STF julga inconstitucionais atos normativos de Goiás sobre depósitos judiciais e extrajudiciais

Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucionais, nesta quinta-feira (21), normas instituídas em 2004 pelo estado de Goiás que dispõem sobre o sistema de conta única de depósitos judiciais. A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3458, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Por maioria, o tribunal decidiu, também, modular os efeitos da decisão  de hoje, para que ela passe a ser aplicada apenas 60 dias depois da sua publicação. Essa solução foi proposta pelo relator da ADI, ministro Eros Grau, com objetivo de dar ao governo de Goiás tempo suficiente para desarmar o sistema por ele estruturado, em que a administração dessa conta estava subordinada à Secretaria estadual de Fazenda.

Os atos impugnados pela OAB são: a Lei 15.010/04, o Decreto estadual 6.042/04, que trata do mesmo tema, e a Instrução Normativa nº 01/04, expedida conjuntamente pelo secretário de Fazenda e pelo presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.

A lei mencionada instituiu o Sistema de Conta Única de Depósitos Judiciais e Extrajudiciais, no âmbito estadual, para receber e controlar esses depósitos, feitos em dinheiro, em razão de processos judiciais ou administrativos, bem como os rendimentos de aplicações no mercado financeiro dos saldos de depósito. Em seu parágrafo único, essa lei exclui os depósitos extrajudiciais de natureza tributária, observando que eles obedecem à forma prevista na legislação estadual.

O Decreto 6.042/04 disciplina a operacionalização da conta única e atribui à Secretaria da Fazenda a responsabilidade para sua administração e para aplicação, no mercado financeiro, dos saldos dos recursos desses depósitos. Por fim, a Instrução Normativa 01/04 disciplina a operacionalização dessa conta única.

OAB diz que transferência para caixa estadual é expropriação

O principal argumento da OAB foi que a lei mencionada conflita com o artigo 24, parágrafo 2º, da Constituição Federal (CF), vez que disciplina, de forma diversa, matéria regulada pela lei federal nº 10.482/02. Alega, ainda, que ela usurpa competência privativa da União para legislar sobre direito processual, definida nos artigos 22, inciso I; 163, incisos I e II; 165, parágrafo 9º, inciso II, e 192, da CF, por entender que a matéria deveria ser regulada por lei complementar.

A OAB sustenta que o artigo 1º da lei impugnada transferiu para o Poder Executivo estadual o controle da totalidade dos depósitos judiciais e extrajudiciais feitos pelas partes litigantes, sendo que a lei federal apenas se refere aos processos em que a Fazenda pública figure como parte. Segundo a entidade, o artigo 1º cria uma nova espécie de tributo, por se tratar de assunto privativo da União e só disciplinável por lei complementar.

“A transferência dos depósitos judiciais para o caixa único do Estado configura a legitimação de uma verdadeira e inconstitucional expropriação, tendo em vista que tais numerários referem-se aos interesses dos litigantes e vinculam-se necessariamente a um dos pólos da ação”, enfatiza.

Outra irregularidade apontada pela OAB é com relação à destinação das transferências, que, pela lei federal, tem como objetivo único o pagamento de precatório alimentar. Já a lei atacada alterou a finalidade e incluiu a expressão “prioritariamente”, permitindo, assim, segundo o autor, toda sorte de gastos. A OAB ainda questiona a constituição do fundo de reserva que muda a base de cálculo original, prevista na norma federal.

Os ministros que participaram da sessão entenderam que os dispositivos impugnados contêm inconstitucionalidade material, pois, sendo o depósito judicial um ato processual – já que feito em função de um processo judicial –, cabe ao Judiciário a sua administração, e não à Secretaria da Fazenda do estado, como disposto nas normas impugnadas.

Ao acompanhar o voto do relator, ministro Eros Grau, o ministro Carlos Alberto Menezes Direito lembrou que a administração dos depósitos judiciais cabe exclusivamente ao Judiciário e que a lei goiana cria um conflito no que tange à separação dos Poderes, previsto na Constituição. Ele lembrou, ademais, que muitas vezes os recursos dos depósitos judiciais e extrajudiciais contribuem para manutenção da estrutura da máquina do Judiciário.

Por seu turno, ao também votar com o relator, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha observou que aprovaram uma lei e normas para sua operacionalização, sem que o Judiciário sequer participasse desse processo. Ao também votar com o relator, o ministro Ricardo Lewandowski observou que a lei goiana representava risco para o jurisdicionado, ao atribuir à Secretaria da Fazenda a faculdade de dar destinação aos recursos da conta.

Os ministros Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso, Gilmar Mendes e Marco Aurélio votaram pela inconstitucionalidade das normas goianas, apenas com fundamento no aspecto material, não pelo alegado vício formal ou de iniciativa que, no caso, segundo a OAB, seria privativa da União.

FK/LF

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