Transportadoras são condenadas por simular ações para fraudar rescisões trabalhistas no Pará

Empresas deverão pagar valores devidos aos trabalhadores e indenização por dano moral coletivo 

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de seis empresas de transporte de passageiros do Pará contra condenação ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. A Justiça do Trabalho entendeu que as transportadoras, de um mesmo grupo econômico, simulavam ações judiciais na tentativa de fraudar o pagamento de verbas rescisórias após demissão sem justa causa de trabalhadores.

Ação civil pública

Em 2017, o Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou uma ação civil pública contra as seis empresas (Expresso Modelo, Empresas de Transporte Santa Isabel, Alves e Araújo Transporte Ltda., Sampaio e Lameira Ltda., Paranorte Transporte Ltda., Transporte Bom Sucesso Ltda.). Segundo o MPT, elas haviam demitido 147 empregados sem pagar as verbas rescisórias devidas e a multa de 40% do FGTS e sem entregar guias para saque do FGTS e para o seguro-desemprego.

Os empregados dispensados eram orientados a ajuizar reclamações trabalhistas, a fim de obterem acordo judicial para pagamento parcelado, e não integral, das verbas rescisórias. Para isso, as empresas indicavam um advogado que faria o serviço gratuitamente.

Na ação, o MPT pediu que a Justiça determinasse o pagamento das verbas devidas aos trabalhadores, além de indenização por dano moral coletivo, por entender que as infrações agridem direitos fundamentais e geram dever de reparação à coletividade.

Defesa

As empresas, em sua defesa, alegaram não ter interesse em fraudar a legislação trabalhista e justificaram a falta de dinheiro em caixa para quitar os débitos nos prazos legais. Mas sustentaram que tinham interesse em quitar os valores e que se preocupavam com o bem-estar dos trabalhadores.

Lides simuladas

Para o juízo da Vara do Trabalho de Castanhal (PA), propor o ajuizamento de ações destinadas à homologação dos acordos, inclusive com a indicação de advogado, é irregular. Conforme a sentença, a prática caracteriza lide simulada, pois “limita o direito do trabalhador às reais parcelas e aos reais valores devidos por sua dispensa imotivada, além de limitar as condições do acordo apresentado em juízo ao atendimento exclusivo dos interesses das empresas”. Em primeira instância, a Justiça do Trabalho determinou o pagamento das verbas trabalhistas devidas e de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 227 mil.

A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (AP/PA).

No recurso de revista, as transportadoras negaram que tenha havido ilicitude e dano coletivo, sob o argumento de que as supostas lesões não atingiriam a coletividade de trabalhadores. Alternativamente, solicitaram a redução do valor a ser indenizado, por entenderem desproporcional.

Gravidade e repetição de condutas lesivas

Em seu voto, o relator, ministro Mauricio Godinho Delgado, considerou configurado o dano moral coletivo, que ocorre quando é constatada lesão a uma coletividade. Trata-se, segundo ele, de “um dano social que ultrapasse a esfera de interesse meramente particular, individual, do ser humano”, ainda que a conduta possa atingir, igualmente, a esfera privada do indivíduo.

Para ele, diante da gravidade e da repetição de condutas lesivas, o valor arbitrado pautou-se em parâmetros razoáveis, como a repercussão social do descumprimento da norma legal, o grau de culpa dos ofensores e a sua condição econômica e o caráter pedagógico da medida.

O recurso ficou assim ementado:

A) AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . DANO MORAL COLETIVO. CONFIGURAÇÃO. SIMULAÇÃO DE LIDES PARA FINS DE QUITAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. COAÇÃO DOS EMPREGADOS . O dano moral coletivo, para sua configuração, exige a constatação de lesão a uma coletividade, um dano social que ultrapasse a esfera de interesse meramente particular, individual do ser humano, por mais que a conduta ofensora atinja, igualmente, a esfera privada do indivíduo. Sobre o tema, deve-se ponderar, inicialmente, que o dano moral coletivo, para sua configuração, exige a constatação de lesão a uma coletividade, um dano social que ultrapasse a esfera de interesse meramente particular, individual do ser humano, por mais que a conduta ofensora seja hábil a atingir, igualmente, a esfera privada do indivíduo. Na hipótese dos autos , a condenação das Reclamadas teve como origem a prática de lides simuladas, a partir das quais elas tentavam fraudar o pagamento de verbas rescisórias trabalhistas. Nesse sentido, consta no acórdão regional que a ilicitude ocorria a partir da ” despedida sem justa causa de diversos empregados sem efetuar o pagamento das verbas rescisórias, no prazo legal, e sem integralizar os depósitos do FGTS (incluída a multa de 40%) “. Depois disso, as Empresas orientavam “os empregados dispensados a ingressarem com reclamações trabalhistas, inclusive disponibilizando advogados, a fim de obterem acordo judicial para pagamento parcelado e não integral das verbas rescisórias “. Efetivamente, constata-se que restou evidenciada a conduta ilícita das Reclamadas, que visava ao objetivo de lograr vantagem econômica em detrimento dos direitos trabalhista, o que acarretou manifesto dano social, decorrente da ofensa ao patrimônio moral da coletividade de seres humanos que vivem de sua força de trabalho. Agravo de instrumento desprovido.

B) RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . DANO MORAL COLETIVO. VALOR INDENIZATÓRIO. Em relação ao valor arbitrado a título de indenização por dano moral coletivo, cabe ao Juiz fixá-lo, equitativamente, sem se afastar da máxima cautela e sopesando todo o conjunto probatório constante dos autos. Para mensuração da quantia, deve o Julgador lançar mão do princípio da razoabilidade, cujo corolário é o princípio da proporcionalidade, pelo qual se estabelece a relação de equivalência entre a gravidade da lesão e o valor monetário da indenização imposta, de modo que possa propiciar a certeza de que o ato ofensor não fique impune e servir de desestímulo a práticas inadequadas aos parâmetros da lei. De todo modo, é oportuno consignar que a jurisprudência desta Corte vem se direcionando no sentido de rever o valor fixado nas Instâncias Ordinárias a título de indenização apenas para reprimir valores estratosféricos ou excessivamente módicos, o que não se verifica na hipótese. Com efeito, o valor arbitrado a título de indenização por dano moral coletivo (R$227.346,24 – duzentos e vinte e sete mil trezentos e quarenta e seis reais e vinte e quatro centavos) pautou-se em parâmetros razoáveis, como a repercussão social do descumprimento da norma legal, o grau de culpa dos ofensores e a sua condição econômica e o caráter pedagógico da medida. Em suma, tendo em conta a gravidade e a repetição de condutas lesivas, o bem jurídico atingido, a capacidade econômica da empresa e a extensão do dano, a fixação de indenização mostra-se razoável e suficiente para coibir as práticas lesivas e acentuar o caráter pedagógico da medida, não se revelando excessiva. De outra face, decidida a matéria com base no conjunto probatório produzido nos autos, o processamento do recurso de revista fica obstado, por depender do reexame de fatos e provas ( Súmula 126/TST ). Recurso de revista não conhecido.

A decisão foi unânime.

Processo: RRAg-480-11.2017.5.08.0106

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