A contratação de advogado não é obrigatória na Justiça do Trabalho
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho derrubou decisão que condenava a Vale S.A. a pagar indenização a um ferroviário de São Luís (MA) pelos gastos decorrentes da contratação de advogado. Segundo o colegiado, essa indenização é incompatível com o processo trabalhista, que tem regras próprias em relação a honorários advocatícios.
Danos materiais
O maquinista, empregado da Vale de 1991 a 2015 em Marabá (PA), contratou o advogado para ajuizar a reclamação trabalhista, em que reivindicava diversas parcelas. Conforme o contrato firmado, ele deveria desembolsar 30% sobre o valor bruto das verbas deferidas, e pretendia ser ressarcido desses gastos pela empregadora.
Responsabilidade civil
O juízo de primeiro grau julgou o pedido improcedente, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA) reformou a sentença e deferiu indenização de 15% sobre o valor da condenação, a ser revertida exclusivamente ao trabalhador, para custear as despesas com o advogado. Segundo o TRT, a verba dizia respeito à responsabilidade civil e, portanto, estava sujeita às regras do Código Civil, e não da CLT.
Disciplina específica
A Vale recorreu ao TST, argumentando que a indenização pela contratação de advogado era incompatível com o processo trabalhista. O relator do recurso de revista, ministro Alberto Balazeiro, explicou que, em relação às ações iniciadas antes da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), os honorários advocatícios tinham disciplina específica, prevista na Lei 5.584/1970, e não se admitia a indenização com base na aplicação subsidiária das normas do Código Civil.
Esse entendimento se tornou tese vinculante em 2021 (IRR-RR-341-06.2013.5.04.0011), mas não abrange explicitamente as controvérsias posteriores à Reforma Trabalhista, como no caso em discussão, que é de 2018.
“Raciocínio jurídico idêntico”
Contudo, para o relator, com base em raciocínio jurídico idêntico ao adotado na tese vinculante, “o resultado há de ser o mesmo”. Na avaliação de Balazeiro, mesmo após a Lei 13.467/2017, permanece o regramento trabalhista próprio para a matéria: o artigo 791-A da CLT, introduzido pela Reforma. Esse dispositivo, segundo ele, prevê taxativamente a disciplina de honorários advocatícios no Processo do Trabalho, afastando a aplicação do Código Civil.
Causa própria
Outro aspecto observado foi que a reforma de 2017 não extinguiu o direito da parte de ajuizar ação trabalhista sem a assistência de advogado (jus postulandi). O artigo 791 da CLT permite que empregados e empregadores possam reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final. Assim, a contratação de advogado não é uma obrigação decorrente do ajuizamento da ação trabalhista, mas mera opção – e, por essa especificidade, não justifica o pagamento de indenização pela parte contrária.
Danos e má-fé
Ele também assinalou que o artigo 793-A da CLT, também introduzido pela Reforma Trabalhista, que trata da litigância de má-fé, deixou claro que a condenação por perdas e danos depende da comprovação de má-fé, e não apenas da sucumbência.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. INOBSERVÂNCIA DOS PRESSUPOSTOS RECURSAIS PREVISTOS NO ART. 896, §1º-A, I E III, DA CLT. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA.
Por força do comando do art. 896, §1º-A, I e III, da CLT, para viabilizar o exame do recurso de revista, a parte deve transcrever nas razões de recorrente o trecho do acórdão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia e proceder ao cotejo analítico entre os fundamentos da decisão recorrida e os dispositivos que entende violados e os arestos que entende divergentes. Na hipótese, a parte agravante, em seu recurso de revista, em seu recurso de revista, transcreveu, no início das razões recursais, o trecho que consubstancia o prequestionamento da controvérsia trazida à apreciação, de forma desvinculada de seu respectivo tópico, de forma que as exigências processuais contidas no art. 896, § 1º-A, I e III, da CLT, não foram atendidas, vez que não há, nesse caso, determinação precisa da tese adotada pelo Tribunal Regional combatida no apelo, nem demonstração analítica das violações apontadas.
Agravo de instrumento a que se nega provimento .
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. INDENIZAÇÃO PELA CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO. COMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO.
1. Discute-se a condenação da reclamada ao pagamento de indenização “por danos materiais” decorrentes da contratação de advogado pela parte contrária. No pertinente às lides iniciadas antes da vigência da Lei nº 13.467/17, afigura-se pacificado o entendimento de que os honorários advocatícios possuem disciplina específica, prevista na Lei nº 5.584/70, não se admitindo a incidência de indenização em consequência da aplicação subsidiária das normas insertas em dispositivos do Código Civil (art. 389 e 404). Precedentes da SDI-1. Referido entendimento foi alçado ao patamar de tese vinculante no julgamento do IRR-RR-341-06.2013.5.04.0011, Tribunal Pleno, Relator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 01/10/2021.
2. É certo que, para ações propostas sob a égide da Lei nº 13.467/17, não há como se aplicar a tese vinculante acima reproduzida, que explicitamente não abrange as controvérsias posteriores à Reforma Trabalhista. Contudo, sob a luz de raciocínio jurídico idêntico ao adotado pelo Tribunal Pleno desta Corte, o resultado há de ser o mesmo.
3. Isso porque o fundamento jurídico para a inaplicabilidade dos preceitos civilistas ao Processo do Trabalho residiu na existência de legislação específica para o campo laboral acerca do pagamento de honorários advocatícios – que consistia na Lei nº 5.584/70, interpretada pela Súmula nº 219 do TST. Ocorre que, mesmo após o advento da Lei nº 13.467/17, persiste a existência de regramento laboral próprio para a matéria, agora consistente no próprio art. 791-A introduzido na CLT pela referida lei. O citado dispositivo prevê taxativamente a disciplina de honorários advocatícios no Processo do Trabalho, de modo que remanescem incompatíveis o preceitos do Código Civil.
4. Além disso, a Reforma Trabalhista não extinguiu o jus postulandi no âmbito laboral, uma vez que permanece vigente o caput do art. 791 da CLT ( Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final ). Referido dispositivo, portanto, evidencia que a contratação de advogado pela parte não se afigura uma obrigação decorrente do ajuizamento da ação trabalhista, mas uma mera opção defensiva do litigante – e, por tal especificidade, não enseja o pagamento de indenização pela parte contrária.
5. Como se não bastasse, a própria Lei nº 13.467/17 introduziu na CLT o art. 793-A, que explicita que ” Responde por perdas e danos aquele que litigar de má-fé como reclamante, reclamado ou interveniente “. Em outras palavras, a Reforma Trabalhista deixou claro que a condenação por perdas e danos na seara laboral depende da comprovação de má-fé da parte, e não, somente, da sucumbência.
6. Nesse contexto, inexiste terreno para a condenação das partes a uma indenização pela contratação de advogado, mesmo após a Lei nº 13.467/17, sendo que o acórdão recorrido contrariou esse entendimento.
Recurso de revista conhecido por divergência jurisprudencial e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: ARR-188-86.2018.5.08.0107