Em ações que discutem a nulidade de registro de marca, apenas a Justiça Federal, em processo com a participação do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), tem competência para impor ao titular do registro a abstenção de seu uso, inclusive em relação à eventual tutela provisória. A competência tem relação com o interesse da autarquia federal nos efeitos das decisões judiciais sobre os registros concedidos.
No entanto, no caso de discussões sobre o conjunto-imagem dos produtos (trade dress), concorrência desleal e assuntos correlatos, a competência é da Justiça estadual.
As teses foram firmadas pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso especial repetitivo (Tema 950). Atuaram como amici curiae no julgamento a Associação Brasileira de Propriedade Intelectual, a Confederação Nacional da Indústria e o próprio INPI.
O voto de relatoria, seguido de forma unânime pela seção, foi apresentado pelo ministro Luis Felipe Salomão. O ministro expôs inicialmente conceitos relacionados ao trade dress – elementos visuais e sensitivos vinculados a determinada identidade visual do produto ou serviço – e destacou que sua proteção decorre de norma constitucional (artigo 5º, incisivo XXIX).
O relator destacou que o ordenamento jurídico prevê a proteção de apenas algumas partes da aparência visual, que são efetivadas por meio de registro de marcas, desenhos industriais, patentes, direitos autorais, entre outros.
Nesse sentido, o ministro ressaltou que os registros perante o INPI normalmente efetivam a apresentação nominativa da marca (somente o nome do produto, sem estilizações), sem que ocorra proteção especial a elementos como os logotipos e caracteres gráficos.
Concorrência desleal
Citando estudiosos do tema, Salomão também destacou que, em geral, a proteção jurídica do conjunto-imagem está situada no âmbito da concorrência desleal, que não envolve interesse institucional da autarquia federal.
“Assim, dentro desta linha de raciocínio, penso que é de competência da Justiça estadual a apreciação de pedidos para determinação de abstenção de uso indevido de marcas e patentes, perdas e danos, indenização, concorrência desleal, em vista da utilização indevida de sinais distintivos, que venham a ensejar desvio desleal de clientela, busca e apreensão de produtos sujeitos à ação cível e penal”, afirmou o ministro.
No caso dos pedidos de anulação de registro, o relator apontou que o artigo 175 da Lei de Propriedade Industrial estabelece que o processo de nulidade deverá ser ajuizado na Justiça Federal. Segundo a legislação, o INPI, quando não for autor da ação, deverá intervir nas ações.
“De fato, quanto ao pedido de abstenção (inibição) do uso da marca, dúvida não há quanto à competência da Justiça Federal, até por decorrência expressa do artigo 173 da LPI, sendo a abstenção de uso uma decorrência lógica da desconstituição do registro sob o fundamento de violação do direito de terceiros”, concluiu o ministro ao fixar a competência da Justiça Federal.
Cosméticos
No caso analisado pela seção, o grupo Natura discute a utilização indevida do conjunto de imagem de seus produtos pelo grupo Jequiti. Segundo a Natura, os produtos Jequiti reproduzem nomes de marcas registrados e consagrados por ela, além de utilizarem logomarcas semelhantes nos itens de beleza e cosméticos.
Após decisão pela improcedência do pedido em primeira instância, o Tribunal de Justiça de São Paulo havia determinado que o grupo Jequiti se abstivesse de fabricar e comercializar produtos com marcas e embalagens semelhantes às da Natura.
Com a fixação da tese de competência da Justiça Federal nos casos de nulidade de marca, a Segunda Seção afastou a determinação da Justiça paulista para abstenção de uso do conjunto-imagem pelo grupo Jequiti.