Segundo a CLT, o aborto comprovado por atestado médico dá direito a um repouso remunerado de duas semanas à mulher
A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a condenação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 5 mil a uma coordenadora de logística que sofreu aborto espontâneo, mas não fruiu licença para repouso de duas semanas, conforme previsto da CLT. Para o colegiado, o abalo sofrido pela interrupção abrupta da gravidez é presumido.
Aborto espontâneo
Na reclamação trabalhista, a empregada disse que trabalhou na unidade da CSN em Araucária (PR) de 2009 a 2018. Em julho de 2017, sofreu o aborto espontâneo e, embora tivesse apresentado atestado médico confirmando o fato, não teve direito às duas semanas de repouso previstas no artigo 395 da CLT. A falta do descanso, segundo ela, causou abalo emocional, daí o pedido de indenização.
Prova
O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) confirmou a sentença de que entendeu configurado o dano moral diante da não comprovação pela CSN da concessão do repouso pela empregada.
Segundo o TRT, a empresa recebeu o atestado médico, mas optou por não apresentá-lo no processo. Além disso, uma testemunha convidada pela empresa também confirmou que sabia que a coordenadora tinha sofrido um aborto espontâneo. Dessa maneira, caberia à empresa provar a fruição do repouso, o que não ocorreu.
Recuperação física e emocional
A relatora do recurso de revista da CSN, ministra Delaíde Miranda Arantes, ressaltou que é da empresa o dever de documentar a relação de trabalho e era seu ônus comprovar a concessão da licença. Sem a comprovação, fica configurado o dano moral.
Segundo a ministra, é perfeitamente presumível o abalo sofrido pela mulher com a interrupção repentina da gestação. Por isso, a não concessão do período de repouso necessário para sua recomposição física e psicológica torna correta a condenação por dano moral.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017
1 – CERCEAMENTO DE DEFESA. ADIAMENTO DE AUDIÊNCIA EM RAZÃO DO NÃO COMPARECIMENTO DA TESTEMUNHA. INDEFERIMENTO. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. Consignado no acórdão recorrido que o prazo previsto no art. 455, § 1º do CPC não foi observado pela reclamada e que o motivo apresentado pela testemunha não se justifica, ante o disposto no art. 822 da CLT e 463 do CPC, não há de se falar em cerceamento ao direito de defesa em razão do indeferimento do pedido de adiamento de audiência. Agravo não provido.
2 – CARGO DE CONFIANÇA. ART. 62, II, DA CLT. NÃO CONFIGURAÇÃO. MATÉRIA FÁTICA. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. Estabelecido no acórdão recorrido que não foi constatada a fidúcia especial necessária para a configuração da exceção do art. 62, II, da CLT, a adoção de conclusão diversa em função dos argumentos da reclamada, sobretudo de que as funções exercidas pela autora eram de confiança dentro da empresa, esbarra no óbice da Súmula 126 do TST. Verifica-se, pois, que a discussão limita-se apenas à reanálise probatória, o que, além de ser vedado a esta Corte, não desborda dos interesses meramente subjetivos compreendidos na lide, inviabilizando a ascensão do apelo. Agravo não provido.
3 – INTERVALO PARA AMAMENTAÇÃO . AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. A controvérsia não foi dirimida à luz das regras de distribuição do ônus da prova, mas sim com base nas provas efetivamente produzidas que, valoradas pelo Tribunal Regional, levaram à conclusão de que “nem sempre, era possível cumprir o referido intervalo “. Nesse cenário, não há de se falar em violação ao art. 818, II, da CLT . Agravo não provido.
4 – ABORTO ESPONTÂNEO. REPOUSO REMUNERADO DE DUAS SEMANAS. ART. 395 DA CLT. NÃO FRUIÇÃO. ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. O Tribunal Regional manteve a condenação da ré por concluir, a partir da prova testemunhal, que “a empresa, de fato, recebeu o atestado, mas optou por não apresentá-lo nos autos” , razão pela qual, não comprovada a fruição do período de afastamento, manteve a condenação no pagamento respectivo. Nesse cenário, não se divisa de violação ao dispositivo apontado pela parte, especialmente porque , tendo a ré o dever de documentar a relação de trabalho, era seu o ônus de comprovar a fruição da licença. Agravo não provido.
5 – ABORTO ESPONTÂNEO. REPOUSO REMUNERADO DE DUAS SEMANAS. ART. 395 DA CLT. NÃO CONCESSÃO. DANO MORAL IN RE IPSA . AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. Não tendo sido concedida a licença prevista no art. 395 da CLT, a decisão do Tribunal Regional que mantém a condenação ao pagamento de indenização por danos morais não viola os dispositivos mencionados pela parte, uma vez que é perfeitamente presumível o abalo sofrido pela mulher com a interrupção repentina da gestação, sendo o período de repouso necessário para sua recomposição física e psicológica. Assim, basta a demonstração do ato ilícito (não concessão do repouso legal), pois se considera o dano moral in re ipsa . Agravo não provido.
A decisão foi unânime.
Processo: Ag-AIRR-1000-41.2020.5.09.0654