A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso especial da Brasil Telecom (Grupo Oi) e definiu que a Telebrás não tem responsabilidade exclusiva pelas obrigações decorrentes de ações ajuizadas após a sua cisão, referentes a contratos de participação financeira celebrados por ela antes da privatização, ocorrida em 1998. No julgamento, o colegiado também entendeu que não há direito de regresso contra a sociedade de economia mista.
O recurso especial foi interposto pela Oi contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) para que fosse reconhecida a responsabilidade exclusiva da Telebrás pelo suposto inadimplemento dos referidos contratos de participação financeira.
A Oi também requereu que fosse declarado o direito de regresso contra a sociedade de economia mista, em razão dos prejuízos que vem suportando com o pagamento de indenizações aos consumidores lesados. Segundo ela, o Grupo Oi tem cerca de R$ 5,82 bilhões depositados judicialmente e mais de R$ 650 milhões assegurados por meio de fiança bancária e apólices de seguro-garantia.
Para a empresa, com a cisão, não houve a incorporação do patrimônio da Telebrás, mas apenas a transferência de parte das parcelas patrimoniais para as sociedades criadas, remanescendo parte do patrimônio da sociedade de economia mista, bem como a sua personalidade jurídica. De acordo com a Oi, a consequência da cisão parcial é que as sociedades resultantes não assumem, sempre e indistintamente, todos os direitos e as obrigações da empresa cindida.
Tese genérica
O relator do recurso no STJ, ministro Antonio Carlos Ferreira, explicou que a cisão parcial da Telebrás, por si só, não descaracteriza a responsabilização das incorporadoras pelas obrigações vinculadas à complementação de ações relacionada a contrato de participação financeira celebrado em data anterior à cisão.
Para ele, a tese genérica da Oi “possui alcance muito além do simples pedido de ressarcimento em desfavor da sociedade de economia mista cindida e, se não for adequadamente repelida, implicará contradição na jurisprudência deste Tribunal Superior em relação a tema solucionado definitivamente em recurso especial repetitivo (Tema 551), que impôs à Brasil Telecom a obrigação de complementar as ações”.
No repetitivo, a Segunda Seção entendeu que a constituição do crédito referente à complementação das ações somente ocorrerá mediante o trânsito em julgado da ação ajuizada pelo consumidor. Assim, não se aplica a cláusula de exclusão da solidariedade – prevista no artigo 233 da Lei das S.A. – quanto a credores cujo título não tiver sido constituído até o ato da cisão, independentemente de se referir a obrigações anteriores.
Ao citar precedentes do STJ, o ministro ressaltou que o tribunal já se manifestou no sentido de que a incorporação de empresas determina a extinção da personalidade jurídica da incorporada, com a transmissão de seus direitos e de suas obrigações à incorporadora.
Direito de regresso
Em relação ao direito de regresso, o ministro Antonio Carlos Ferreira observou que o TJDFT foi claro no sentido de que as normas dos editais de privatização, a ata da 76ª Assembleia Geral Extraordinária da Telebrás, a justificação da Telebrás e o protocolo de justificação da incorporação afastam o direito pleiteado pela Oi.
“Nesse sentido, consequentemente, não haveria falar em direito de regresso em favor das autoras, que, em ações ordinárias propostas por consumidores, vêm sendo compelidas a satisfazer, na verdade, obrigações próprias, não de terceiro”, ressaltou.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL E DIREITO EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA PROPOSTA POR BRASIL TELECOM S.A. E POR BRASIL TELECOM PARTICIPAÇÕES S.A. CONTRA TELEBRÁS. RESSARCIMENTO DOS VALORES DEVIDOS EM CONDENAÇÕES NOS AUTOS DE AÇÕES DE COMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES PROPOSTAS POR CONSUMIDORES. CISÃO PARCIAL.
1. Compete à SEGUNDA SEÇÃO processar e julgar o presente recurso especial, tendo em vista que as recorrentes, autoras, buscam (i) seja reconhecida a responsabilidade exclusiva da TELEBRÁS pelas obrigações decorrentes de ações ajuizadas em seu desfavor posteriormente à cisão parcial da referida sociedade de economia mista, ré, pertinentes a contratos de participação financeira celebrados anteriormente à mencionada privatização, (ii) bem como seja declarado o direito de regresso das autoras contra a referida TELEBRÁS, empresa cindida. A questão material deduzida na presente ação, portanto, tem natureza meramente empresarial, relativa à cisão da empresa e à responsabilidade das sucessoras na complementação de ações, incidindo a norma do art. 9º, § 2º, II, do RISTJ. Ausente discussão acerca de defeito na prestação de serviço público objeto de concessão, afasta-se a orientação adotada no julgamento do CC n. 138.405/DF pela CORTE ESPECIAL, Relatora Originária Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Relator para acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe de 10.10.2016.
2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a afetação de determinado tema ao rito dos recursos especiais repetitivos, disciplinado no art. 543-C do CPC/1973, enseja a suspensão obrigatória, apenas, dos recursos em trâmite na instância ordinária.
3. Ademais, a questão jurídica afetada nos autos do REsp n. 1.499.294/MS não guarda absoluta semelhança com a dos presentes autos, em que as ora agravantes buscam ser ressarcidas pela TELEBRÁS em relação aos valores despendidos nas “ações de complementação de ações” propostas com fundamento em contratos de participação financeira. Tal circunstância descaracteriza a alegada conveniência em suspender este processo, ausente um mínimo de certeza de que o julgamento do repetitivo será crucial para o resultado desta ação.
4. Omissões e erro material não existentes nos acórdãos do Tribunal de origem, ficando afastada a violação do art. 535 do CPC/1973.
5. A cisão tão somente parcial da TELEBRÁS, por si, não descaracteriza a responsabilização das incorporadoras pelas obrigações vinculadas à complementação de ações relacionada a contrato de participação financeira celebrado em data anterior à mencionada cisão.
6. Não prospera a tese “genérica” de que a TELEBRÁS seria exclusivamente responsável pela complementação das ações. A BRASIL TELECOM S.A. tem legitimidade para responder “quanto a credores cujo título não tiver sido constituído até o ato de incorporação, independentemente de se referir a obrigações anteriores, ante a sucessão empresarial”. A constituição do crédito relativo à complementação das ações relacionada a contrato de participação financeira, por sua vez, somente ocorrerá mediante o trânsito em julgado da respectiva demanda (REsp n. 1.322.624/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, DJe de 25.6.2013 – julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973).
7. Relativamente aos pedidos de natureza regressiva, deduzidos na inicial e vinculados especificamente à relação empresarial estabelecida entre as autoras e a ré, o TJDFT os indeferiu com fundamento na interpretação e na aplicação do Edital MC/BNDES n. 01/98, da ata da 76ª Assembleia Geral Extraordinária da TELEBRÁS, da Justificação da TELEBRÁS e do Protocolo de Justificação da Incorporação das empresas integrantes do Sistema Telebrás à Telepar.
Incidência, portanto, das vedações contidas nas Súmulas n. 5 e 7 do STJ quanto à alegada contrariedade aos arts. 13, parágrafo único, do CDC, 663 e 934 do CC/2002, 224, II e VII, 229, § 2º, e 233, parágrafo único, da Lei n. 6.404/1976 e à divergência jurisprudencial.
8. O acórdão proferido no REsp n. 753.159/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 29.4.2011, não decidiu pela existência nem pela ausência de estipulação restritiva da solidariedade entre a cindida e as incorporadoras, tampouco estabeleceu sua eventual extensão. Com efeito, não há como acolher a alegação das recorrentes de que seria incontroversa a existência de estipulação restritiva da solidariedade, incidindo, portanto, a vedação contida nas Súmulas n. 5 e 7 do STJ.
9. Recurso especial conhecido em parte e desprovido.