Estelionato cometido pela rede bancária antes da Lei 14.155/2021 deve ser julgado no domicílio da vítima

Em razão da aplicabilidade imediata da norma processual nova, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou a competência do juízo criminal do Rio de Janeiro – domicílio da vítima – para analisar um caso de estelionato praticado mediante depósito de dinheiro na conta bancária dos criminosos.

A decisão – que seguiu o voto da relatora, ministra Laurita Vaz – levou em consideração o artigo 70, parágrafo 4º, do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei 14.155/2021, segundo o qual, nos crimes previstos no artigo 171 do Código Penal, quando praticados por meio da rede bancária (mediante depósito ou transferência de valores, por exemplo), a competência será definida pelo local do domicílio da vítima. Havendo pluralidade de vítimas, a competência deverá ser determinada pela prevenção.

De acordo com os autos, a vítima, moradora do Rio de Janeiro, arrematou uma moto em leilão, por R$ 7 mil, e depositou o valor na conta dos investigados – registrada no estado de São Paulo. Com o comprovante do depósito em mãos, ela foi até o pátio indicado para a retirada do veículo, e só então descobriu que se tratava de um golpe.

Processo ainda está em fase de inquérito

O juízo de Mauá (SP) declinou da competência para as varas criminais do Rio de Janeiro, local de residência da vítima. Ao receber os autos, o juízo do Rio suscitou o conflito de competência por entender que, embora a legislação processual tenha aplicação imediata, a Lei 14.155/2021 foi publicada depois dos fatos apurados na ação, de forma que, em razão do princípio do juiz natural, deveria ser mantida a competência na comarca paulista. Conforme assinalou o suscitante do conflito, o juiz natural é aquele com a competência prevista em lei anterior ao crime.

Ao declarar a competência do juízo do domicílio da vítima, a ministra Laurita Vaz explicou que a nova lei, como norma processual, deve ser aplicada imediatamente, ainda que os fatos tenham sido anteriores à mudança da legislação – especialmente porque, no caso dos autos, o processo ainda está em fase de inquérito policial.

O recurso ficou assim ementado:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO. CRIME PRATICADO MEDIANTE DEPÓSITO. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 14.155⁄2021. LOCAL DO DOMICÍLIO DA VÍTIMA. NORMA PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA.  CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO SUSCITANTE.
1. Nos termos do §4.º do art. 70 do Código de Processo Penal, acrescentado pela Lei n. 14.155⁄2021, “Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.” (sem grifos no original).
2. Tratando-se de norma processual, deve ser aplicada de imediato, ainda que os fatos tenham sido anteriores à nova lei, razão pela qual a competência no caso é do Juízo do domicílio da vítima.
3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Suscitante.

Leia o acórdão no CC 180.832.

A tese estabelecida no julgamento da Terceira Seção foi destacada na edição 706 do Informativo de Jurisprudência  – serviço por meio do qual o STJ divulga, periodicamente, teses selecionadas pela novidade no âmbito do tribunal e pela repercussão no meio jurídico.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): CC 180832

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar