Restrição de acesso ao local de assembleia invalida criação de novo sindicato

A direção do hotel onde foi realizado o evento impediu a entrada de pessoas.

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho anulou os atos constitutivos da criação do Sindicato dos Propagandistas, Propagandistas-Vendedores e Vendedores de Produtos Farmacêuticos do Estado do Ceará (Sindiproface) em razão das restrições de acesso ao local da assembleia. Com a anulação, a Turma afastou a representatividade sindical da nova entidade.

O novo ente sindical adviria do desmembramento do Sindicato dos Empregados Vendedores e Viajantes do Comércio, Propagandistas, Propagandistas-Vendedores e Vendedores de Produtos Farmacêuticos do Estado do Ceará (Sinprovence), autor da reclamação trabalhista em que pedia a anulação. Segundo o Sinprovence, a assembleia em que se decidiria o desmembramento havia sido convocada para um hotel em Fortaleza, mas diversos integrantes da categoria foram barrados na porta.

Conflito

O Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE) registrou “a existência de um verdadeiro conflito” entre as testemunhas de ambos os lados a respeito do alegado impedimento de entrada de membros ao evento. Algumas relataram restrição ao local, outras disseram que o acesso era livre para todos. A conclusão do TRT foi de que os obstáculos não foram criados pelos membros do sindicato, mas por terceiros. Manteve, assim, a validade da assembleia.

Desmembramento

Segundo o relator do recurso de revista do Sinprovence, ministro Cláudio Brandão, a jurisprudência do TST está sedimentada quanto à possibilidade de desmembramento ou dissociação de sindicatos, desde que respeitados os limites territoriais e de categoria impostos pela Constituição da República. “Também é preciso verificar a viabilidade de defesa efetiva dos interesses da categoria pela nova entidade, de modo a evitar que a pulverização de sindicatos os enfraqueça e lhes retire o poder de negociação frente ao empregador”, assinalou.

Restrição ao local da assembleia

No caso, entretanto, o ministro destacou que, embora o sindicato original tenha sido convidado a participar da deliberação sobre o desmembramento, não se deu oportunidade de participação a todos os integrantes da nova categoria para respaldar a validade da dissociação. “O processo de formação da entidade sindical é ato complexo, marcado por sucessivas ações da categoria profissional, que envolve reuniões preparatórias e assembleias e até a formação de uma diretoria provisória”, explicou.

No caso, na avaliação do relator, a escolha do local para a realização da assembleia impediu, ainda que de forma indireta, o amplo acesso da categoria ao evento, em desrespeito à liberdade sindical coletiva. Isso porque a direção do hotel, em razão da aglomeração de pessoas e de reclamação de hóspedes e temendo a ocorrência de conflitos que pudessem causar danos no interior do estabelecimento, restringiu o ingresso de pessoas ao local.

Inexistência da representatividade

Por unanimidade, a Turma concluiu que a situação violou a participação democrática coletiva dos trabalhadores da formação da nova entidade sindical. Com isso, restabeleceu a sentença em que o juízo de primeiro grau havia anulado os atos constitutivos do sindicato e declarou a inexistência da representatividade do Sindiproface.

No TST., o recurso recebeu a seguinte ementa:

AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. DESMEMBRAMENTO SINDICAL POR ESPECIALIDADE. ASSEMBLEIA GERAL. AUSÊNCIA DE LIVRE ACESSO DOS MEMBROS DA CATEGORIA PROFISSIONAL. IRREGULARIDADE NA CONSTITUIÇÃO DO SINDIPROFACE. NULIDADE DOS ATOS CONSTITUTIVOS. Constatado equívoco na decisão agravada, dá-se provimento ao agravo em face de haver sido demonstrada possível afronta aos artigos 8º, II, da Constituição Federal c/c 9º e 511 da CLT.

RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Ante a possibilidade de decisão favorável ao recorrente, deixo de apreciar a nulidade arguida, com esteio no artigo 282, § 2º, do CPC/2015. DESMEMBRAMENTO SINDICAL POR ESPECIALIDADE. ASSEMBLEIA GERAL. AUSÊNCIA DE LIVRE ACESSO DOS MEMBROS DA CATEGORIA PROFISSIONAL. IRREGULARIDADE NA CONSTITUIÇÃO DO SINDIPROFACE. NULIDADE DOS ATOS CONSTITUTIVOS. Como é cediço, o panorama constitucional atual alberga o sistema sindical confederativo – estruturado em sindicatos, federações e confederações -, e impõe a todas essas entidades a unicidade sindical. Essa é a clara dicção do artigo 8º, II, da Constituição Federal. Sem adentrar à interessante e sempre atual questão das virtudes e problemas da unicidade sindical, certo é que se trata de princípio cogente, cuja aplicação tem de ser resguardada pelo Judiciário. Nada obstante, no âmbito da organização dos sindicatos, ao lado da possibilidade de reunião de categorias similares e conexas, conforme preceitua o artigo 570 da CLT, é igualmente válida a previsão de dissociação dessas entidades pelo princípio da especialidade, nos termos do artigo seguinte, ressalvada a referência nele contida à Comissão de Enquadramento Sindical. Em suma, tem pleno amparo jurídico a divisão sindical em bases territoriais menores, desde que respeitado o limite mínimo de um município (desmembramento territorial), ou a cisão de uma categoria ampla e heterogênea, para dar origem a outras menores, com o intuito de viabilizar a defesa de interesses específicos (dissociação de categoria por especialidade). No caso, da análise do conjunto probatório, consignou a Corte de origem “a existência de um verdadeiro conflito entre as declarações das testemunhas do réu e do autor, estas dizendo que foram impedidas de participar da assembleia de criação do sindicato-réu, e aquelas afirmando que não havia nenhum bloqueio ao acesso dos membros da categoria e que o acesso era livre para todos.” Destacou que, “analisando-se o conteúdo dos testemunhos contidos nos autos, conclui-se que os membros do sindicato-recorrente, SINDIPROFACE, não contribuíram para criar empecilhos à participação de quaisquer integrantes da sua categoria profissional à assembleia de criação deste sindicato”, bem assim que “não se pode imputar vício na assembleia de criação do SINDIPROFACE, visto que os membros presentes à assembleia não são responsáveis por supostos erros de terceiros que não fazem parte da categoria, nem receberam orientação para criar obstáculos à entrada de quaisquer membros da categoria à assembleia.” Data venia, embora o sindicato-autor (SINPROVENCE) tenha sido devidamente convidado a participar do processo de deliberação do desmembramento, certo é que não se verifica a oportunidade de participação de todos os integrantes da nova categoria a respaldar a validade da dissociação. Isso porque o processo de formação da entidade sindical é ato complexo, marcado por sucessivas ações da categoria profissional, desde a iniciativa dos verdadeiros interessados – os trabalhadores, passando pela realização de reuniões preparatórias e assembleias e até a formação de uma diretoria provisória encarregada da materialização dos atos formais para validar a existência da pessoa jurídica. É o momento em que se apresenta como mais necessária, em virtude da falta de mobilização da categoria, para proteger aqueles que a representam, como reconhecido pelo STF (D.J. 25.09.98, RE N. 205.107-1). Com efeito, em respeito ao Princípio da Livre Associação, se impõe a convocação de assembleia geral dos trabalhadores interessados componentes da categoria profissional na base territorial e que a sua realização conte com a participação de significativo número de integrantes da categoria, capaz de conferir representatividade e legitimidade à nova categoria, sem olvidar que o art. 571 da CLT é expresso em autorizar a dissociação de um segmento da categoria para a formação de sindicato específico, a fim de concentrar os trabalhadores pelos critérios de similaridade e conexidade. Portanto, deve-se entender que a criação da nova entidade, nos termos acima mencionados, e a consequente desfiliação de profissionais de um sindicato, representa a expressão da liberdade sindical, que não pode ser tolhida em razão de “supostos erros de terceiros”, conforme denominou o Tribunal Regional, sob pena de verificar-se o monopólio da representação sindical, sem poder expressar os reais interesses dos seus representados. Veja-se que a escolha do local onde foi realizada a assembleia geral – Hotel Confort -, ainda que de forma indireta, obstou o amplo acesso da categoria profissional no processo de criação do sindicato, em desrespeito à liberdade sindical coletiva de organização, na medida em que o receio da direção do hotel em razão da aglomeração de pessoas que se formou, bem assim da reclamação de alguns hóspedes e apreensão de serem causados danos no interior do estabelecimento hoteleiro caso houvesse algum conflito entre as partes envolvidas, ocasionou a restrição do ingresso de pessoas ao local do evento. Decisão regional que viola a participação democrática coletiva dos trabalhadores na criação da nova entidade sindical. Recurso de revista conhecido e provido”.

Processo: RR-209900-32.2007.5.07.0010

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