Informativo de jurisprudência 811- STJ

PRIMEIRA TURMA

Processo

 

AgInt no AREsp 2.220.880-RS, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 26/2/2024, DJe 29/2/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Penhora on-line. Sistema bacenjud. Valores inferiores a 40 salários mínimos. Impenhorabilidade presumida. Possibilidade de reconhecimento de ofício pelo juiz.

Destaque

 

Constatado que a parte executada não possui saldo suficiente, cabe ao juiz, independentemente da manifestação da interessada, indeferir o bloqueio de ativos financeiros ou determinar a liberação dos valores constritos.

Informações do Inteiro Teor

 

A controvérsia dos autos cinge-se à (i)legitimidade do reconhecimento, de plano, da impenhorabilidade prevista no art. 833, X, do Código de Processo Civil.

 

Nos termos do art. 833, X, do Código de Processo Civil, bem como da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, são impenhoráveis valores inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos depositados em aplicações financeiras, de modo que, constatado que a parte executada não possui saldo suficiente, cabe ao juiz, independentemente da manifestação da parte interessada, indeferir o bloqueio de ativos financeiros ou determinar a liberação dos valores constritos, isso porque, além de as matérias de ordem públicas serem cognoscíveis de ofício, a impenhorabilidade em questão é presumida, cabendo ao credor a demonstração de eventual abuso, má-fé ou fraude do devedor.

 

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou nos seguintes termos: “a impenhorabilidade constitui matéria de ordem pública, cognoscível de ofício pelo juiz, não havendo falar em nulidade da decisão que, de plano, determina o desbloqueio da quantia ilegalmente penhorada.” (AgInt no AREsp 2.151.910/RS, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 19/09/2022, DJe de 22/09/2022).

 

Informações Adicionais

Legislação

 

Código de Processo Civil, art. 833, X

Processo

 

AgInt no AREsp 1.846.725-PI, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 8/4/2024, DJe 18/4/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO TRIBUTÁRIO

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Simples nacional. Base de cálculo. Receita bruta. Gorjeta. Natureza salarial. Exclusão.

Destaque

 

O valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária.

Informações do Inteiro Teor

 

Na origem, o feito decorre de mandado segurança em que se busca o reconhecimento do direito líquido e certo da contribuinte impetrante de que as gorjetas e o couvert artístico não sejam considerados receita bruta para fins de tributação sob o regime do Simples Nacional, ou seja, discute-se a possibilidade de inclusão da gorjeta no conceito de receita bruta, base de cálculo do Simples Nacional.

 

De acordo com o art. 18, § 3º, da Lei Complementar n. 123/2006, a tributação unificada “Simples Nacional” tem como base de cálculo a receita bruta da microempresa ou empresa de pequeno porte optante (“Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário”).

 

Já o art. 3º, § 1º, dessa norma traz o conceito de receita bruta e dispõe que se considera “receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos”.

 

Nesse diapasão, esta Corte Superior adotou o entendimento de que o valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária. Nesse sentido: AgInt no REsp n. 1.668.117/PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 21/2/2022, DJe de 24/2/2022 e AREsp n. 1.604.057/PE, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 4/2/2020, DJe de 12/5/2020.

 

Dessa forma, considerando o conceito de receita bruta explicitado na Lei Complementar n. 123/2006, não se vislumbra nenhuma possibilidade de considerar a gorjeta como produto de venda, preço de serviço prestado ou resultado nas operações em conta alheia, pois, de acordo com o entendimento do STJ, a gorjeta tem natureza salarial, ou seja, compõe o salário do empregado. Assim, a referida verba não deve integrar a receita bruta para fins de cálculo do Simples Nacional.

 

Informações Adicionais

Legislação

 

Lei Complementar n. 123/2006, arts. 3º, § 1º, 18, § 3º

SEGUNDA TURMA

Processo

 

AgInt no AREsp 2.360.631-RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 8/4/2024, DJe 2/5/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO CIVIL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Impenhorabilidade. Bem de família. Imóvel de propriedade de pessoa Jurídica. Núcleo familiar. Conceito de bem de família. Fins sociais da lei. Genitora que detém a posse do imóvel por lá residir. Flexibilização.

Destaque

 

A confusão entre a moradia de entidade familiar com o local de funcionamento de empresa não constitui requisito para o reconhecimento da proteção de imóvel como bem de família.

Informações do Inteiro Teor

 

Trata-se, na origem, de embargos de terceiro que visam resguardar, de futura penhora, o bem cuja titularidade fora transferido para a propriedade de sociedade empresária e tenha se tornado indisponível por força de liminar deferida nos autos considerando que a interessada afirma não possuir qualquer outro imóvel, mas apenas deter a posse do imóvel e por lá residir.

 

Por sentença, os pedidos veiculados nos embargos de terceiro foram julgados improcedentes, sob o fundamento de que o bem objeto da lide foi integralizado à pessoa jurídica familiar de grande porte, porém nenhuma parte do imóvel seria utilizada para qualquer atividade empresarial, e, portanto, não poderia aproveitar a “elástica jurisprudência” relacionada a impenhorabilidade.

 

A Lei n. 8.009/1990, por outro lado, é clara no sentido de que a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza; e de que o imóvel residencial próprio é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nessa lei.

 

Embora a referida Lei determine que a impenhorabilidade recaia sobre o imóvel de propriedade dos membros da família que nele residam, o STJ já decidiu que essa proteção legal também pode ser aplicada a imóveis pertencentes a pessoas jurídicas, desde que sirvam de residência dos sócios, conforme o disposto no REsp n. 1935563/SP.

 

Nesse sentido, a Lei, estabelecida em razão da proteção à dignidade da pessoa humana, é norma cogente, que contém princípio de ordem pública, não se admitindo, assim, interpretações extensivas às exceções à garantia legal da impenhorabilidade. Assim, a simples comprovação de que o imóvel constitui moradia é suficiente para lhe conferir a proteção legal. A confusão entre a moradia da entidade familiar com o local de funcionamento da empresa, portanto, não constitui requisito para o reconhecimento da proteção do imóvel.

 

Dessa forma, deve-se entender como possível a interposição de embargos de terceiro visando à declaração de impenhorabilidade de imóvel pertencente a empresa envolvida em processo fiscal, por ser o imóvel a residência da genitora dos sócios envolvidos e em nada interferir na decretação de indisponibilidade de ação cautelar.

Informações Adicionais

Legislação

 

Lei n. 8.009/1990

Processo

 

AgInt no AREsp 2.441.809-RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 8/4/2024, DJe 2/5/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Justiça gratuita. Imposto de Renda. Isenção.

Destaque

 

O enquadramento na faixa de isenção de imposto de renda não deve ser utilizado como critério para o deferimento do benefício da assistência judiciária gratuita.

Informações do Inteiro Teor

 

Trata-se de agravo interno em que o agravante, dentre outras alegações, defende a desnecessidade de recolhimento do preparo em recurso especial com base no fato de comprovar, nos autos, rendimentos anuais que estão na faixa de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física, o que levaria à aplicação dos arts. 98 c/c 99, §1º, §2º, §3º,§5º, e §7º, todos do CPC.

 

No entanto, cumpre esclarecer que o STJ também vem rejeitando a adoção do critério de enquadramento na faixa de isenção de imposto de renda como critério para o deferimento do benefício da assistência judiciária gratuita.

 

Ademais, eventual deferimento de tal pedido após a interposição do recurso especial não teria efeito retroativo, não isentando a parte do recolhimento do respectivo preparo quando da interposição do apelo. Isto é, ainda que o pedido de justiça gratuita formulado no reclamo fosse deferido, o deferimento não teria o condão de afastar a deserção do recurso, o qual continuaria não sendo conhecido.

 

A propósito: “(…) O benefício da gratuidade judiciária não tem efeito retroativo, de modo que a sua concessão posterior à interposição do recurso não tem o condão de isentar a parte do recolhimento do respectivo preparo. Desse modo, nem mesmo eventual deferimento da benesse nesta fase processual, descaracterizaria a deserção do recurso especial.” (AgInt no AREsp n. 2.380.943/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 16/10/2023, DJe de 18/10/2023).

Informações Adicionais

Legislação

 

Código de Processo Civil (CPC), arts. 98, 99, §§ 1º, 2º, 3º, 5º e 7º

TERCEIRA TURMA

Processo

 

REsp 2.108.182-MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 16/4/2024, DJe 19/4/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO CIVIL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Ação de indenização por danos morais. Responsabilidade civil. Competição automobilística. Acidente envolvendo piloto. Omissão de socorro. Ausência de envio de ambulância e equipe médica presentes no local. Falta com dever de cuidado. Negligência. Dano moral. Configuração. Teoria da perda de uma chance. Aplicabilidade.

Destaque

 

De acordo com a teoria da perda de uma chance, há responsabilidade civil de empresa organizadora de competição automobilística que deixa de prestar socorro a piloto que falece por afogamento após acidente durante o percurso.

Informações do Inteiro Teor

 

Cinge-se a controvérsia a definir se há responsabilidade civil de empresa organizadora de competição automobilística que deixa de prestar socorro a piloto que falece, por afogamento, em razão de capotamento e queda de automóvel em rio durante o percurso.

 

A organizadora de competição automobilística, que dispõe de ambulâncias com equipe médica e deixa de enviá-las para socorrer piloto participante que sofreu acidente durante o percurso, pratica ato ilícito pela falta do dever de cuidado esperado, resultando em dano moral, ao frustrar a legítima expectativa de assistência e causar profundo sofrimento e desamparo.

 

De acordo com a teoria da perda de uma chance, a expectativa ou a chance de alcançar um resultado ou de evitar um prejuízo é um bem que merece proteção jurídica e deve, por isso, ser indenizado. Assim, a simples privação indevida da chance de cura ou sobrevivência é passível de ser reparada.

 

O nexo causal que autoriza a responsabilidade pela aplicação da teoria da perda de uma chance é aquele entre a conduta omissiva ou comissiva do agente e a chance perdida, sendo desnecessário que esse nexo se estabeleça diretamente com o dano final.

 

Hipótese em que existia chance séria e concreta de que a recorrida, se tivesse enviado a ambulância ao local do acidente de forma imediata, teria conseguido promover o resgate em menor tempo e prestar assistência médica, aumentando significativamente as chances de sobrevida do piloto (marido da recorrente).

Processo

 

REsp 2.119.389-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 26/4/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Desistência do recurso. Gratuidade da justiça. Preparo recursal. Cobrança. Medida sanatória. Dívida ativa. Deserção.

Destaque

 

Não é possível exigir o recolhimento do preparo recursal após a desistência de recurso que verse sobre a concessão da gratuidade da justiça, sob pena de inscrição em dívida ativa.

Informações do Inteiro Teor

 

Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento. Mantendo-se inerte, o recurso não será conhecido em virtude da deserção.

 

Por seu turno, a decisão que reconhece o pedido de desistência tem natureza declaratória. A partir do momento em que a desistência é informada no processo, o recurso passa a não mais existir. Com isso, a desistência de recurso que estava dispensado do pagamento do preparo pelo art. 99, §7º do CPC, torna-o inexistente no mundo jurídico, antes mesmo de ser analisada a gratuidade da justiça. Assim, não há fato gerador que justifique a cobrança do recolhimento do preparo.

 

Nos termos do art. 1.007 do CPC, não há previsão legal de outra medida sancionatória além da deserção à parte que negligencia o recolhimento do preparo recursal, seja quanto ao valor, seja quanto ao prazo. Apesar da natureza de taxa do preparo recursal, inexiste fundamento legal para a cobrança de seu recolhimento sob pena de inscrição de dívida ativa, notadamente nas hipóteses em que houve desistência de recurso que foi dispensado do preparo em razão do benefício previsto no art. 99, §7º do CPC.

Informações Adicionais

Legislação

 

Código de Processo Civil (CPC/2015), arts. 99, §7º e 1.007

QUARTA TURMA

Processo

 

REsp 2.123.047-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 30/4/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Abuso sexual infantil. Ação de indenização por danos materiais e morais. Prescrição. Termo inicial. Teoria subjetiva da actio nata. Aplicação.

Destaque

 

O termo inicial da prescrição nos casos de abuso sexual durante a infância e adolescência não pode ser automaticamente vinculado à maioridade civil, sendo essencial analisar o momento em que a vítima tomou plena ciência dos danos em sua vida, aplicando-se a teoria subjetiva da actio nata.

Informações do Inteiro Teor

 

Na origem, foi ajuizada ação de indenização por danos materiais e morais em decorrência de abuso sexual sofrido na infância. O Tribunal a quo manteve a prescrição reconhecida na sentença, pois já havia transcorrido muito mais que os três anos do prazo prescricional. Ademais, consignou que o prazo “tem a fluência a partir da maioridade, e não, do início do tratamento psicológico, eis que já tinha discernimento suficiente para mensurar a gravidade dos fatos ocorridos e o livre arbítrio para procurar os meios legais para responsabilização do réu”.

 

Portanto, a controvérsia diz respeito ao termo inicial da prescrição no caso de abuso sexual cometido contra menor de idade, em que o resultado lesivo do crime foi efetivamente constatado pela vítima apenas muitos anos após a cessação dos atos libidinosos.

 

O abuso sexual contra menores de idade é problema grave e alarmante, que traz consequências devastadoras para as vítimas e suas famílias. Embora seja tema sensível, é fundamental discuti-lo para ampliar a conscientização e promover medidas eficazes de prevenção e combate.

 

O abuso sexual ocasiona danos permanentes, deixando cicatrizes emocionais, cognitivas e comportamentais que podem perdurar ao longo da vida da vítima. Por sua vez, esses danos podem se manifestar de maneira mais perceptível em determinadas épocas da vida da pessoa, muitas vezes em resposta a acontecimentos específicos. Por exemplo, uma pessoa que tenha sido vítima de abuso sexual na infância pode experimentar o ressurgimento significativo dos traumas durante a gravidez, o nascimento de um filho, ou ao entrar em relacionamento íntimo. Esses eventos podem desencadear lembranças dolorosas e uma série de reações emocionais e psicológicas, como ansiedade, depressão ou baixa autoestima.

 

Logo, embora os danos do abuso sexual sejam intrinsecamente permanentes, sua manifestação pode variar ao longo do tempo e em resposta a diferentes eventos ou estágios da vida da vítima. Muitas vezes, as vítimas enfrentam dificuldades para lidar com as consequências emocionais e psicológicas do abuso e podem levar anos, ou mesmo décadas, para reconhecer e processar plenamente o trauma que sofreram.

 

Por conseguinte, é desarrazoado exigir da vítima de abuso sexual a imediata atuação no exíguo prazo prescricional de três anos após atingir a maioridade civil (art. 206, § 3º, V, do CC/2002). Em razão da complexidade do trauma causado pelo abuso sexual infantil, é plenamente possível que, aos 21 anos de idade, ela ainda não tenha total consciência do dano sofrido nem das consequências desse fato ao longo de sua vida.

 

Sob outro ângulo, é crucial considerar a possibilidade de a vítima, aos 21 anos, ainda manter contato direto com o agressor, que, na maior parte das vezes, é membro da família, como o pai, o padrasto ou parente próximo. Essa situação pode adicionar uma camada significativa de complexidade e dificuldade para reconhecer e lidar com o abuso sofrido.

 

Em regra, esta Corte Superior adota para o cômputo da prescrição a teoria objetiva da actio nata, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem (art. 189 do CC/2002). Contudo, em situações peculiares, nas quais a vítima não detém plena consciência do dano nem de sua extensão, a jurisprudência do STJ tem adotado a teoria subjetiva da actio nata, elegendo a data da ciência como termo inicial da prescrição.

 

A teoria subjetiva da actio nata é especialmente relevante no contexto de abuso sexual infantil, em que o ofendido pode não ter plena consciência do dano sofrido até décadas após o ocorrido, quando o trauma começa a se manifestar de forma mais evidente. Nessa situação, a teoria subjetiva da actio nata permite que o prazo de prescrição inicie a partir do momento em que a vítima efetivamente tenha conhecimento dos efeitos decorrentes do abuso sexual, permitindo que busque a reparação legal.

 

Portanto, considerando a gravidade do crime, a complexidade do dano causado e suas repercussões, com impacto permanente na vida tanto da vítima quanto de seus familiares, e o relevante bem jurídico tutelado – a integridade física, moral e psicológica -, é imperativo reconhecer que, nos casos de abuso sexual durante a infância e adolescência, o início do prazo prescricional não pode ser automaticamente vinculado à maioridade civil. Em vez disso, é essencial analisar o momento em que a vítima tomou plena ciência dos danos em sua vida, aplicando-se assim a teoria subjetiva da actio nata.

 

Dessa forma, é imprescindível conceder à vítima a oportunidade de comprovar o momento em que constatou os transtornos decorrentes do abuso sexual, a fim de estabelecer o termo inicial de contagem do prazo prescricional para a reparação civil.

Informações Adicionais

Legislação

 

Código Civil (CC), art. 189 e art. 206, § 3º, V

Processo

 

REsp 2.087.485-RS, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 2/5/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Alienação fiduciária. Busca e apreensão de bem. Notificação extrajudicial do devedor fiduciante. Correio eletrônico. E-mail. Possibilidade. Comprovação de recebimento. Necessidade.

Destaque

 

É suficiente a notificação extrajudicial do devedor fiduciante por e-mail, desde que seja encaminhada ao endereço eletrônico indicado no contrato de alienação fiduciária e comprovado seu efetivo recebimento.

Informações do Inteiro Teor

 

O art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969 estabelece ser a carta registrada com aviso de recebimento uma das formas de notificação extrajudicial do devedor. Por sua vez, esta Corte firmou o entendimento, em recurso especial repetitivo, de que, “em ação de busca e apreensão fundada em contratos garantidos com alienação fiduciária (art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969), para a comprovação da mora, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros” (REsp 1.951.662/RS, relator Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Seção, DJe 20/10/2023).

 

Isso significa que deverá ser considerada suficiente a notificação extrajudicial do devedor fiduciante encaminhada ao endereço indicado no contrato, com prova de seu recebimento, independentemente de quem tenha assinado o AR.

 

A par desses dois requisitos – notificação enviada para o endereço do contrato e comprovação de sua entrega efetiva -, é viável explorar outros possíveis meios de notificação extrajudicial que possam legitimamente demonstrar, perante o Poder Judiciário, o cumprimento da obrigação legal para o ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem.

 

Sob esse aspecto, é possível, por interpretação analógica do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969, considerar suficiente a notificação extrajudicial do devedor fiduciante por correio eletrônico, desde que seja encaminhada ao endereço eletrônico indicado no contrato e, principalmente, seja comprovado seu recebimento, independentemente de quem a tenha recebido.

 

Não é razoável exigir, a cada inovação tecnológica que facilite a comunicação e as notificações para fins empresariais, a necessidade de uma regulamentação normativa no Brasil para sua utilização como prova judicial, sob pena de subutilização da tecnologia desenvolvida.

 

Além disso, a aceitação, pelo Poder Judiciário, de métodos de comprovação de entrega de mensagens eletrônicas pode ser embasada na análise de sua eficácia e confiabilidade, como ocorre com qualquer prova documental, independentemente de certificações formais. Se a parte apresentar evidências sólidas e verificáveis que atestem a entrega da mensagem, assim como a autenticidade de seu conteúdo, o magistrado pode considerar tais elementos válidos para efeitos legais.

 

Nessa perspectiva, se o credor fiduciário apresentar prova do recebimento do e-mail, encaminhado ao endereço eletrônico fornecido no contrato de alienação fiduciária, a notificação extrajudicial deve ser admitida para o ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem, uma vez cumpridos os mesmos requisitos exigidos da carta registrada com aviso de recebimento.

Informações Adicionais

Legislação

 

Decreto-Lei n. 911/1969, art. 2º, § 2º

Processo

 

REsp 1.632.928-RJ, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por maioria, julgado em 9/4/2024, DJe 25/4/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO DO CONSUMIDOR

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Ação civil pública. Legalidade de cobrança de taxa de conveniência para aquisição de ingressos para shows. Distinção entre taxa de conveniência, taxa de entrega e taxa de retirada. Cobrança das referidas taxas que refletem custos de intermediação de vendas e de serviços efetivamente prestados ao consumidor. Abusividade não comprovada.

Destaque

 

Não configura prática abusiva a cobrança das taxas de conveniência, retirada e/ou entrega de ingressos comprados na internet, desde que o valor cobrado pelo serviço seja acessível e claro.

Informações do Inteiro Teor

 

A taxa de conveniência é aquela cobrada pela simples aquisição de ingresso por meio de empresa contratada e diz respeito aos custos de intermediação da venda desses ingressos. Por outro lado, a taxa de retirada (também chamada de will call) é aquela cobrada quando o próprio consumidor compra o ingresso pela internet ou por telefone, mas, ao invés de imprimi-lo em casa, o emite em bilheteria específica colocada à sua disposição. No mais, taxa de entrega é aquela cobrada quando a pessoa opta por receber seu ingresso em domicílio, pelos Correios ou por outro serviço de courier.

 

No caso relativo à taxa de conveniência, cobrada quando da aquisição de ingresso pela internet, guiando-se pelo que decidido no julgamento dos Temas n. 938 e n. 958, a Terceira Turma desta Corte já entendeu que não há óbice a que os custos da intermediação de venda de ingressos sejam transferidos ao consumidor, desde que haja informação prévia acerca do preço total da aquisição, com destaque do valor.

 

Na inicial da ação civil pública, o MP não alega que os custos da taxa de conveniência estariam sendo omitidos dos consumidores, existindo indicação expressa no sentido de que a empresa recorrente ofereceria os ingressos “sob o pagamento de valor adicional” e que estaria agregando “referido valor ao dos ingressos, ainda que os mesmos sejam adquiridos junto às bilheterias”.

 

Tratando-se de valor explícito no momento da compra do ingresso, não há como considerar, neste tipo de situação, que tenha havido a ocorrência de prática abusiva.

 

As taxas de entrega e de retirada, ao contrário da taxa de conveniência, não configuram um simples custo de intermediação de venda, mas estão vinculadas a um serviço independente, dirigido ao consumidor que não quer ou não pode imprimir seu ingresso virtual em casa.

 

Assim como a entrega em domicílio gera um custo para a empresa responsável pela venda dos bilhetes, pois implica a contratação de serviço de courier, não há dúvidas de que o serviço de retirada de bilhetes em posto físico (will call) também acarreta um custo para a mesma empresa, porque, para colocá-lo à disposição do consumidor, ela tem que contratar uma pessoa para atendê-lo, além de ter que alugar ou comprar um espaço físico e as impressoras necessárias.

 

Se há serviço disponibilizado ao consumidor, que pode optar, a seu critério, se vai imprimir seu ingresso em casa, se vai solicitar que ele seja entregue pelos Correios, ou se vai preferir retirá-lo em bilheteria, e se o valor cobrado pelo serviço é acessível e claro, não há que se falar em abusividade.

Informações Adicionais

Precedentes Qualificados

 

Tema n. 958/STJ

Processo

 

REsp 1.830.550-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 30/4/2024.

Ramo do Direito

 

RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Recuperação judicial. Descumprimento do plano. Cláusula que possibilita nova convocação da assembleia geral de credores. Legalidade.

Destaque

 

É válida a cláusula que possibilita nova convocação da assembleia geral de credores em caso de descumprimento do plano de recuperação judicial, em vez da imediata conversão em falência.

Informações do Inteiro Teor

 

A controvérsia jurídica envolve a legalidade de cláusulas que preveem a convocação de uma nova assembleia geral de credores caso seja descumprido o plano de recuperação judicial, em vez da imediata conversão em falência.

 

As instâncias de origem afirmaram que a previsão de nova assembleia geral de credores violaria o estabelecido nos arts. 61, § 1º, e 73, IV, da Lei n. 11.101/2005, os quais determinam que, em caso de descumprimento de qualquer obrigação, a recuperação judicial deve ser convertida em falência.

 

Contudo, essas disposições não são normas imperativas, devendo ser interpretadas à luz do propósito da Lei de Recuperação Judicial, que consiste principalmente na superação da crise econômico-financeira e na preservação da empresa, conforme estabelecido em seu artigo 47.

 

A inserção de cláusula que possibilita nova convocação da assembleia geral, a fim de evitar o decreto imediato da falência, está inserida no âmbito da liberdade negocial dos credores. Se os próprios credores, maiores interessados no recebimento do crédito, optam por mais uma tentativa para manter a empresa, essa decisão, firmada em assembleia, coaduna-se com os imperativos que regem a Lei de Recuperação Judicial.

 

Justamente por não ser a conversão em falência norma cogente, a Quarta Turma, ao julgar o AREsp n. 1.059.178/SP, entendeu ser possível a instalação de nova assembleia, em razão de alterações no quadro fático e da existência de novos elementos para elaboração de um plano de recuperação judicial efetivamente viável, a ser aprovado pelos credores.

 

No mais, no âmbito do processo de recuperação, é soberana a deliberação da assembleia geral de credores relativa ao conteúdo do plano. Ao magistrado compete exclusivamente a avaliação da conformidade legal do ato jurídico, fundamentado no interesse público refletido no Princípio da Preservação da Empresa e na consequente manutenção dos empregos e das fontes de produção.

 

Por fim, a própria Lei de Recuperação Judicial, em seu artigo art. 35, I, a, estabelece a competência da assembleia geral de credores para deliberar acerca de eventual alteração no plano de recuperação judicial.

Informações Adicionais

Legislação

 

Lei n. 11.101/2005, arts. 35, I, a, 47, 61, § 1º, e 73, IV

QUINTA TURMA

Processo

 

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 7/5/2024, DJe 10/5/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Busca e apreensão que atinge domicílio de terceiro. Ilegalidade. Violação ao art. 243 do CPP.

Destaque

 

O mandado de busca e apreensão deve apontar, de maneira clara, a pessoa e o local onde a diligência ocorrerá, não podendo surpreender terceiros em violação de seus domicílios.

Informações do Inteiro Teor

 

Em se tratando de diligência que tangencia direitos e garantias fundamentais do acusado (art. 5º, X a XIII da CRFB/1988), o legislador processual penal houve por bem estabelecer, de maneira minuciosa, os elementos materiais e formais contidos no mandado que instrumentaliza a busca e apreensão.

 

No caso, a despeito de a ação cautelar tramitar apenas em desfavor de uma empresa, o cumprimento das diligências de busca e apreensão se estendeu ao edifício contíguo, pertencente à pessoa jurídica diversa, que não figurava na demanda acautelatória e, portanto, não poderia ter sua sede violada. O fato de o juízo ter delegado a verificação da propriedade do estabelecimento e da documentação apreendida aos oficiais que cumpriam a diligência ou a constatação, “a posteriori”, de confusão entre o acervo documental das empresas, não altera o quadro de violação constatado, na medida em que o art. 243, I do CPP estabelece, de maneira inequívoca, que “O mandado de busca deverá: I – indicar, o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador (…)”.

 

Efetivamente, se é cediço que é inviável ao magistrado, na elaboração do mandado, especificar todos os documentos e objetos a serem apreendidos, não é menos inequívoco que o instrumento que municia a diligência deve apontar, de maneira clara, a pessoa e o local onde a mesma ocorrerá, não podendo surpreender terceiros em violação de seus domicílios “lato”.

 

Nesta linha de pensamento, as questões relativas à existência de grupo empresarial ou qualquer outra forma de ligação entre a impetrante e a parte demandada na medida cautelar deveriam ter sido levadas ao conhecimento do juízo previamente à expedição do mandado.

 

Há de se aplicar, portanto, o entendimento deste STJ no sentido de que “(…) 13. Segundo o art. 243 do Código de Processo Penal, o mandado de busca deverá: i) indicar, o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador e ii) mencionar o motivo e os fins da diligência. 14. Hipótese concreta em que a decisão ordenou a expedição de um mandado de busca e apreensão indeterminado, ou seja, para qualquer crime, em qualquer lugar e para a apreensão de quaisquer objetos. Além disso, não trouxe nenhum fundamento que justificasse o emprego da medida. (…)” (HC 245.466-CE, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, Julgado em 27/11/2012).

Informações Adicionais

Legislação

 

Constituição Federal (CF), art. 5º, X a XIII

 

Código de Processo Penal (CPP), art. 243, I

Processo

 

AgRg no HC 828.054-RN, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 29/4/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Apreensão de celular. Extração de dados. Captura de telas. Quebra da cadeia de custódia. Inadmissibilidade da prova digital.

Destaque

 

A falta de procedimentos para garantir a idoneidade e integridade dos dados extraídos de um celular apreendido resulta na quebra da cadeia de custódia e na inadmissibilidade da prova digital.

Informações do Inteiro Teor

 

O instituto da cadeia de custódia, arts. 158-A e seguintes do CPP, visa a garantir que o tratamento dos elementos probatórios, desde a sua arrecadação até a análise e deliberação pela autoridade judicial, seja idôneo e livre de qualquer interferência que possa macular a confiabilidade da prova.

 

No caso, discute-se a inidoneidade de relatório de análise de extração de dados baseado em print screen de diálogos entre usuários de Whatsapp.

 

Diante da volatilidade dos dados telemáticos e da maior suscetibilidade a alterações, imprescindível se faz a adoção de mecanismos que assegurem a preservação integral dos vestígios probatórios, de forma que seja possível a constatação de eventuais alterações, intencionais ou não, dos elementos inicialmente coletados, demonstrando-se a higidez do caminho percorrido pelo material.

 

Mostra-se indispensável que todas as fases do processo de obtenção das provas digitais sejam documentadas, cabendo à polícia, além da adequação de metodologias tecnológicas que garantam a integridade dos elementos extraídos, o devido registro das etapas da cadeia de custódia, de modo que sejam asseguradas a autenticidade e a integralidade dos dados.

 

Dessa forma, pode-se dizer que as provas digitais, em razão de sua natureza facilmente – e imperceptivelmente – alterável, demandam ainda maior atenção e cuidado em sua custódia e tratamento, sob pena de ter seu grau de confiabilidade diminuído drasticamente ou até mesmo anulado.

 

Convém, assim, que o material epistemológico digital de interesse à persecução penal seja tratado mediante critérios bem definidos, que possibilitem a sua preservação, na maior medida possível, notadamente com explícita indicação de quem foi responsável pelo seu reconhecimento, coleta, acondicionamento, transporte e processamento, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito, notadamente com indicação da metodologia empregada e das ferramentas eventualmente utilizadas.

 

A documentação de cada etapa da cadeia de custódia é fundamental, a fim de que o procedimento seja auditável. É dizer, as partes devem ter condições de aferir se o método técnico-científico para a extração dos dados foi devidamente observado (auditabilidade da evidência digital).

 

Assim, a auditabilidade, a repetibilidade, a reprodutibilidade e a justificabilidade são quatro aspectos essenciais das evidências digitais, os quais buscam ser garantidos pela utilização de metodologias e procedimentos certificados, como, e.g., os recomendados pela ABNT. A ausência de quaisquer deles redunda em um elemento epistemologicamente frágil e deficiente, e, portanto, de valor probatório reduzido ou nulo.

 

A observação do princípio da mesmidade visa a assegurar a confiabilidade da prova, a fim de que seja possível se verificar a correspondência entre aquilo que foi colhido e o que resultou de todo o processo de extração da prova de seu substrato digital.

 

Uma forma de se garantir a mesmidade dos elementos digitais é a utilização da técnica de algoritmo hash, a qual deve vir acompanhada da utilização de um software confiável, auditável e amplamente certificado, que possibilite o acesso, a interpretação e a extração dos dados do arquivo digital.

 

No caso, quando da sentença condenatória, o juízo singular pontuou que a “análise se deu após consulta direta ao aparelho, sem necessidade de uso de máquinas extratoras (ex. Cellebrite).”, não sendo possível inferir a idoneidade das provas extraídas pelo acesso direto ao celular apreendido, sem a utilização de ferramenta forense que garantisse a exatidão das evidências, não havendo registros de que os elementos inicialmente coletados são idênticos ao que corroboraram a condenação.

 

De relevo, o entendimento majoritário desta Quinta Turma no sentido de que “é ônus do Estado comprovar a integridade e confiabilidade das fontes de prova por ele apresentadas. É incabível, aqui, simplesmente presumir a veracidade das alegações estatais, quando descumpridos os procedimentos referentes à cadeia de custódia” (AgRg no RHC 143.169/RJ, relator Ministro Messod Azulay Neto, relator para acórdão Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 2/3/2023).

 

Assim, inafastável a conclusão de que, in casu, não houve a adoção de procedimentos que assegurassem a idoneidade e a integridade dos elementos obtidos pela extração dos dados do celular do corréu. Logo, evidente o prejuízo causado pela quebra da cadeia de custódia e a imprestabilidade da prova digital.

Informações Adicionais

Legislação

 

Código de Processo Penal (CPP), arts. 158-A

Processo

 

AgRg no RHC 185.970-PR, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 7/5/2024.

Ramo do Direito

 

EXECUÇÃO PENAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Indulto natalino. Vedação do § 1º do art. 7º do Decreto Presidencial n. 11.302/2022. Facção criminosa. Organização criminosa. Interpretação in malam partem. Inexistência.

Destaque

 

Para fins de exame de pedido de indulto com fundamento no Decreto n. 11.302/2022, a discussão sobre eventual diferenciação entre organização criminosa e facção criminosa não tem relevância.

Informações do Inteiro Teor

 

O §1º do art. 7º do Decreto n. 11.302/2022 prescreve hipótese de vedação da concessão de indulto, nos seguintes termos: “(o) indulto natalino também não será concedido aos integrantes de facções criminosas, ainda que sejam reconhecidas somente no julgamento do pedido de indulto”.

 

No caso, o pedido foi indeferido pelas instâncias ordinárias, uma vez que, na sentença condenatória e no julgamento do pedido de indulto, os pacientes foram reconhecidos como líderes de organização criminosa, de modo a atrair a restrição contida no §1º do artigo 7º do Decreto n. 11.302/2022.

 

Com efeito, o indeferimento do indulto está fundamentado em elementos concretos que indicam participação em organização reconhecida pelas instâncias ordinárias como facção criminosa, nos moldes do §1º, art. 7º, do Decreto n. 11.302/2022.

 

Para fins de exame de pedido de indulto com fundamento no Decreto n. 11.302/2022, a discussão sobre eventual diferenciação entre organização criminosa e facção criminosa não tem relevância. Isso porque o §1º, art. 7º, do ato normativo, estabeleceu o dever do juízo de reconhecer, de forma fundamentada, ainda que somente no julgamento do pedido de indulto, a participação em facção criminosa.

 

Consigne-se, ainda, que a compreensão dada pelo Tribunal não implica interpretação extensiva in malam partem. Isso porque a vedação do §1º, art. 7º, Decreto n. 11.302/2022 impede a concessão de um benefício, derivado de discricionariedade do Presidente da República, que desconstitui uma sanção penal aplicada com observância do devido processo legal, nos exatos termos previstos pelo ato concessivo. E, nesse contexto, a vedação, de forma literal, prevê a possibilidade de reconhecimento da participação em facção criminosa ainda que somente no julgamento do pedido de indulto.

 

Não há, pois, extensão da compreensão do termo organização criminosa em juízo de adequação típica com finalidade condenatória em prejuízo dos reeducandos.

Informações Adicionais

Legislação

 

Decreto n. 11.302/2022, art. 7º, §1º

SEXTA TURMA

Processo

 

AgRg no HC 841.731-MS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 15/4/2024, DJe 18/4/2024.

Ramo do Direito

 

DIREITO PENAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Estelionato judicial. Ação de execução fundada em título executivo não autêntico. Atipicidade da conduta. Apuração e processamento de crimes remanescentes. Possibilidade.

Destaque

 

O denominado estelionato judicial é conduta atípica na esfera penal.

Informações do Inteiro Teor

 

O Tribunal a quo confirmou a condenação da acusada pelo crime de estelionato, porque teria, na condição de advogada, ajuizado ação de execução com base em título inautêntico, sendo autorizado o levantamento de vultuosa quantia da conta bancária da vítima.

 

Ocorre que, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o uso de ações judiciais com o objetivo de obter lucro ou vantagem indevida caracteriza estelionato judicial, conduta atípica na esfera penal.

 

Esta Corte Superior entende que a figura do estelionato judiciário é atípica pela absoluta impropriedade do meio, uma vez que o processo tem natureza dialética, possibilitando o exercício do contraditório e a interposição dos recursos cabíveis, não se podendo falar, no caso, em ‘indução em erro’ do magistrado. Eventual ilicitude de documentos que embasaram o pedido judicial poderia, em tese, constituir crime autônomo, que não se confunde com a imputação de ‘estelionato judicial’ e não foi descrito na denúncia.” (REsp 1.101.914/RJ, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 21/3/2012).

 

Ou seja, é “Inexistente como figura penal típica a conduta de induzir em erro o Poder Judiciário a fim de obter vantagem ilícita, não havendo falar em absorção de uma conduta típica (falso) por outra que sequer é prevista legalmente (estelionato judiciário).” (AgRg no RHC 98.041/RJ, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 4/9/2018).

 

Por fim, frise-se que o reconhecimento da atipicidade da conduta do estelionato judiciário não afasta a possibilidade de apuração de eventuais crimes autônomos remanescentes.

Processo

 

AgRg no HC 835.685-SC, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 7/5/2024, DJe 13/5/2024.

Ramo do Direito

 

EXECUÇÃO PENAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Indulto natalino. Decreto Presidencial n. 11.302/2022. Ausência dos requisitos objetivos. Unificação das penas. Delito impeditivo.

Destaque

 

Os crimes impeditivos do benefício do indulto, fundamentado no Decreto Presidencial n. 11.302/2022, devem ser tanto os praticados em concurso, como os remanescentes em razão da unificação de penas.

Informações do Inteiro Teor

 

A Corte de origem invocou fundamentos que estão em consonância com o atual entendimento deste Tribunal Superior que, superando entendimento anterior quanto à possibilidade de concessão de indulto quando não houvesse concurso entre os delitos, praticados em contextos fáticos diversos, passou a restringir a referida benesse nos casos em que houver também a unificação entre condenação por delito impeditivo e não impeditivo, como ocorre no presente caso, em que o paciente foi condenado em ações penais diversas pelos delitos de tráfico de drogas e tentativa de latrocínio, estes impeditivos da aplicação do indulto previsto no Decreto n. 11.302/2022.

 

Sobre o tema, a Terceira Seção dessa Corte, no julgamento do AgRg no HC 890.929/SE, em 24/4/2024, modificou sua convicção para seguir a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, considerando que os crimes impeditivos do benefício do indulto, fundamentado no Decreto Presidencial n. 11.302/2022, devem ser tanto os praticados em concurso, como os remanescentes em razão da unificação de penas.

Informações Adicionais

Legislação

 

Decreto n. 11.302/2022

Processo

 

AgRg no HC 895.107-SP, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 7/5/2024, DJe 13/5/2024.

Ramo do Direito

 

EXECUÇÃO PENAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

Progressão de regime. Laudo psicológico desfavorável. Requisito subjetivo. Ausência.

Destaque

 

O resultado desfavorável de exame criminológico justifica a negativa de progressão de regime por falta de requisito subjetivo.

Informações do Inteiro Teor

 

Para a progressão de regime, deve o reeducando preencher os requisitos de natureza objetiva (lapso temporal) e subjetiva (bom comportamento carcerário), nos termos do art. 112 da LEP.

 

Com as inovações da Lei n. 10.792/2003, que alterou o art. 112 da Lei n. 7.210/1984, afastou-se a exigência do exame criminológico para fins de progressão de regime. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que o Magistrado de primeiro grau, ou o Tribunal a quo, diante das circunstâncias do caso concreto, podem determinar a realização da referida prova técnica para a formação de seu convencimento, desde que essa decisão seja adequadamente motivada. Inteligência da Súmula n. 439/STJ e da Súmula vinculante n. 26.

 

No caso, verifica-se que as instâncias de origem consideraram que, para além da longa pena a cumprir e da gravidade do delito cometido, a existência de aspectos desfavoráveis destacados no laudo psicológico realizado, no qual foi destacado que o reeducando “apresenta personalidade com traços de imaturidade e dificuldade no controle racional de suas emoções, agindo de forma desajustada diante das adversidades do cotidiano” e “diante da dificuldade de ressocialização em virtude dos impactos negativos da dependência química e prisionização observa-se a necessidade de acompanhamento adequado.”

 

Conforme a jurisprudência desta Corte, “o resultado desfavorável de exame criminológico justifica a negativa de progressão de regime por falta de requisito subjetivo” (AgRg no HC 848.737/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 5/10/2023).

Informações Adicionais

Legislação

 

Lei n. 7.210/1984 (LEP), art. 112

Súmulas

 

Súmula n. 439/STJ

 

Súmula vinculante n. 26.

RECURSOS REPETITIVOS – AFETAÇÃO

Processo

 

ProAfR no REsp 2.078.485-PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 9/5/2024. (Tema 1253).

 

ProAfR no REsp 2.078.989-PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 9/5/2024 (Tema 1253).

 

ProAfR no REsp 2.078.993-PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 9/5/2024 (Tema 1253).

 

ProAfR no REsp 2.079.113-PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 9/5/2024 (Tema 1253).

Ramo do Direito

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

A Primeira Seção acolheu a proposta de afetação dos REsps n. 2.078.485/PE, 2.078.989/PE, REsp 2.078.993/PE e 2.079.113/PE ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: “possibilidade de o substituído processual propor execução individual de sentença coletiva quando, anteriormente, a mesma sentença foi objeto de execução coletiva por parte do substituto processual, extinta em virtude de prescrição intercorrente.”

RECURSOS REPETITIVOS – AFETAÇÃO

Processo

 

ProAfR no REsp 2.034.210-CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 9/4/2024, DJe 10/5/2024. (Tema 1254).

 

ProAfR no REsp 2.034.211-CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 9/4/2024, DJe 10/5/2024 (Tema 1254).

 

ProAfR no REsp 2.034.214-CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 9/4/2024, DJe 10/5/2024 (Tema 1254).

Ramo do Direito

 

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

A Corte Especial acolheu a proposta de afetação dos REsps n. 2.034.210/CE, 2.034.211-CE e 2.034.214-CE ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: “definir se ocorre ou não a prescrição para a habilitação de herdeiros ou sucessores da parte falecida no curso da ação.”

RECURSOS REPETITIVOS – AFETAÇÃO

Processo

 

ProAfR no REsp 2.083.968-MG, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 10/5/2024. (Tema 1255).

Ramo do Direito

 

DIREITO PENAL

Tema

Paz, Justiça e Instituições Eficazes

 

A Terceira Seção acolheu a proposta de afetação do REsp n. 2.083.968-MG ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: “se o delito de falsa identidade é crime formal, que se consuma quando o agente fornece, consciente e voluntariamente, dados inexatos sobre sua real identidade, e, portanto, independe da ocorrência de resultado naturalístico.”

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