Segundo a 5ª Turma, não há previsão legal para estender o benefício por período superior ao negociado
A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a decisão que recusou a extensão da complementação do auxílio-doença a um bancário do Banco Bradesco S.A. para além dos 24 meses estipulados em norma coletiva. Segundo o colegiado, o benefício não é previsto na legislação, e a prorrogação do prazo ofenderia a autonomia negocial coletiva.
Afastamentos
Contratado em 1981, o bancário desenvolveu lesões por esforço repetitivo (LER/DORT) e teve vários afastamentos em razão disso. O último havia ocorrido em 2011, e ele ainda estava afastado quando, em 2013, ajuizou a reclamação trabalhista.
Complementação
A norma coletiva em vigor na época assegurava aos empregados, em caso de afastamento por auxílio-doença previdenciário ou acidentário, uma complementação salarial equivalente à diferença entre ao valor recebido do INSS e a sua remuneração. O benefício, porém, era limitado a 24 meses.
Redução salarial
Na reclamação trabalhista, o bancário argumentou que a norma era injusta porque sua doença era equiparada a acidente de trabalho. Segundo ele, não se tratava “de um azar”, mas de uma responsabilidade do empregador, e o término do pagamento resultaria numa significativa redução salarial (em janeiro de 2013, ela era de cerca de R$ 14 mil).
Auxílio temporário
O Bradesco, em sua defesa, argumentou que a complementação era um auxílio temporário, acordado entre os sindicatos patronal e de empregados, para garantir que o empregado não fosse surpreendido com a queda brusca de remuneração e pudesse se adaptar e planejar sua vida durante o período de concessão. “Trata-se de uma complementação a um benefício previdenciário, consequentemente não possuindo sequer natureza salarial”, sustentou.
Autonomia privada
O juízo da 23ª Vara do Trabalho de Salvador rejeitou a pretensão do bancário de estender a complementação, por entender que o direito decorre exclusivamente da autonomia privada coletiva, uma vez que a lei não trata da matéria.
Ação própria
O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA), ao manter a sentença, acrescentou que a pretensão de reparação material teria de ser objeto de ação própria e que o próprio bancário havia informado o ajuizamento de outra ação com essa finalidade.
Dano material
No recurso de revista, o bancário alegou que a discussão é se o dano material por culpa da empresa deve ser limitado ao período estipulado na norma coletiva, mesmo quando persistir. Segundo ele, sua causa de pedir não está vinculada ao disposto na norma coletiva, e sim à reparação dos prejuízos decorrentes do término da complementação.
Interpretação estrita
Mas, para o relator, ministro Douglas Alencar Rodrigues, como não tem previsão legal e foi fixado por negociação, o benefício está sujeito a uma interpretação estrita e não pode ser estendido para além do prazo previsto, pois isso contraria a autonomia negocial coletiva prevista na Constituição Federal.
Acidente de trabalho
O ministro notou, porém, que a pretensão está vinculada à questão do acidente de trabalho, regulado por normas constitucionais e legais que definem as obrigações do empregador, inclusive a de indenizar, quando houver dolo ou culpa ou em razão do risco da atividade. No caso, porém, o bancário já havia ajuizado ação própria visando à indenização por dano material. “Desse modo, sob qualquer ângulo de análise, a pretensão não comporta acolhimento”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
I. AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.015/2014. COMPLEMENTAÇÃO DO AUXÍLIO DOENÇA. PRAZO MÁXIMO DE 24 MESES. BENEFÍCIO ESTIPULADO EM NORMA COLETIVA. EXTENSÃO ATÉ O FIM DO AFASTAMENTO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO ESTRITA DA NORMA COLETIVA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL CONFIGURADA. Constatado possível equívoco na decisão monocrática, impõe-se a reforma da decisão agravada. Agravo provido.
II. RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.015/2014. COMPLEMENTAÇÃO DO AUXÍLIO DOENÇA. PRAZO MÁXIMO DE 24 MESES. BENEFÍCIO ESTIPULADO EM NORMA COLETIVA. EXTENSÃO ATÉ O FIM DO AFASTAMENTO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO ESTRITA DA NORMA COLETIVA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. Situação em que o Tribunal Regional manteve a sentença, na qual indeferida a condenação à manutenção do pagamento de complementação do auxílio doença, após o prazo máximo de 24 meses do afastamento do trabalhador, conforme previsto em norma coletiva. Trata-se de benefício estabelecido em norma coletiva, sem previsão expressa no ordenamento jurídico, e que, portanto, está sujeito à exegese estrita, nos termos do art. 114 do Código Civil. Logo, não é possível a extensão do prazo do pagamento do benefício para além do interregno estipulado em norma coletiva, sem que se configure ofensa à autonomia negocial coletiva (CF, art. 7º, XXVI). Nota-se, não obstante, que a pretensão deduzida está vinculada ao universo da infortunística laboral, que é regulado por normas constitucionais (CF, art. 7º, XXVIII) e legais (Leis 8.212 e 8.213, ambas de 1991), as quais definem as obrigações do empregador, tanto em relação à proteção da saúde e segurança do trabalho (art. 157, IV e a IV, da CLT c/c o art. 19, § 1º, da Lei 8.213/91), quanto no que diz com os limites de sua responsabilidade patrimonial (arts. 22 e ss da Lei 8.212/91), inclusive nas situações em que evidenciada a prática de atos ilícitos (CC, arts. 927, 949 e 950). Durante o período de afastamento do trabalhador por motivo de doença ou acidente relacionado ao trabalho, com duração superior a 15 dias, o contrato de trabalho estará suspenso (CLT, art. 476), caso em que o trabalhador receberá o benefício previdenciário cabível (art. 18, I, “e”, da Lei 8.213/91), mas sem prejuízo do direito à indenização a cargo do empregador, quando incorrer em dolo ou culpa ou em razão do risco da atividade explorada (CF, art. 7º, XXVIII c/c o art. 927 e par. único, do CC). Com efeito, o art. 949 do CC assegura ao trabalhador o direito à percepção integral das despesas de tratamento e dos lucros cessantes, entre outros prejuízos, até o fim da convalescença, sem prejuízo da percepção de pensão mensal vitalícia, caso não reestabelecida plenamente a capacidade laboral, após o fim do período de afastamento, na forma do art. 950 do CC. Nada obstante, no acórdão regional, em que transcrita a sentença, consta que o próprio Autor noticiou o ajuizamento de ação própria, com o objetivo de obter a reparação que ora pretende alcançar, o que sugere a configuração de litispendência, a impedir a cognição de mérito pretendida, sob pena de ofensa ao postulado da unidade de convicção. A Corte Regional, ainda, além de assentar a ausência de lastro legal para o deferimento do pedido, sugere que a pretensão em exame haveria de ser deduzida em ação própria, a qual, como registrado na sentença, já estava em curso ao tempo de sua prolação. Desse modo, sob qualquer ângulo de análise, a pretensão não comporta acolhimento. Recurso de revista conhecido e não provido.
A decisão foi unânime.
Processo: Ag-RR-10442-39.2013.5.05.0023