Houve o descumprimento de norma coletiva sobre direitos trabalhistas de empregado dirigente sindical.
A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a recurso do Banco do Nordeste, de forma a manter decisão que o condenou a indenizar por dano moral coletivo e a se abster de várias práticas consideradas antissindicais. A decisão foi tomada em ação civil pública ajuizada na Bahia e o valor da indenização, R$ 100 mil, deverá ser revertido para instituição e/ou campanha que atue na defesa de direitos e garantias dos trabalhadores bancários alcançados pela discriminação.
Liberdade sindical e perseguição
O Ministério Público do Trabalho constatou práticas atentatórias à liberdade sindical pelo Banco do Nordeste naquele Estado. Uma das acusações é que o banco, por perseguição, negou a um empregado dirigente sindical direitos expressamente previstos no acordo coletivo e estendidos a todos os trabalhadores em condição similar.
Os pedidos feitos na ação foram julgados improcedentes pela 33ª Vara do Trabalho de Salvador (BA), que entendeu não haver sido demonstrada a existência de discriminação contumaz e reiterada do banco que venha atingindo a esfera transindividual da coletividade de trabalhadores.
A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, no entanto, condenou o Banco do Nordeste a se abster de promover condutas discriminatórias por motivo de filiação ou atividade sindical, sob pena de multa no valor de R$ 10 mil por dia, a ser revertida em favor do FAT.
Condenou, ainda, o banco a pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 100 mil, a ser revertido para instituição e/ou campanha que atue na defesa de direitos e garantias dos trabalhadores bancários alcançados pela discriminação. Inconformado, o banco recorreu para o Tribunal Superior do Trabalho.
Conduta antissindical e indenização
No TST, o processo foi distribuído para a Segunda Turma, sob a relatoria da ministra Maria Helena Mallmann. No julgamento, os ministros entenderam que o Tribunal Regional expôs, de forma clara e fundamentada, os motivos que o levaram a concluir pela ocorrência de prática antissindical e, via de consequência, pela procedência da ação coletiva.
“O TRT concluiu que a prova produzida demonstrou que o banco dificultou o exercício da liberdade de organização e de sindicalização, ao deixar de enquadrar corretamente o dirigente sindical, impedindo o pagamento das diferenças correlatas, em inequívoca conduta antissindical”, afirmou a ministra Mallmann.
A relatora acrescentou que a prática de atos antijurídicos, em completo desvirtuamento do que preconiza a legislação, além de causar prejuízos individuais aos trabalhadores, configura ofensa ao patrimônio moral coletivo, sendo, portanto, passível de reparação por meio da indenização respectiva.
Assim, diante dos atos ilícitos perpetrados pelo banco, o colegiado entendeu que não há como afastar a condenação nas obrigações de não fazer, bem como no pagamento de indenização por dano moral coletivo. Assim, acabou mantida, integralmente, a decisão do TRT da 5ª Região.
Abrangência territorial da decisão
No recurso, o Banco do Nordeste pretendeu que os efeitos da decisão ficassem restritos a Salvador (BA), cidade onde ocorreram os fatos. O TRT tinha decidido contra essa limitação. A Segunda Turma do TST manteve o entendimento do Regional. De acordo com a relatora, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 1.101.937/SP (Tema 1075 da Tabela de Repercussão Geral), reconheceu a inconstitucionalidade do artigo 16 da Lei 7.347/1985, que restringia a eficácia subjetiva da coisa julgada na ação civil pública aos limites da competência territorial do órgão prolator. “Assim, a par de estar de acordo com a jurisprudência firmada no âmbito desta Corte, o acórdão regional está em consonância com a tese de repercussão geral (Tema 1075) fixada pelo Supremo Tribunal Federal, com efeito vinculante”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014.
NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. O Tribunal Regional, em análise detida e fundamentada, condenou o banco réu na obrigação de não fazer consistente na abstenção da prática de atos antissindicais , assim como no pagamento de dano moral coletivo, deixando assentadas as razões pelas quais assim o fez. Consta do acórdão que os empregados do Banco do Nordeste foram aviltados em seu direito fundamental à liberdade de associação, pois a conduta antissindical dispensada a um dirigente sindical inibiu o interesse dos empregados de ingressar no movimento sindical ou até participar das eleições do ente sindical, temendo represálias e retaliações. Consigna o acórdão, ainda, que a prática antissindical (reconhecida por decisão judicial em ação individual) consistiu na negativa de se estender a um dirigente sindical benefícios regulamentares deferidos a todos os trabalhadores que se encontravam em condição similar, em total violação à cláusula 19 do Acordo Coletivo de Trabalho que expressamente garante “ao empregado liberado para o exercício de mandato sindical todos os benefícios regulamentares”. Portanto, o Tribunal Regional expôs de forma clara e fundamentada os motivos que o levaram a concluir pela ocorrência de prática antissindical e, via de consequência, pela procedência da ação coletiva. O inconformismo da parte com a decisão que não lhe foi favorável não enseja nulidade por negativa de prestação jurisdicional, já que devidamente fundamentada nos pontos essenciais para a sua conclusão, em conformidade com os elementos trazidos ao processo (art. 371 do CPC/2015). Agravo de instrumento a que se nega provimento.
LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. O Ministério Público do Trabalho tem legitimidade ativa para postular em juízo pretensões referentes aos interesses metaindividuais (ou coletivos latu sensu ), aí compreendidos os difusos, os coletivos strictu sensu e os individuais homogêneos, principalmente quando de relevante interesse social. Neste sentido, a Constituição Federal assegura, no seu art. 129, a legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho para tutelar “outros interesses difusos e coletivos”, compreendendo-se nesses os de caráter trabalhista. In casu , o Parquet intentou a presente ação visando preservar o direito constitucionalmente garantido à liberdade sindical. Destarte, constata-se que a pretensão do Ministério Público não é de reparação de lesões individuais, mas sim de tutela de interesses metaindividuais, uma vez que a ação destina-se, em última análise, à proteção de interesse comum a um grupo de trabalhadores que prestam serviços para o réu. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
CONDUTA ANTISSINDICAL. CARACTERIZAÇÃO. TUTELA INIBITÓRIA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO. 1. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo MPT com pedido de tutela inibitória e indenização por danos morais coletivos em razão da conduta antissindical dispensada pelo banco réu aos empregados. 2. Segundo consta do acórdão, em razão de ação individual em que ficou comprovado que foram negados ao dirigente sindical direitos expressamente previstos no ACT e estendidos a todos os trabalhadores em condição similar, foi instaurado inquérito ministerial e, posteriormente, ajuizada a presente ação civil pública. A Corte de origem, por maioria, entendeu que, “ao alijar do trabalhador, investido no mister de dirigente sindical, do direito a ser enquadrado em determinada função e perceber as diferenças salariais correlatas, em franca oposição à cláusula normativa que garantiu tais benefícios a este trabalhador, o banco reclamado incorreu em ato atentatório à liberdade de associação e ao próprio exercício do mandato sindical, revelando-se em conduta antissindical” . Conforme se depreende do acórdão transcrito, o Tribunal Regional concluiu que a prova produzida nos autos demonstrou que o réu obstaculizou o exercício da liberdade de organização e de sindicalização ao deixar de proceder ao correto enquadramento do dirigente sindical e ao pagamento das diferenças correlatas. Trata-se de inequívoca conduta antissindical, compreendida, na lição de Luciano Martinez, como “qualquer ato jurídico estruturalmente atípico, positivo ou negativo, comissivo ou omissivo, simples ou complexo, continuado ou isolado, concertado ou não concertado, estatal ou privado, normativo ou negocial, que, extrapolando os limites do jogo normal das relações coletivas de trabalho, lesione o conteúdo essencial de direitos de liberdade sindical ” (MARTINEZ, Luciano. Condutas antissindicais. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 239). A prática de atos antijurídicos, em completo desvirtuamento do que preconiza a legislação, além de causar prejuízos individuais aos trabalhadores, configura ofensa ao patrimônio moral coletivo, sendo, portanto, passível de reparação por meio da indenização respectiva, nos termos dos arts . 186 do Código Civil, 5º, inciso V, da Constituição Federal e 81 da Lei 8.078/1990. Assim, diante dos atos ilícitos perpetrados pelo réu, não há como afastar a condenação às obrigações de não fazer, bem como ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. Ilesos os artigos indicados. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
DANO MORAL COLETIVO. VALOR ARBITRADO. A jurisprudência desta Corte Superior, no tocante ao quantum indenizatório fixado pelas instâncias ordinárias, vem consolidando entendimento de que a revisão do valor da indenização somente é possível quando excessiva ou irrisória a importância arbitrada a título de reparação de dano moral, em flagrante violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. No caso concreto, entendo que a indenização por danos morais coletivos, arbitrada em R$ 100.000,00 (cem mil reais), ao considerar as circunstâncias do caso com suas peculiaridades, o bem jurídico ofendido e a capacidade financeira da empresa reclamada, está dentro dos padrões da razoabilidade e da proporcionalidade. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
CUMULAÇÃO DOS PLEITOS DE DANOS MORAIS COLETIVOS E TUTELA INIBITÓRIA. POSSIBILIDADE. Nos termos do que dispõe o art . 3º da Lei nº 7.347/85, a Ação Civil Pública pode ter por objeto “a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”. Embora o texto da norma legal utilize a conjunção “ou”, a jurisprudência desta Corte assentou-se no sentido de que são pedidos cumulativos. Com efeito, a indenização por dano moral coletivo visa a compensar o período em que a coletividade foi privada do cumprimento da Lei, enquanto a multa por obrigação de fazer tem por objetivo compelir o cumprimento da obrigação prevista na Lei. Precedentes. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. ABRANGÊNCIA DA CONDENAÇÃO . Hipótese em que o Tribunal Regional decidiu que os efeitos da decisão proferida não ficam restritos aos limites territoriais do órgão jurisdicional, no caso, a Vara do Trabalho de Salvador. Sobre a questão, o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 1.101.937/SP (Tema 1075 da Tabela de Repercussão Geral) reconheceu a inconstitucionalidade do art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494/1997, que restringia a eficácia subjetiva da coisa julgada na ação civil pública aos limites da competência territorial do órgão prolator. Fixou, então, a seguinte tese jurídica: ” I – É inconstitucional a redação do art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494/1997, sendo repristinada sua redação original”. Assim, a par de estar de acordo com a jurisprudência firmada no âmbito desta Corte, o acórdão regional está em consonância com a tese de repercussão geral (Tema 1075) fixada pelo Supremo Tribunal Federal, com efeito vinculante. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
Processo: AIRR-102-98.2016.5.05.0033