Associação municipal não possui legitimidade ativa para representar município em juízo

Em decisão unânime, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) extinguiu processo, sem resolução de mérito, movido pela Associação dos Municípios e Prefeitos do Estado do Ceará (Aprece) contra a União.

A ação discutia a complementação de valores recebidos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), mas o colegiado entendeu pela ilegitimidade ativa da associação para, em nome próprio, tutelar direitos e interesses de pessoas jurídicas de direito público.

Regras próprias

O relator, ministro Mauro Campbell Marques, destacou que a discussão de direitos e interesses das pessoas jurídicas de direito público possui uma sistemática própria, que deve observar uma série de prerrogativas e sujeições, tanto no que se refere ao direito material quanto ao direito processual.

As regras envolvidas são de direito público, destacou o ministro. Assim, tutelar interesse de pessoa jurídica de direito público sob forma de substituição processual é insuscetível de delegação a pessoa de direito privado.

“Nos moldes do artigo 12, II, do Código de Processo Civil (CPC), a representação judicial dos municípios, ativa e passivamente, deve ser exercida por seu prefeito ou procurador. A representação do ente municipal não pode ser exercida por associação de direito privado”, explicou.

Campbell lembrou ainda que esse entendimento também é pacífico na Primeira Turma do STJ ao citar como exemplo o julgamento do RMS 34270.

O RMS 47806, ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS. ILEGITIMIDADE ATIVA PARA TUTELAR, EM NOME PRÓPRIO, DIREITOS E INTERESSES DE PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO.
1. Hipótese em que se discute a legitimidade ativa da Associação Piauiense de Municípios para defender direito de seus filiados.
2. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado de que “a legitimação conferida a entidades associativas em geral para tutelar, em juízo, em nome próprio, direitos de seus associados (CF, art. 5º, XXI), inclusive por mandado de segurança coletivo (CF, art. 5º, LXX, b e Lei 10.016⁄09, art. 21), não se aplica quando os substituídos processuais são pessoas jurídicas de direito público. A tutela em juízo dos direitos e interesses das pessoas de direito público tem regime próprio, revestido de garantias e privilégios de direito material e de direito processual, insuscetível de renúncia ou de delegação a pessoa de direito privado, sob forma de substituição processual” (RMS 34.270⁄MG, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 28.10.2011). No mesmo sentido: REsp 1.446.813⁄CE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 26.11.2014.
3. Agravo Regimental não provido.

O AREsp 104238 ficou assim ementado:

FUNDEF. AÇÃO AJUIZADA POR ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA Nº 211⁄STJ. ACÓRDÃO HARMÔNICO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA Nº 83⁄STJ.
I – Recurso especial fundado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, em que apontada violação ao art. 6º do CPC, defendendo-se a possibilidade de Associação de Municípios ajuizar ação objetivando o pagamento de complementação do valor mínimo anual por aluno a ser repassado pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF).
II – Acórdão recorrido que solucionou a contenda ancorando-se no art. 12, II, do CPC (Serão representados em juízo, ativa e passivamente: (…) O Município, por seu Prefeito ou procurador). Em momento algum há referência à matéria inserta no artigo de lei supostamente ofendido, nem mesmo quando do julgamento dos aclaratórios, de sorte que sequer implicitamente se pode vislumbrar a ocorrência do prequestionamento viabilizador da instância especial. Incidência do verbete sumular nº 211⁄STJ.
III – Incumbiria à recorrente, de acordo com a iterativa jurisprudência deste Tribunal, interpor o recurso especial por ofensa ao artigo 535, inciso II, do Código de Processo Civil, ou seja, contra a omissão verificada e não para discutir a matéria que se pretendia prequestionar, não havendo, pois, como apreciar tal assunto, sob pena de supressão de instância.
IV – Mesmo que se pudesse, por esforço interpretativo, entender superado o empeço anterior, o entendimento espelhado pela Corte de origem se afina com o deste Tribunal Superior no sentido da ilegitimidade ativa de associação de Municípios para, em nome próprio, tutelar direitos e interesses de pessoas jurídicas de direito público. Aplicação da Súmula nº 83⁄STJ. Precedente: RMS nº 34.270⁄MG, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe de 28⁄10⁄2011.
V – Agravo regimental improvido.

O RMS 34270 ficou assim ementado:

RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS. ILEGITIMIDADE ATIVA PARA, EM NOME PRÓPRIO, TUTELAR DIREITOS E INTERESSES DE PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO.
1. A legitimação conferida a entidades associativas em geral para tutelar, em juízo, em nome próprio, direitos de seus associados (CF, art. 5º, XXI), inclusive por mandado de segurança coletivo (CF, art. 5º, LXX, b e Lei 10.016⁄09, art. 21), não se aplica quando os substituídos processuais são pessoas jurídicas de direito público. A tutela em juízo dos direitos e interesses das pessoas de direito público tem regime próprio, revestido de garantias e privilégios de direito material e de direito processual, insuscetível de renúncia ou de delegação a pessoa de direito privado, sob forma de substituição processual.
2. A incompatibilidade do regime de substituição processual de pessoa de direito público por entidade privada se mostra particularmente evidente no atual regime do mandado de segurança coletivo, previsto nos artigos 21 e 22 da Lei 12.016⁄90, que prevê  um sistema automático de vinculação tácita dos substituídos processuais  ao processo coletivo, podendo sujeitá-los inclusive aos efeitos de coisa julgada material em caso de denegação da ordem.
3. No caso, a Associação impetrante não tem – nem poderia ter – entre os seus objetivos institucionais a tutela judicial dos interesses e direitos dos Municípios associados.
4. Recurso ordinário desprovido.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUPOSTA OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO ACÓRDÃO RECORRIDO.  ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS. ILEGITIMIDADE ATIVA PARA TUTELAR, EM NOME PRÓPRIO, DIREITOS E INTERESSES DE PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Não havendo no acórdão recorrido omissão, obscuridade ou contradição, não fica caracterizada ofensa ao art. 535 do CPC.
2. Aplicam-se às pessoas jurídicas de direito público sistemática própria, observando-se uma série de prerrogativas e sujeições, tanto no que se refere ao direito material, quanto ao direito processual.
3. Nos moldes do art. 12, II, do CPC, a representação judicial dos Municípios, ativa e passivamente, deve ser exercida por seu Prefeito ou Procurador. A representação do ente municipal não pode ser exercida por associação de direito privado, haja vista que se submete às normas de direito público.  Assim sendo, insuscetível  de renúncia ou de delegação a pessoa jurídica de direito privado, tutelar interesse de pessoa jurídica de direito público sob forma de substituição processual. Precedentes da Primeira Turma: AgRg no AREsp 104.238⁄CE, Relator Ministro Francisco Falcão, DJe 07⁄05⁄2012; RMS 34270⁄MG, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, DJe 28⁄10⁄2011.
4. Recurso especial parcialmente provido, extinguindo o processo sem resolução do mérito.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1446813

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