Na sessão desta quinta-feira (17), o ministro Edson Fachin (relator) votou pela constitucionalidade da requisição de dados das operadoras telefônicas pelo MP e por delegados sem autorização judicial, e o ministro Marco Aurélio divergiu.
Na sessão desta quinta-feira (17), os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), proferiram seus votos no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5642, em que se discute a constitucionalidade do repasse de dados cadastrais, por operadoras de celular, a delegados de polícia e membros do Ministério Público, independentemente de autorização judicial, em investigações sobre tráfico de pessoas. Pedido de vista do ministro Nunes Marques suspendeu o julgamento.
O relator, ministro Fachin, não vê conflito da previsão contida na Lei 13.344/2016 (que reprime o tráfico de pessoas) com os direitos constitucionais à privacidade e ao sigilo das comunicações. Já para o decano do STF, que antecipou seu voto, o texto constitucional é expresso e categórico a exigir autorização judicial para o afastamento da privacidade.
Esvaziamento
Na ação, a Associação Nacional das Operadoras Celulares (Acel) sustenta que os artigos 13-A e 13-B do Código de Processo Penal (CPP), inseridos pela Lei 13.344/2016, esvaziam a proteção constitucional à privacidade e ao sigilo das comunicações. Segundo a entidade, da forma em que foi redigida, a norma confere “verdadeira carta em branco” para que as autoridades possam acessar todos os dados de cidadãos tidos como suspeitos.
Proteção constitucional
Em seu voto, o ministro Edson Fachin disse que a Constituição assegura a todos a inviolabilidade do sigilo de correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e telefônicas, exceto mediante ordem judicial e nas hipóteses em que a lei permitir, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Assim, o direito à proteção da privacidade não é absoluto, mas qualificado, pois a lei pode restringi-lo.
Jurisprudência
O ministro argumentou que, de acordo com precedentes do Supremo, os dados cadastrais de posse das empresas de telefonia, assim como as informações de registros públicos, também podem ser requisitados, sem que se caracterize ofensa ao direito à privacidade. Conforme julgados recentes do Tribunal (ADI 5527 e ADPF 403), a proteção a que se refere o artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, é da comunicação de dados e não dos dados em si mesmos.
A própria legislação, disse Fachin, passou a afastar a expectativa de privacidade que esses dados cadastrais teriam quando dispôs sobre a obrigatoriedade de seu fornecimento, por exemplo, por meio da Lei Complementar 105/2001, que permite o acesso às informações bancárias pela autoridade fazendária. No mesmo sentido, também não têm expectativa de privacidade, por expressa disposição legal, os provedores de acesso à internet, entendidos esses dados como sendo a qualificação pessoal, a filiação e o endereço.
Dados cadastrais
Segundo o relator, essa orientação sobre o sentido da expressão “dados cadastrais” foi levada em conta pelo Poder Legislativo nas alterações da lei processual penal. Na sua avaliação, em relação aos delitos indicados no caput do artigo 13-A do Código de Processo Penal, não há dúvida interpretativa sobre o alcance da expressão: nela não estão abrangidas a interceptação de voz e telemática, os dados cadastrais de usuários de IP, os serviços de agenda virtual ofertados por empresas de telefonia, o dado cadastral de e-mail e os extratos de conexão com a internet. Para esses dados, frisou o ministro Fachin, permanece a necessidade de autorização judicial.
A seu ver, continuam sendo passíveis de requisição, sem controle judicial prévio, a localização de terminal ou IMEI em tempo real por período determinado, e desde que necessário para reprimir os crimes contra a liberdade pessoal descritos no art. 13-A do CPP, os dados cadastrais dos terminais fixos não figurantes em lista telefônica divulgável e de terminais móveis, o extrato de chamadas telefônicas e de mensagens de texto e os sinais para localização de vítimas ou suspeitos, após o prazo de 12 horas.
Repressão a crimes
Fachin assinalou, ainda, que a norma não confere amplo poder de requisição, mas um poder necessário para reprimir as violações de crimes graves contra a liberdade pessoal, visando permitir o resgate das vítimas enquanto eles ainda estão em curso. “Não deve haver expectativa de privacidade para quem está em situação de flagrante delito de crime grave com vítimas submetidas à restrição de liberdade”, disse.
Autorização específica
Para o ministro Marco Aurélio, a Constituição Federal, ao prever a privacidade, não fez qualquer especificação acerca de quais dados seriam protegidos. Além disso, para ele, o texto constitucional é expresso e categórico ao exigir autorização judicial para o afastamento da privacidade. Dessa forma, declarou a inconstitucionalidade do artigo 13-A do CPP.
A respeito da previsão contida no artigo 13-B da norma, o ministro votou para conferir interpretação conforme a Constituição à expressão “mediante autorização judicial”, para garantir que a autorização seja específica, ligada a um caso concreto, e não genérica.
Leia mais:
Processo relacionado: ADI 5642
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