Os direitos do intérprete e do produtor fonográfico são conexos ao direito de autor, porém conservam sua autonomia por decorrerem de atos de criação distintos, ainda que vinculados intrinsecamente à obra autoral. Dessa forma, para cada nova utilização da interpretação, é necessária a autorização expressa do intérprete.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou o recurso de uma emissora de televisão e manteve decisão de segunda instância que a condenou por violação dos direitos da intérprete de uma música utilizada no programa “Sítio do Pica-Pau-Amarelo” e que foi incluída em CD sem autorização.
A canção “Li Emi Ali Emília” foi gravada por uma professora de canto e sua aluna, a pedido de uma produtora, para ser utilizada no programa “Sítio do Pica-Pau Amarelo”.
Desídia
A emissora foi condenada em primeira e segunda instâncias sob o fundamento de que não era possível confundir a autorização dada para o uso da música no programa com a permissão para sua inclusão em novo material – no caso, o CD. Para as instâncias ordinárias, houve desídia da emissora ao não obter nova autorização da intérprete quando foi produzir o CD.
No recurso ao STJ, a emissora afirmou que a intérprete concordou em gravar a canção já sabendo que ela seria incluída no CD do programa. Para a recorrente, após a gravação da música, cabe apenas à produtora autorizar sua utilização, de acordo com o artigo 93 da Lei de Direitos Autorais.
Direitos conexos
Segundo o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator, a questão do recurso é saber se os direitos conexos coexistem ou se entre eles há uma relação aglutinadora, de modo que a autorização de produção da música atribuiria à produtora – e tão somente a ela – a decisão sobre reprodução subsequente, o que poderia absorver o direito conexo da intérprete.
Bellizze explicou que o objeto dos direitos autorais é a obra imaterial e, em razão dessa característica, a restrição decorrente de sua proteção legal é dirigida às atividades que se vinculam à utilização e exploração da obra.
Segundo o relator, cada nova utilização deve ter suas condições aferidas, a fim de se estabelecer se é livre ou se depende de autorização específica – e, nesse caso, em qual círculo de direito exclusivo ela se encaixa, para se determinar qual titular deve autorizá-la.
“Não à toa, o legislador, ao estabelecer cada um dos direitos conexos, cuidou de disciplinar em dispositivos distintos quais exercícios se sujeitam à autorização de seu titular, além de definir qual contribuição criativa caracteriza especificamente cada um dos direitos conexos”, explicou.
Exclusividade
O ministro disse que o direito da produtora recai sobre a gravação da música. Por sua vez, o direito exclusivo do intérprete está assegurado no artigo 90 da Lei de Direitos Autorais.
Para o ministro, a mesma música, por conter a interpretação da autora da ação, também se sujeita à esfera do direito exclusivo da intérprete, que pode autorizar ou proibir a reprodução, em conformidade com o artigo 90.
“Fica evidente, assim, que os direitos da artista e da produtora não podem ser confundidos. Logo, não é possível presumir que o exercício dos segundos contém ou suprime os primeiros.”
Marco Aurélio Bellizze concluiu que a emissora, ao pretender utilizar a música para outra finalidade, precisaria da autorização expressa da artista – o que não ocorreu no caso.
Leia o acórdão.