Auxiliar que assumiu cartório após morte de titular não receberá verbas rescisórias

Para a 6ª Turma, houve continuidade do vínculo

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou a pretensão de um auxiliar administrativo de um cartório do Rio de Janeiro de receber verbas rescisórias após a morte do tabelião. Para o colegiado, houve a continuidade da prestação de serviços, porque esse funcionário assumiu temporariamente a gestão do cartório.

Morte do titular

Na ação, o auxiliar administrativo contou que fora contratado em setembro de 1994 pelo titular do cartório do 7º Ofício de Registro de Distribuição do Rio de Janeiro. Com a morte do tabelião, em outubro de 2020, ele disse que seu contrato de trabalho deveria ser rescindido, cabendo ao espólio pagar-lhe as verbas rescisórias. Seu argumento era o de que o cartório não tem personalidade jurídica, e o titular falecido era seu verdadeiro contratante.

Responsável pelo cartório

Ao contestar o pedido, o espólio do tabelião sustentou que o contrato de trabalho estava em vigor, pois o funcionário continuava a prestar serviços e era, inclusive, o responsável provisório pelo cartório.

Em relação a isso, o trabalhador alegou que fora nomeado pela Corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro até que fosse realizado concurso público para designar novo tabelião. Assim, embora respondesse provisoriamente pelo cartório, era apenas um assalariado.

Pessoa jurídica

O juízo da 80ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro julgou improcedentes os pedidos, entendendo que a carteira de trabalho do auxiliar fora assinada pelo cartório, e não pela pessoa física do tabelião. Portanto, não haveria rescisão contratual, pois ele continuava trabalhando para a mesma pessoa jurídica.

Pessoalidade

Ao reformar a sentença, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) considerou que, conforme a Lei dos Cartórios (Lei 8.935/1994), o cartório não tem personalidade jurídica, e o escrivão ou tabelião responde pela prestação pessoal de serviços dos seus empregados e pelas verbas contratuais decorrentes.  Diante da pessoalidade do vínculo com o tabelião, o TRT concluiu que seu falecimento extingue os contratos de trabalho firmados com ele, e o espólio fica responsável pelo pagamento das verbas rescisórias devidas.

Natureza híbrida

O relator do recurso de revista do espólio, desembargador convocado José Pedro de Camargo, destacou a natureza híbrida dos cartórios, que, embora apresentem características próprias de direito privado, também mantêm nuances relevantes de direito público. Por essa peculiaridade, segundo ele, a morte do titular não acarreta ruptura imediata do contrato de trabalho dos empregados. Nessa circunstância, o Estado assegura a continuidade da prestação do serviço à comunidade, atribuindo ao substituto designado a responsabilidade pelo gerenciamento administrativo e financeiro da serventia vaga, o que inclui a gestão do quadro de pessoal.

Sucessão

De acordo com o relator, o falecimento do empregador, pessoa física ou empresa individual, somente acarreta a resolução automática de contrato quando for impossível a continuidade da prestação de serviços ou quando não houver interesse para tanto. Nessas situações, produzem-se os efeitos da sucessão trabalhista, mesmo nas hipóteses de designação precária, em que o substituto responde interinamente pela serventia, por delegação do Estado.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO ESPÓLIO DO TABELIÃO FALECIDO. APELO SUBMETIDO À REGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017.

CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL. FALECIMENTO DO TITULAR. CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DO AUTOR – ATUAL RESPONSÁVEL INTERINO PELA SERVENTIA. VERBAS RESCISÓRIAS RELATIVAS AO PERÍODO ANTERIOR À VACÂNCIA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA.

Considerada a relevância da controvérsia acerca da caracterização de automática ruptura do contrato de trabalho de empregado de cartório, em razão do falecimento do tabelião, impõe-se o reconhecimento da transcendência jurídica da causa . Na hipótese, é incontroverso que o autor permaneceu prestando serviços no Cartório do Sétimo Ofício de Registro de Distribuição do Rio de Janeiro , sem solução de continuidade, após o óbito do então titular, Sr. Antônio Carlos Leite Penteado , ocorrido em 12/10/2020 , inclusive passando a ser, desde então , o responsável pela serventia , por designação do Poder Público, embora em caráter precário. De fato, incumbe ao Estado, na qualidade de mantenedor dos serviços notariais e de registro, designar substituto para assumir o gerenciamento administrativo e financeiro da serventia vaga, o que inclui a gestão do correspondente quadro de pessoal (art. 21 da Lei nº Lei nº 8.935/1994). E, justamente por essa premissa, não há de se falar em imediata ruptura do contrato de trabalho pelo falecimento do titular do cartório. Essa circunstância inviabiliza a pretensão quanto à percepção de verbas rescisórias, inclusive aviso-prévio . Em outras palavras, excluída a hipótese de débito trabalhista não satisfeito à época própria, quando da prestação de serviços ao tabelião falecido, e ausente a caracterização de ruptura contratual, há de se admitir os efeitos da sucessão trabalhista, nos moldes do art. 10 e 448 da CLT, mesmo nas hipóteses de designação precária, em que o substituto responde interinamente pela serventia, por delegação do Estado. Precedentes .

Recurso de revista conhecido e provido.

 

Processo: RR-100981-41.2020.5.01.0080

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