Casa de Bingo deve pagar r$ 60 mil de indenização por danos morais coletivos

Valor será revertido ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos

A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) condenou uma empresa que explorava jogos de bingo e azar em Ribeirão Preto/SP a pagar indenização no valor de R$ 60 mil por danos morais coletivos. Os valores serão revertidos ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD), criado pela Lei nº 7.347/85.

A empresa Beira Rio Bingos havia sido condenada, em 2013, a interromper qualquer atividade de jogo de bingo ou relacionada, sob pena de multa diária de R$ 10 mil, além de perdimento do maquinário envolvido.

No entanto, o Ministério Público Federal (MPF) interpôs Recurso Especial ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) alegando ser insuficiente a obrigação de não fazer e necessária também a obrigação de indenizar. Em decisão monocrática, o ministro Og Fernandes deu provimento ao recurso e determinou o retorno dos autos para apreciação do valor a título de indenização.

No TRF3, o desembargador federal Marcelo Saraiva explicou que o dano moral coletivo se traduz na grave lesão aos valores e interesses coletivos fundamentais e que o montante indenizatório deve corresponder à realidade fática das condutas praticadas.

“Daí porque a fixação do quantum deve ser diferente para a pessoa jurídica que ainda está exercendo a atividade ilícita daquela que já não se encontra mais violando os preceitos fundamentais”, declarou.

O magistrado afirmou, ainda, que a jurisprudência do STJ reconhece a existência de dano moral coletivo presumido no caso de exploração de bingo.

Assim, citando critérios de razoabilidade e proporcionalidade, o desembargador federal estipulou o valor da indenização em R$ 60 mil e foi acompanhado pela Turma Julgadora por maioria de votos.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. EXPLORAÇÃO DE JOGO DE BINGO. NULIDADE DA SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. APLICAÇÃO DO ART. 515, §3º, DO CPC. LEIS Nº 9.615/98 E Nº 9.981/00. MP Nº 2.216-37/01. DECRETO Nº 3.659/00. ATIVIDADE ILEGAL APÓS REVOGAÇÃO DAS LEIS AUTORIZADORAS. ATIVIDADE NÃO SUJEITA AO EXCLUSIVO DOMÍNIO PRIVADO. REGIME DE DIREITO PÚBLICO. SERVIÇO PÚBLICO. CEF COIBINDO AUTORIZAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE.
1 – O objeto da ação em curso é precipuamente a completa cessação da atividade de exploração de jogos de bingo praticada pela ré e a definição quanto à destinação das máquinas outrora apreendidas, remanescendo interesse ao autor no julgamento do feito pelo mérito, pois persiste a necessidade de provimento jurisdicional que, efetivamente, obste o prosseguimento da exploração de bingo ou similar e decida sobre o direito de propriedade das máquinas eletrônicas apreendidas.
2 – Por força do disposto no art. 515, § 3º, do CPC, acrescido pela Lei nº 10.352, de 26/12/2001, o Tribunal, em sede de apelação, possui a faculdade de julgar imediatamente o mérito do litígio, quando o feito tratar de matéria de direito e estiver em condições de pronto julgamento, afastando a carência da ação imposta pela r. sentença recorrida.
3 – A Lei nº 9.615/1998 (Lei Pelé) apenas estabeleceu regime especial de exploração do jogo de bingo, permitindo-a em todo território nacional (art. 59), com o fim de custear o desporto, desde que, mediante credenciamento, junto à União, de entidades de administração e de prática desportiva (art. 60), sendo destas a responsabilidade ainda que a gestão do negócio fosse atribuída à empresa comercial idônea (art. 61). Umas e outras sujeitas, cada qual, a requisitos específicos para a concessão da autorização, assim as entidades esportivas (art. 62), e as empresas comerciais (art. 63). Para o fomento do desporto, a entidade desportiva foi contemplada com direito ao mínimo de 7% da receita bruta da sala de bingo ou bingo eventual, com prestação semestral de contas ao Poder Público quanto à aplicação dos recursos auferidos (art. 70).
4 – Tais preceitos, que regulamentavam o bingo desportivo (arts. 59 a 81 da Lei nº 9.615/1998), foram, efetivamente, revogados, a partir de 31/12/2001, pelo art. 2º da Lei nº 9.981, de 14/07/2000 (Lei Maguito), que apenas ressalvou o direito dos antigos titulares de autorização, até a data da respectiva expiração.
5 – É certo, contudo, que, posteriormente, veio a MP nº 2.049-24, de 26/10/2000, sucessivamente reeditada, a última delas com o nº 2.216-37, de 31/08/2001, cujo art. 17 alterou a redação do art. 59 da Lei nº 9.615/1998, enquadrando a exploração dos jogos de bingo, agora, como serviço público de competência da UNIÃO, cuja execução direta ou indireta caberia à CEF.
6 – Prevalece, pois, na atualidade, o regime de serviço público na exploração dos jogos de bingo, que foi objeto de regulamentação pelo Decreto nº 3.659, de 14/11/2000, o qual foi editado depois da MP nº 2.049/24, de 26/10/2000, primeira a alterar – e que com tal texto foi sucessivamente reeditada, inclusive pela última delas, a MP nº 2.216-37/2001, atualmente vigente -, o art. 59 da Lei nº 9.615/98, que passou a dispor que “A exploração dos jogos de bingo, serviço público de competência da União, será executada, direta ou indiretamente, pela Caixa Econômica Federal em todo o território nacional, nos termos desta Lei e do respectivo regulamento”. Não houve, pois, desregulamentação do setor, de modo a permitir a exploração livre ou a repressão penal incondicionada e absoluta, mas a sujeição da atividade a um novo modelo e parâmetro, desde então fixado pela MP nº 2.216-37, de 31.08.01, vigente, ainda que provisoriamente, por força do art. 2º da EC nº 32, de 11/09/2001, mesmo porque a MP nº 168, de 20/02/2004, que pretendia revogar o regime da MP nº 2.216/37/01, foi expressamente rejeitada pelo Congresso Nacional.
7 – A CEF, reiteradamente, deixou de conceder autorização para o funcionamento dos bingos, inviabilizando sua legalidade, pois se cuidava de atividade inserida nos termos da restrição do parágrafo único do art. 170 da Carta Constitucional.
8 – O maquinário apreendido, por ocasião do cumprimento da medida liminar e da lacração do imóvel, deverá ser encaminhado à Secretaria da Receita Federal, nos termos da normativa IN/SRF n. 309/2003, a qual prevê a pena de perdimento.
9 – Reputa-se necessário também o estabelecimento de um valor pecuniário suficiente para inibir qualquer tentativa de se burlar o comando judicial e a ordem legal (como no precedente da Terceira Turma desta C. Corte, na AC 1347313, Rel Des. Fed. Cecília Marcondes, DJ 25/11/2008), fixando tal valor (multa diária) em R$ 10.000,00.
10 – Não reconhecida a existência de um dano moral social causado pelo jogo do bingo no caso dos autos em razão da compreensão exata do dano moral revelar dificuldades práticas (afinal, não se teria uma prova concreta de dano, mas, no máximo, uma concretude presumida) de acordo com precedentes desta Turma (TRF3. AC-1458026. Rel. Des. Fed. Marli Ferreira. DJ 12/08/2011, AC 200761040047485, Rel. Des. Fed. Roberto Haddad, REO 1342757. Rel Des Federal Fábio Prieto. DJ 12/05/2009) e de outras Turmas desta Corte (AC – 1341677 Rel. Juiz Conv. Souza Ribeiro. Terceira Turma. DJ 02/12/2011, REO – 1276183 . Rel. Des. Fed. Márcio Moraes. Terceira Turma. DJ 18/02/2010).
11 – Apelação a que se dá provimento para declarar a nulidade da r. sentença e, nos termos do artigo 515, § 3º, do CPC, julgar parcialmente procedente o pedido.

Apelação Cível 0001339-21.2008.4.03.6102

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