Reconhecida jornada especial a advogado com contrato sem previsão de dedicação exclusiva

Ele trabalhava oito horas diariamente e receberá horas extras.

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado de São Paulo (CREA-SP) a pagar a um advogado as horas extras além da quarta diária, acrescidas de 100%. Conforme a decisão, não havia, no contrato individual de trabalho, nenhuma cláusula expressa de dedicação exclusiva. Dessa forma, ao trabalhar oito horas diariamente, as excedentes das quatro relativas à jornada diferenciada de advogado serão consideradas extraordinárias.

Estatuto

O processo discute se o regime de dedicação exclusiva pode ser presumido ou deve ser ajustado expressamente, pois o advogado fora admitido em 2006, na vigência do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994). O artigo 20 da lei dispõe que a jornada de trabalho do advogado empregado, no exercício da profissão, não pode exceder a duração diária de quatro horas contínuas e a de 20 horas semanais, “salvo acordo ou convenção coletiva ou em caso de dedicação exclusiva”.

Ao examinar a questão, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) manteve a sentença que indeferiu o pedido de horas extras. Segundo o TRT, se trabalhava oito horas diárias, o advogado não tinha tempo para outro trabalho, caracterizando a dedicação exclusiva.

Previsão expressa

O relator do recurso de revista do advogado, ministro José Roberto Pimenta, assinalou que, de acordo com o Estatuto da Advocacia, a jornada superior a quatro horas diárias e 20 horas semanais só é admitida mediante acordo ou convenção coletiva ou nos casos de dedicação exclusiva. Por sua vez, o artigo 12 do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia, expedido pelo Conselho Federal da OAB, considera de dedicação exclusiva, para fins da aplicação do artigo 20 da lei, “o regime de trabalho que for expressamente previsto em contrato individual de trabalho”.

Cláusula expressa

Segundo o relator, portanto, a dedicação exclusiva constitui exceção à regra geral e não pode ser presumida. Ele destacou que, conforme entendimento da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do TST, para os empregados admitidos após a lei de 1994, tornou-se exigível a cláusula expressa como condição essencial à caracterização desse regime. No caso do CREA, no entanto, essa condição não foi preenchida.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO.

 JUROS DE MORA DEVIDOS PELA FAZENDA PÚBLICA. INAPLICABILIDADE AOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL.

Debate-se, in casu, a incidência do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997, que determina o pagamento de juros de mora reduzidos aos conselhos profissionais. Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter reconhecido a natureza autárquica especial dos conselhos de fiscalização profissional e sedimentado o entendimento de que, em razão da natureza autárquica atípica desses conselhos regionais e federais de fiscalização profissional, beneficiam-se dos privilégios previstos no Decreto-Lei nº 779/1969, não se manifestou sobre a penhorabilidade ou não dos bens que constituem o seu patrimônio. Com efeito, embora tenham natureza autárquica, os conselhos profissionais não são administrados pelo Poder Público, possuindo total autonomia financeira e sem nenhuma dependência de verbas públicas para o exercício de suas atribuições, razão pela qual a eles não se aplicam os privilégios da Fazenda Pública relacionados à execução por precatórios e aos juros de mora (precedentes).

Agravo de instrumento desprovido.

 RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO.

 EMPREGADO DE CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA DE AUTARQUIA. APLICABILIDADE DA VEDAÇÃO CONTIDA NO ARTIGO 37, INCISO XIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

No caso dos autos, discute-se, para fins de validar ou não a equiparação salarial deferida ao reclamante, se o artigo 37, inciso XIII, da Constituição Federal, o qual prevê que é vedada vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público, é aplicável aos conselhos de fiscalização do exercício profissional. A jurisprudência majoritária desta Corte superior adota o entendimento de que os conselhos regionais e federais de fiscalização do exercício profissional não possuem natureza autárquica em sentido estrito, ao contrário, são autarquias sui generis, dotadas de autonomia administrativa e financeira, não lhes sendo aplicáveis as normas relativas à administração interna das autarquias federais. Contudo, esse entendimento não se coaduna com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, para o qual os Conselhos de fiscalização profissional são autarquias atípicas e, portanto, se beneficiam das mesmas prerrogativas legalmente asseguradas às autarquias próprias, inclusive no que diz respeito ao disposto no artigo 37, especialmente o inciso II, que prevê a necessidade de aprovação em concurso público para ingresso em seus quadros. Com fulcro nesse raciocínio, a jurisprudência desta Corte superior se posicionou, quanto à natureza jurídica desses conselhos, firmando o entendimento, por meio da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, de que os conselhos regionais e federais de fiscalização do exercício profissional possuem natureza autárquica, sendo-lhes aplicáveis as normas relativas à administração interna das autarquias federais, inclusive no que diz respeito ao disposto nos artigos 37, inciso II, e 41 da Constituição Federal. Nessa senda, conclui-se que deve prevalecer o entendimento de que os conselhos de fiscalização profissional são autarquias criadas por lei, com personalidade jurídica de direito público, exercendo atividade tipicamente pública, submetendo-se, por corolário lógico, às regras do artigo 37 da Constituição Federal, inclusive no que diz respeito ao inciso XIII, sendo vedada, portanto, a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para efeito de remuneração de seu pessoal.

Recurso de revista conhecido e provido.

RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE.

 HORAS EXTRAS. ADVOGADO ADMITIDO APÓS O ADVENTO DA LEI Nº 8.906/1994. REGIME DE DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. NECESSIDADE DE PREVISÃO EXPRESSA EM CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO. DEVIDAS COMO EXTRAS AS HORAS TRABALHADAS ALÉM DA 4ª HORA DIÁRIA.

Discute-se, nos autos, se o regime de dedicação exclusiva pode ser presumido ou deve ser ajustado expressamente, na hipótese de o autor ter sido admitido após o advento da Lei nº 8.906/1994. Com efeito, a citada lei, em seu artigo 20, dispõe que “a jornada de trabalho do advogado empregado, no exercício da profissão, não poderá exceder a duração diária de quatro horas contínuas e a de vinte horas semanais, salvo acordo ou convenção coletiva ou em caso de dedicação exclusiva”. Extrai-se, portanto, do citado dispositivo legal que a regra geral é que a jornada de trabalho do advogado empregado não poderá exceder a duração diária de 4 (quatro) horas diárias e a de 20 (vinte) horas semanais, admitindo-se, entretanto, outra jornada de trabalho nas hipóteses de acordo ou convenção coletiva ou nos casos de dedicação exclusiva. Por sua vez, o artigo 12 do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, expedido pelo Conselho Federal da OAB, prevê o que vem a ser o regime de dedicação exclusiva, in verbis: “Para os fins do art. 20 da Lei n.º 8.906/94, considera-se dedicação exclusiva o regime de trabalho que for expressamente previsto em contrato individual de trabalho”. Verifica-se, portanto, que a jornada em dedicação exclusiva constitui exceção à regra geral e, portanto, não se presume, suscitando ajuste formal entre as partes. Assim, o Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, ao definir o conceito de dedicação exclusiva, confirmou o que dispõe o artigo 20 da Lei nº 8.906/94 acerca da obrigatoriedade da previsão contratual expressa para a configuração do regime de dedicação exclusiva para o advogado empregado. Nesse contexto, conforme entendimento consagrado na Subseção I Especializada em Dissídios Individuais desta Corte, para se configurar a hipótese de dedicação exclusiva para os empregados admitidos após a edição da Lei nº 8.906/1994, tornou-se exigível a cláusula expressa como condição essencial à caracterização do regime de dedicação exclusiva. No caso, é incontroverso, nos autos, que o reclamante foi admitido em 2006, após, portanto, a edição da Lei nº 8.906/1994. O Regional manteve a sentença pela qual se indeferiu o pedido de pagamento de horas extras além da 4ª diária, ao fundamento de que, ao negar o trabalho em regime de dedicação exclusiva, o autor contradiz a jornada que alega, pois, se trabalhava em jornada de oito horas diárias, não tinha tempo para outro trabalho. Extrai-se, portanto, da decisão regional que não houve cláusula expressa a respeito do regime de dedicação exclusiva, na medida em que se presumiu a sua existência. Não havendo, no contrato de trabalho do reclamante, previsão expressa acerca do regime de dedicação exclusiva, aplica-se a jornada de trabalho de 4 (quatro) horas diárias.

Recurso de revista conhecido e provido.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-3129-57.2012.5.02.0019

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