Proprietário deve promover reflorestamento e pagar indenização por danos ambientais
A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) manteve a condenação de um proprietário para demolir e remover edificações irregulares a 500 metros das margens do Rio Paraná, no Bairro Beira Rio, município de Rosana/SP. O réu também deve promover o reflorestamento e está impedido de realizar nova construção no local, considerado área de preservação permanente (APP).
Para o colegiado, documentos comprovaram que as edificações foram construídas de forma ilegal e clandestina. Além disso, o local não pode ser conceituado como área urbana, conforme prevê a Lei 14.285/2021, uma vez que não possui infraestrutura em drenagem de águas pluviais, esgotamento sanitário, abastecimento de água potável, distribuição de energia elétrica e iluminação pública, limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos.
Conforme os autos, a Polícia Militar Ambiental e a Polícia Civil registraram, em Boletim de Ocorrência Ambiental e em Laudo Técnico de Vistoria, dano ambiental no local, região de Mata Atlântica, com a edificação de uma casa para moradia e outra para depósito. Os técnicos recomendaram a demolição dos imóveis na área de preservação permanente, com a remoção de entulhos para local adequado.
A partir das provas apresentadas, o Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação civil pública. Ao julgar o pedido, a 1ª Vara Federal de Presidente Prudente/SP determinou, em 2018, a demolição das edificações; o reflorestamento; a instalação de fossa séptica; proibiu nova construção e a criação de gado; e determinou a apresentação do projeto de recuperação ambiental. Condenou-o também a pagar indenização pelos danos ambientais causados, no valor de R$ 2 mil reais, em favor de Fundo Federal de Defesa de Direitos Difusos.
O proprietário recorreu ao TRF3 e alegou que a família possuía imóvel há anos e exercia a atividade de pescador. Acusou, ainda, a construção da Usina Hidroelétrica Sergio Motta como responsável pelo dano ambiental na região. O MPF solicitou a majoração da indenização para R$ 20 mil.
Para a desembargadora federal Consuelo Yoshida, relatora do processo, os danos ocorreram em confronto à legislação ambiental. “O lote em questão está em área de preservação permanente (APP), cujo parcelamento do solo foi realizado de forma irregular e clandestina, com risco de inundação”, afirmou.
A magistrada não acatou o pedido de aumento da indenização pelos danos ambientais, pois há possibilidade de integral reabilitação do meio ambiente, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O recurso ficou assim ementado:
DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA. ART. 496, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL C/C ART. 19 DA LEI 7.347/1985. INQUÉRITO POLICIAL. BOLETIM DE OCORRÊNCIA AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). RIO PARANÁ. MUNICÍPIO DE ROSANA. DANO AMBIENTAL. EXTENSÃO. 500 (QUINHENTOS) METROS. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. ÁREA URBANA CONSOLIDADA NÃO RECONHECIDA. TEMA 1.010 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INAPLICABILIDADE. INDENIZAÇÃO. MAJORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. VIABILIDADE DE INTEGRAL RECUPERAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INCABÍVEIS.
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Reconhecida a submissão da r. sentença à remessa oficial, conforme o disposto no art. 496, I, do Código de Processo Civil c/c o art. 19 da Lei 7.347/1985.
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No caso vertente, o réu, ora apelante, Noel Ribeiro da Silva, é possuidor do imóvel denominado lote 23, localizado na Avenida Erivelton Francisco de Oliveira, 3.023, antiga Estrada da Balsa, Sítio dos Ribeiros, Bairro Beira Rio, Município de Rosana/SP, às margens do rio Paraná.
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Em 10/08/2006, a Polícia Militar Ambiental lavrou contra o requerido, o Boletim de Ocorrência Ambiental 060394 por impedir a regeneração natural da vegetação (gramínea) por meio de uma construção de alvenaria em área de preservação permanente, a menos de 500m do rio Paraná, sendo lavrado, em 25/08/2006 o Auto de Infração 18935360 e o correspondente termo de advertência, com fulcro no art. 50 da Resolução SMA 37/2005.
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Nesse passo, a Polícia Civil do Estado de São Paulo determinou a elaboração do Laudo Técnico de Vistoria 040, em 20/11/2006, pelo Engenheiro Agrônomo Koshi Okado, que concluiu (…) que trata-se de uma área de preservação permanente, situada à margem esquerda do Rio Paraná, a qual sofreu parcelamento do solo irregularmente, pois dependia de licenciamento dos órgãos competentes (..); (…) que houve dano ambiental, pois em referida área foram erigidas duas edificações, sendo: uma casa tipo sobrado para moradia e outra servindo de depósito, onde estas edificações impedem e dificultam, a formação florestal em seus estágios mais avançados da sucessão secundária da mata Atlântica – Floresta Latifoliada Estacional Semidecidual (…); que (…) as intervenções havidas ocupam uma área de preservação permanente correspondente a 0,048 hectare, conforme consta do Auto da Infração Ambiental (AIA) n° 189353, série A, lavrado em 10/08/2006 estando em desacordo com a legislação vigente (…) sugerindo, por fim, (…) que o autor proceda à demolição das edificações ali erigidas irregularmente em área de preservação permanente, removendo os entulhos para local adequado e pertinente.
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Da leitura dos referidos documentos percebe-se que os danos ambientais ocorreram antes do advento do novo Código Florestal, de modo que deve incidir, in casu, a Lei 4.771/1965, com as alterações da Lei 7.803/1989, reconhecendo-se que a faixa de área de preservação permanente em questão é de 500 (quinhentos) metros, tendo em vista que o imóvel está situado na margem do Rio Paraná, cuja margem possui largura superior a 600 (seiscentos) metros, nos termos do art. 2°, “a”, item 5.
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Cumpre destacar que, em 28/04/2021, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Tema 1.010, firmando a tese de que (…) na vigência do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente de qualquer curso d’água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu art. 4º, caput, inciso I, alíneas a, b, c, d e e, a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade.
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No que concerne aos requisitos para que um determinado local possa ser conceituado como área urbana consolidada, a Lei 14.285, de 29 de dezembro de 2021 exige, dentro outros requisitos, sistema viário implantado, além de pelo menos dois dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana: drenagem de águas pluviais; esgotamento sanitário; abastecimento de água potável; distribuição de energia elétrica e iluminação pública; ou limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos. Não obstante, conforme os documentos acostados aos presentes autos, os aludidos requisitos não foram cumpridos.
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Ainda que assim não fosse, estando comprovado nos autos, conforme documentos supramencionados, o fato de que o lote em questão está em Área de Preservação Permanente (APP), cujo parcelamento do solo foi realizado de forma irregular e clandestina, com risco de inundação, a discussão acerca do caráter urbano ou rural da área e sua eventual sujeição às leis municipais de uso e ocupação do solo torna-se despicienda, mesmo porque o parágrafo único do art. 2º da Lei 4.771/1965 é claro ao dispor que no caso de áreas urbanas (…) observar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo.
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Portanto, a faixa a ser considerada, in casu, deve ser a de 500 (quinhentos) metros do leito do Rio Paraná, na forma da legislação ambiental, e não a de 15 (quinze) metros de cada lado, conforme prevista no art. 4º, III, da Lei 6.766/1979.
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Havendo plena possibilidade de recuperação da área por meio do plantio de mudas nativas da região, deve ser mantida a indenização arbitrada em R$ 2.000,00 (dois mil reais) pelo r. Juízo de origem em razão do dano ambiental.
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Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, tendo em vista o que dispõe o art. 18 da Lei 7.347/1993.
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Apelação do réu desprovida. Apelações do Ministério Público Federal, da União Federal e remessa oficial, tida por interposta, parcialmente providas.
Assim, a Terceira Turma, por unanimidade, manteve a condenação do réu pela remoção dos imóveis irregulares e a realização de reflorestamento da área de 500 metros do leito do Rio Paraná, assim como a indenização ambiental em R$ 2 mil a ser paga pelo infrator.
Apelação Cível 5003331-47.2018.4.03.6112