A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que é cabível a ação civil pública como instrumento de controle difuso de constitucionalidade quando a alegação de inconstitucionalidade integra a causa de pedir, e não o pedido estrito.
A discussão teve início com uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) para obrigar a União e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a conceder o benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição aos estrangeiros residentes no Brasil e aos refugiados em situação regular.
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região declarou o juízo de primeiro grau incompetente para o julgamento da ação e considerou o pedido do MPF juridicamente impossível.
Em recurso ao STJ, o MPF pleiteou que a ação fosse admitida como instrumento de controle incidental de constitucionalidade, afirmando que a inconstitucionalidade do artigo 4º do Decreto 1.744/95 – que restringia o benefício aos estrangeiros naturalizados e domiciliados no Brasil – integra a causa de pedir, e não o pedido em sentido estrito.
De acordo com o relator, ministro Humberto Martins, a jurisprudência pacífica do STJ entende – e o Supremo Tribunal Federal também já reconheceu – que a inconstitucionalidade de determinado dispositivo legal pode ser alegada em ação civil pública, “desde que a título de causa de pedir, e não de pedido, como no caso em análise, pois nessa hipótese o controle de constitucionalidade terá caráter incidental”.
A Turma determinou que o tribunal de origem admita a apreciação do mérito da demanda, pois não há carência da ação por impossibilidade jurídica do pedido ou incompetência do órgão julgador.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SEGURIDADE SOCIAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ESTRANGEIROS E REFUGIADOS. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 4º DO DECRETO Nº 1.744⁄95. POSSIBILIDADE. CONTROLE DIFUSO. CAUSA DE PEDIR. RETORNOS DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROCESSAMENTO DA LIDE.
1. Recurso especial proveniente de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, com o objetivo de compelir a União e o INSS a concederem o benefício assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal aos estrangeiros residentes no Brasil, bem como aos refugiados, desde que em situação regular.
2. O acórdão recorrido reformou a sentença de primeiro grau para dar provimento aos recursos da União e do INSS para reconhecer e declarar a carência da ação por incompetência do juízo para o julgamento da ação civil pública.
3. É firme o entendimento do STJ no sentido de que a inconstitucionalidade de determinada lei pode ser alegada em ação civil pública, desde que a título de causa de pedir – e não de pedido –, como no caso em análise, pois, nessa hipótese, o controle de constitucionalidade terá caráter incidental. Precedentes: REsp 1.326.437⁄MG, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 05⁄08⁄2013; REsp 1.207.799⁄DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 03⁄05⁄2011.
4. Não há falar em carência da ação ou incompetência do órgão sentenciante, porquanto é cabível a ação civil pública como instrumento de controle difuso de constitucionalidade, conforme já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. Retorno dos autos à instância de origem para apreciação do mérito da demanda.
Recurso especial provido.
Leia o voto do relator.