mais de duas horas extras diárias não configura, por si só, violação a direitos metaindividuais, e o dano moral coletivo só se configura quando a agressão é dirigida “ao grupo, à categoria”.
Controle ético
O relator do recurso de revista do MPT, ministro Cláudio Brandão, salientou que, no caso de desrespeito a valores de interesse de toda a coletividade, a responsabilidade civil perde a feição individualista e assume a função social hábil a promover o controle ético das condutas praticadas. No caso, a seu ver, a coletividade está representada pelos empregados da mineradora, cujos direitos não estão sendo inteiramente assegurados, diante do descumprimento da legislação trabalhista concernente a normas de saúde e segurança do trabalho.
Lei para todos
Considerando a gravidade da infração e os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, além do caráter pedagógico da medida, o relator fixou o valor da indenização em R$ 50 mil, a ser revertida ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) ou a outra entidade que atue na tutela de interesses dos trabalhadores, a ser indicada pelo MPT. “Some-se a isso a finalidade de revelar à própria sociedade que a lei é feita para todos e por todos e deve ser cumprida, o que pode servir de estímulo para moldar o comportamento de qualquer um frente ao sistema jurídico”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RÉU. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURIDICIONAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO EFETIVO PREQUESTIONAMENTO. REQUISITO PREVISTO NO ARTIGO 896, § 1º-A, I, DA CLT. Em virtude da natureza especial do recurso de revista, decorre a necessidade de observância de requisitos próprios de admissibilidade, entre os quais o disposto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, introduzido pela Lei nº 13.015/2014, que disciplina ser ônus da parte a indicação do trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do apelo. Transpondo tal exigência para os casos em que se busca o reconhecimento da negativa de prestação jurisdicional, a parte deverá demonstrar, de forma inequívoca, que provocou a Corte de origem, mediante a oposição de embargos declaratórios, no que se refere à matéria desprovida de fundamentação. Necessário, portanto, transcrever o trecho pertinente da petição de embargos e do acórdão prolatado no seu julgamento, para possibilitar o cotejo entre ambos. Inexistindo a delimitação dos pontos sobre os quais o Tribunal Regional, supostamente, teria deixado de se manifestar, torna-se inviável a análise da nulidade. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA PREVENTIVA-INIBITÓRIA. EFEITOS AD FUTURUM. REQUISITOS. OBRIGAÇÃO DE CONCEDER REGULARMENTE OS INTERVALOS INTER E INTRAJORNADA. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada divergência jurisprudencial.
DANOS MORAIS COLETIVOS. CARACTERIZAÇÃO. REITERADO DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível afronta ao artigo 5º, V, da Constituição Federal.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA INIBITÓRIA. ASTREINTES. VALOR. O Tribunal Regional, ao fixar as astreintes no importe de R$ 1.000,00, observou corretamente o disposto na legislação regente da matéria (artigos 536, § 1º, do CPC, 85, § 5º, do CDC e 11 da Lei nº 7.347/85), sendo as condições adequadas e razoáveis ao cumprimento da obrigação imposta. É de se ressaltar que, consoante disposto no § 1º do artigo 537 do CPC: “O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I – se tornou insuficiente ou excessiva; II – o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.”. Não constatadas as violações apontadas. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA PREVENTIVA-INIBITÓRIA. EFEITOS AD FUTURUM. REQUISITOS. OBRIGAÇÃO DE CONCEDER REGULARMENTE OS INTERVALOS INTERJORNADAS E INTRAJORNADA. Constitui função institucional do Ministério Público do Trabalho a proteção da ordem jurídica e a defesa de direitos difusos ou coletivos, e ainda os individuais homogêneos, podendo, para tanto, utilizar-se de todos os meios judiciais disponíveis, dentre estes o ajuizamento de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85), para a qual se admite, inclusive, o pedido de tutela inibitória preventiva. Tal medida jurisdicional possui prospecção futura e objetiva evitar a prática, a repetição, ou mesmo a continuidade de ato ilícito (ou antijurídico), mediante tutela específica, consistente em obrigação de fazer, ou de não fazer, capaz de assegurar resultado prático, a fim de evitar o dano, em juízo de probabilidade. Não é necessária, portanto, a imediata comprovação do dano; basta a mera probabilidade de ato contrário ao direito a ser tutelado, cuja constatação sequer depende da violação prévia de alguma norma, conforme, inclusive, já estatuiu a SBDI-1 desta Corte. Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional indeferiu as pretensões de que a empresa fosse compelida a conceder corretamente os intervalos interjornadas e intrajornada, por entender que o descumprimento esporádico da legislação regente das matérias não ensejaria tais condenações. Sucede que, como afirmado, o entendimento desta Corte Superior é no sentido de que não se exige a prática reiterada de descumprimento de normas, ou mesmo a ocorrência de violação destas, para concessão da tutela inibitória preventiva. No caso, além de ter havido registro de irregularidades esporádicas na concessão dos mencionados intervalos, constou que houve descumprimento reiterado da jornada extraordinária máxima prevista no artigo 59 da CLT. Tais fatos, analisados como um todo, são suficientes para formação do juízo de probabilidade de ocorrência de danos futuros com relação a todos os temas suscitados, o que autoriza a concessão das tutelas requeridas. Recurso de revista conhecido e provido.
DANOS MORAIS COLETIVOS. CARACTERIZAÇÃO. REITERADO DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. Desrespeitados valores de interesse de toda a coletividade, a responsabilidade civil perde a sua feição individualista e assume função social hábil a promover o controle ético das condutas praticadas. Na presente hipótese, a coletividade encontra-se representada pelo grupo de empregados da empresa, cujos direitos não estão sendo inteiramente assegurados, na medida em que constatado o descumprimento da legislação trabalhista concernente às normas de saúde e segurança laborais. O interesse a ser tutelado consiste na coibição de a empresa permanecer com comportamento renitente em se escusar a cumprir a legislação trabalhista, que lhe impõe a obrigação de respeitar o limite máximo de 2 horas diárias na exigência de prestação de horas extraordinárias, conforme previsto no artigo 59 da CLT. Desse modo, merece reforma a decisão recorrida, para condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais coletivos. Recurso de revista conhecido provido.
Processo: RR-371-97.2016.5.09.0657