Entidade contesta dispositivos das Constituições de Sergipe e do Paraná que garantem aos ex-governadores subsídio mensal e vitalício igual aos vencimentos de desembargador. A OAB sustenta que o benefício viola diversos preceitos da Constituição Federal de 1988.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil protocolou hoje (27) no Supremo Tribunal Federal duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 4544 e 4545) contra os dispositivos das Constituições dos Estados de Sergipe e Paraná que garantem aos ex-governadores subsídio mensal e vitalício igual aos vencimentos de desembargador do Tribunal de Justiça (artigo 263 da Constituição do Sergipe e 85 da do Paraná). A OAB sustenta que a concessão do benefício viola diversos preceitos da Constituição Federal de 1988.
O artigo 39, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 1998, que trata da política de remuneração de pessoal da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, menciona, em seu parágrafo 4º, “o membro de poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais” como categorias remuneradas exclusivamente por meio de subsídio. Além disso, também recebem subsídios os membros da Advocacia Geral da União e procuradores (artigo 135), os policiais e bombeiros (artigo 44, parágrafo 4º) e os ministros do Tribunal de Contas da União e conselheiros dos Tribunais de Contas estaduais (artigo 73, parágrafo 3º, e 75). “De logo se vê que a atual Constituição não prevê e não autoriza a instituição de subsídios para quem não é ocupante de qualquer cargo público (eletivo ou efetivo), não restando dúvida, por óbvio, que ex-governador não possui mandato eletivo e nem é servidor público”, afirma a inicial.
Subsídio, representação, pensão ou aposentadoria
As duas Constituições Estaduais adotam redação semelhante ao estabelecer que o subsídio seja concedido “a título de representação”. Para a OAB, as Assembleias Legislativas do Sergipe e do Paraná tentaram “mascarar a patente inconstitucionalidade” da medida ao intitular a “benesse concedida com a alcunha de representação”. A entidade sustenta que o termo “representação”, como vantagem pecuniária, é gratificação paga a agentes políticos de escalão superior da administração (chefes de Poder Executivo e seus auxiliares diretos – ministros e secretários municipais e estaduais), e a verba concedida dos ex-governadores não teria essa natureza.
O benefício não se fundamentaria em nenhum título legítimo, e também não se trataria de aposentadoria paga “pelos cofres públicos ou pelo INSS, para os agentes políticos providos em cargos, funções ou mandatos por via de eleição política, tanto que não se lhes descontam contribuição previdenciária”. Não pode, ainda, ser caracterizada como pensão, pois não atende aos requisitos constitucionais e legais para tal: a pensão previdenciária, no serviço público, só é conferida ao dependente do agente público em razão de sua morte, conforme o artigo 40, parágrafo 7º da Constituição Federal.
Os dispositivos questionados, afirma a OAB, instituíram, em termos práticos, “benefício sob a alcunha de subsídio, porém com características de provento ou pensão, especialmente porque estabelece como condição o término do exercício do cargo ou função pública – sem, contudo, sujeitar-se ao regime geral de previdência social. E o artigo 201, parágrafo 1º da Constituição veda a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral. A Ordem refuta também a possibilidade de benefício custeado pelas previdências estaduais, pois o governador não é considerado, para fins previdenciários, como segurado do regime contributivo estadual, como prevê o artigo 40, parágrafo 13 da Constituição.
Equiparação impossível
Outro aspecto atacado pela OAB é a vinculação do subsídio de ex-governadores ao de desembargador de Tribunal de Justiça. A equiparação seria contrária ao disposto no artigo 37, XIII da Carta Política, que veda “a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração do pessoal do serviço público”. Além disso, sustenta-se que “as normas impugnadas equipararam duas situações absolutamente distintas, na medida em que possibilita ao ex-governador a percepção de subsídio, sem prestação de serviço público, equivalente à recebida pelo ocupante do cargo em exercício”.
Precedentes
Os questionamentos da OAB fazem referência a decisões anteriores do STF sobre o mesmo tema. Em medida cautelar na ADI nº 3771, o ministro Carlos Ayres Britto suspendeu a eficácia de dispositivo semelhante da Constituição Estadual de Rondônia, por aparente contrariedade ao artigo 39, 4º da CF. Na ADI 3853, contra a Constituição Estadual do Mato Grosso, a ministra Cármen Lúcia lembra que, no atual ordenamento jurídico, a chefia do Poder Executivo não é exercida em caráter permanente, e a concessão de uma verba permanente quebra o equilíbrio federativo e os princípios da igualdade, da impessoalidade, da moralidade pública e da responsabilidade dos gastos públicos. E, na ADI 1461, relativa ao Estado do Amapá, o STF entendeu que a Constituição Federal não prevê subsídios para ex-presidentes, e os Estados não poderiam, assim, instituí-los, sob risco de infração ao princípio da simetria.