Liberação do saldo do FGTS pode ser autorizada para assegurar o direito à vida e à saúde mesmo em situações sem previsão legal expressa

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), na 6ª Turma, confirmou a sentença que autorizou a movimentação e o levantamento da integralidade do saldo de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para fins de tratamento do filho do autor da ação que tem síndrome de Down e diagnóstico secundário de transtorno do espectro autista.

O processo chegou ao Tribunal por meio de¿remessa¿oficial, instituto do Código de Processo Civil (artigo 496), também conhecido como reexame necessário ou duplo grau obrigatório, que exige que o juiz encaminhe ao tribunal o processo, havendo ou não apelação das partes, sempre que a sentença for contrária a algum ente público.

A decisão foi baseada nos termos do art. 20 da Lei 8.036/90 que regulamenta as hipóteses que autorizam a movimentação da conta vinculada do FGTS, observando o art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB): “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

Interpretação extensiva à lei – Seguindo essa linha, o relator, desembargador federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, ressaltou que o TRF1 já se manifestou no sentido de dar interpretação extensiva à Lei nº 8036/90, firmando o entendimento de que as previsões expressas não são taxativas, devendo ser assegurado o direito constitucional do cidadão à vida e à saúde.

Assim, cabe ao Poder Judiciário averiguar se a doença de que sofre o dependente do titular da conta é grave e se a situação exige a liberação do saldo sob pena de comprometimento à saúde. “No caso dos autos, há comprovação de que o filho da parte impetrante nasceu, conforme exame genético de cariótipo, com síndrome de Down e possui diagnóstico secundário de transtorno do espectro autista, tendo a necessidade de acompanhamento intenso dos pais, além da necessidade de tratamentos específicos na área da saúde, muitas vezes realizados por médicos especialistas que não atendem pelo plano de saúde”, complementou o desembargador Jamil Rosa.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. FGTS. LEVANTAMENTO DO SALDO. TRATAMENTO DE SAÚDE DE DEPENDENTE. ROL NÃO TAXATIVO. POSSIBILIDADE QUE NÃO IMPLICA EM OFENSA AO ART. 20 DA LEI N. 8.036/90. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. DIREITO À SAÚDE E À VIDA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. REMESSA OFICIAL DESPROVIDA.

1. Remessa oficial em face de sentença autorizou a movimentação e levantamento da integralidade do saldo de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço de titularidade da parte impetrante, para fins de tratamento do filho, portador de Síndrome de Down e diagnóstico secundário de Transtorno do Espectro Autista.

2. A jurisprudência deste Tribunal já se manifestou no sentido de dar interpretação extensiva ao disposto no art. 20 da Lei n. 8.036/90, firmando o entendimento de que o rol ali previsto não é taxativo, pois que, em atendimento aos princípios constitucionais e aos fins sociais a que a lei se destina, deve-se assegurar o direito constitucional do cidadão à vida e à saúde.

3. Desse modo, a Sexta Turma entende que cabe ao Poder Judiciário, no caso concreto, averiguar se a doença de que sofre o titular da conta ou seu dependente é grave e se a situação está a exigir a liberação do saldo, sob pena de comprometimento da saúde (REO 1000311-56.2017.4.01.3801, Desembargador Federal DANIEL PAES RIBEIRO, TRF1 – Sexta Turma, PJe 12/06/2020).

4. No caso dos autos, há comprovação de que o filho da parte impetrante nasceu, conforme exame genético de cariótipo, com síndrome de Down e possui o diagnóstico secundário de transtorno do espectro autista, tendo a necessidade de acompanhamento intenso dos pais, além da necessidade de tratamentos específicos na área da saúde, muitas vezes realizados por médicos especialistas, que não atendem pelo plano de saúde.

5. Em sede de remessa oficial, confirma-se a sentença se não há quaisquer questões de fato ou de direito, referentes ao mérito ou ao processo, matéria constitucional ou infraconstitucional, direito federal ou não, ou princípio, que a desabone.

6. A ausência de recursos voluntários reforça a higidez da sentença, adequada e suficientemente fundamentada, sobretudo quando não há notícia de qualquer inovação no quadro fático-jurídico e diante da satisfação imediata da pretensão do direito, posteriormente julgado procedente.

7. Remessa oficial desprovida.

Com base nesse entendimento, o relator confirmou a sentença destacando que a ausência de recursos voluntários reforçou a decisão deferida de forma adequada e suficientemente fundamentada.

Processo: 1007783-74.2022.4.01.3400

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