Indeterminação de horários invalida acordo que amplia intervalo de almoço

A prorrogação do intervalo intrajornada de duas horas – tempo para descanso e alimentação durante a jornada de trabalho – pode ser autorizada por acordo coletivo, mas os horários de intervalo devem ser preestabelecidos, pois, do contrário, há risco de ingerência patronal na vida privada do empregado. Foi o que aconteceu a um motorista de ônibus do Paraná: em uma mesma quinzena, ele cumpriu intervalos de oito horas, jornadas com intervalos fracionados e, em outros dias, nem sequer teve período de descanso. Após a rejeição, pela Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, do recurso das empregadoras quanto à questão, o trabalhador receberá o pagamento, como hora extra, do tempo de descanso superior a duas horas.
A decisão da Oitava Turma manteve o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR), que considerou ter ocorrido, no caso, abuso de direito das empregadoras – em relação à duração do intervalo a ser cumprido pelo trabalhador – em detrimento da limitação da liberdade do empregado. O Regional verificou que a escala de trabalho era estipulada diariamente, com variação de rotas, horários e intervalos, com visível prejuízo ao motorista, causando-lhe extrema desordem em seus horários pessoais, diante de “longos ou curtos intervalos, de maneira variável, dia após dia, pela vontade patronal”. Diante disso, invalidou a autorização para prorrogação das duas horas e os fracionamentos dos intervalos, considerando o tempo excedente como horas extraordinárias.
As empresas de transporte rodoviário de passageiros recorreram ao TST, alegando a existência de acordo coletivo permitindo a adoção de intervalo intrajornada superior ao limite de duas horas, mas a Oitava Turma manteve a decisão regional, ao não conhecer do apelo quanto a esse tópico. Segundo a ministra Dora Maria da Costa, relatora do recurso de revista, apesar de o TST se posicionar no sentido da possibilidade de ampliação do intervalo intrajornada, “é primordial para sua validade que haja definição do período pela norma coletiva ou pactuação individual complementar”.
A relatora esclareceu que o artigo 71 da CLT, em seu caput, prevê a adoção do intervalo intrajornada superior ao limite legal, desde que haja prévio acordo escrito entre as partes ou fixação em norma coletiva. No entanto, a ministra ressaltou que esse dispositivo deve ser interpretado de forma a “resguardar o seu objetivo legal e os princípios que regem as relações trabalhistas”.
Ao verificar os prejuízos causados ao trabalhador, submetido a jornadas em que havia intervalo superior a duas horas, outras com intervalos fracionados e dias sem intervalos, a ministra frisou a importância do intervalo intrajornada, observando que se trata de norma que tem como objetivo a manutenção do estado físico e psíquico do trabalhador após um tempo de trabalho. Por fim, a relatora destacou que “não se pode relevar as normas protetivas da saúde, medicina e segurança do trabalho, de ordem pública, nem mesmo por meio de negociação coletiva, como é o caso, em que a cláusula não delimita o tempo de descanso do empregado”.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO DE REVISTA. 1. INTERVALO INTRAJORNADA SUPERIOR AO LIMITE DE DUAS HORAS. Não obstante esta Corte se posicione no sentido da possibilidade de ampliação do intervalo intrajornada por meio de avença coletiva, entende ser primordial para sua validade que haja definição do período, sob pena de se retirar do período de descanso a sua função social. Recurso de revista não conhecido. 2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS . REQUISITOS. No direito processual trabalhista, prevalece o princípio de que a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios se dá, unicamente, nos casos previstos na Lei nº 5.584/70. Inteligência do entendimento jurisprudencial consubstanciado nas Súmulas nºs 219 e 329 do Tribunal Superior do Trabalho. In casu , o deferimento dos honorários advocatícios, com base apenas no pressuposto da hipossuficiência econômica, não se coaduna com a jurisprudência desta Corte. Recurso de revista conhecido e provido. 3. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. LIMPEZA DE BANHEIROS DE ÔNIBUS. Nos termos do entendimento consubstanciado na Orientação Jurisprudencial nº 4 da SBDI-1 desta Corte, não basta a constatação da insalubridade por meio de laudo pericial para que o empregado tenha direito ao respectivo adicional, sendo necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho. A limpeza dos banheiros dos ônibus e a respectiva coleta de lixo não são consideradas atividades insalubres, ainda que constatadas por laudo pericial, porque não estão classificadas como coleta de lixo urbano pela Portaria do Ministério do Trabalho. (Aplicação da Orientação Jurisprudencial 4 da SBDI-1/TST). Revista conhecida e provida. 4. INTERVALO INTRAJORNADA. NATUREZA JURÍDICA. A decisão recorrida se encontra em harmonia com o entendimento consubstanciado na OJ nº 354 da SBDI-1 do Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de revista não conhecido. 5. INTERVALO INTERJORNADA. NÃO OBSERVÂNCIA. EFEITOS. OJ Nº 355 DA SBDI-1/TST. O desrespeito ao intervalo interjornada gera o pagamento, como extras, das horas subtraídas do intervalo, nos termos da OJ nº 355 da SBDI-1/TST. Recurso de revista não conhecido. 6. REGIME DE COMPENSAÇÃO. HORAS EXTRAS. BANCO DE HORAS. O Regional, com amparo no conjunto fático-probatório, assentou que, não obstante a existência de previsão coletiva quanto ao banco de horas, o referido regime foi desrespeitado pela reclamada. Constata-se, pois, que o Regional não negou reconhecimento ao acordo coletivo. Pondere-se, por outro lado, que o posicionamento desta Corte é no sentido de que a Súmula 85/TST não se aplica ao regime de banco de horas, porquanto tal verbete trata apenas da compensação semanal, e não daquela ajustada por meio de banco de horas, com prazo anual. Note-se que, nos itens III e IV, tal verbete faz expressa referência à compensação semanal. Recurso de revista não conhecido.

RR – 184200-70.2007.5.09.0019

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